ᴇʀɪs - ᴀᴍᴏʀ ▪︎ ᴘᴀʀᴛᴇ ɪɪ

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Letchie sabia que em algum momento, sua humanidade seria um problema. Eris estava nervoso faz algum tempo, mesmo que não demonstrasse. Por vezes, ela acordava no meio da noite e sentia Eris a acariciando, dando suspiros pesados. Esperando por alguma coisa. E ela sabia bem pelo que ele esperava. Algo que nunca viria, talvez.

Podia ver quando os pensamentos do feérico o tomava por completo. Eram muitas as vezes em que as íris vermelhadas se tornavam nubladas por pensamentos. Durante as horas mais calmas, como nos banhos ou na hora de dormir, ele a olhava de maneira diferente. Quase que com tristeza. E não entendia o porquê.

Demorou um pouco para entender. Teve que observar mais. Letchie levou um tempo para compreender que tinham instintos diferentes. Ela era uma mestiça, quase toda humana. Ele era um feérico puro. Tinham necessidades diferentes. E em dias que ele estava secretamente mais triste, nos dias que a apertava mais forte na hora de dormir, nos dias em que tinha pesadelos, Let começou a entender o que ele queria.

Doeu para ela.

Porque sinceramente, não era algo pela qual ela sentia falta. Não teve essa cultura. Foi criada por uma humana, nunca chegou a entender sobre esses tipos de coisas. Mas Eris sofria com isso. E era normal. Eles estavam juntos há tanto tempo, se amando há tantos anos, e até agora, nenhuma parceria surgiu.

A cada dia que passava, Eris parecia mais incomodado. Iconformado, na verdade. Let nunca retratava sobre isso, porque na verdade, não entendia bem. Tinha receio de machucar Eris com alguma palavra não dita.

Mas isso o estava matando. De noite, Eris acordava, beijava o corpo dela, acariciava o rosto, e quando parecia insuportável ficar perto, ele saia do quarto. Da casa. Ia respirar para fora. Quando cautelosamente o seguiu e observou da janela, viu Eris sentado na frente do lago, as mãos na cabeça, parecendo atormentado pelos próprios pensamentos.

Se sentiu mal no começo. Sentiu que a culpa era sua. Mas depois entendeu que Eris estava tendo crises de ansiedade. Que, em sua alma pertubada desde que nasceu, ele ficava acordado de noite, sendo atormentado pelos próprios pensamentos, enquanto procurava refúgio no corpo dela.

Ele queria falar sobre aquilo.

Uma vez, propositalmente, tocou no assunto de parceria, como algo casual, somente para ver onde poderia chegar. Eris ficou pensativo. Muito. Não falou e contraiu os músculos. A analisou. E quando foi abrir a boca para falar algo, um pássaro assustado entrou na cozinha e distraiu ambos.

Ela já esperou demais.

Ele já esperou demais.

Eris não conseguia falar sobre os problemas. Sobre como se sentia. Até dizer que a amava era doloroso e necessitava de esforço. Era como uma trave. Qualquer fala que podia o expor, ele não conseguia dizer. Por instinto, por viver tanto tempo com Beron, recuou as palavras verdadeiras por aquelas que o manteria vivo, mesmo que mentiras. Dizer que a amava o doía, o dava medo, porque temia que alguém a tirasse dele. Porque temia revelar ao mundo que a amava. Porque temia a tornar um alvo para todos aqueles que o detestavam. Ele dizia essas palavras no meio da noite, no meio do amor, como um sussurro em seu ouvido, onde ninguém mais ouviria além dela. Apenas Let poderia saber que ele a amava.

O resto eram seus inimigos.

Mas levou muito tempo e esforço para Let o fazer dizer. Precisou distanciar-se e, pelo desespero, ouviu que ele a amava. Por medo de a perder por ela própria, Eris disse que a amava. E que queria casar com ela. Ele escondia esse amor há tantas chaves, por tantas máscaras, que no final, acabava se afogando.

E tudo piorou quando ela adoeceu. Ela não sabia bem o motivo, muito menos ele, e isso o enlouqueceu. Ela tinha náuseas, tontura, e tinha que ficar constantemente de cama. Feéricos nunca ficavam doentes, então, Eris não soube como reagir. E como um feérico nato, associou o corpo doente de uma humana com morte. Eris enlouquecia a cada vez que seu corpo ficava mais fraco. Quando ficava de cama, sentia ele segurar sua mão com tanta força que se perguntava se ele mesmo notava que estava tão nervoso. Ele simplesmente não dormia mais. Ficava acordado nas madrugadas, observando sua respiração, a segurando tão forte como se tivesse medo de alguém a tirar dele. A mãe, os deuses, o destino, quem fosse.

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