××× Brunna Gonçalves×××Recebi pêsames de pessoas que nem mesmo conhecia. Todas diziam o quão bom era Caio. E era mesmo. Era alguém fantástico.
Enquanto andava até o primeiro banco para me sentar e ouvir a cerimônia fúnebre e os discursos que os outros tinham a dizer, minha mente se passava num borrão. Não vivi esses dias, não captei o que fiz. Me lembrava de chorar, chorar, vomitar e chorar.
Depois que a ambulância chegou ali, toda uma história foi inventada. Que nós fomos assaltados, foi um terrível bandido querendo levar nossos celulares e Caio foi o herói. Supunha que Ludmilla tinha pessoas infiltradas, o que facilitava demais ela passar impune e não deixasse que aquilo se espalhasse e fosse para os jornais, por exemplo. Ela não me contou nada, e eu participei apenas de coisas essenciais como o depoimento. E praticamente só.
A noite em Nova Iorque estava nublada e bem escura. Ventava bastante, mas não parecia que iria chover.
Paty sentou ao meu lado e apertou minhas mãos em solidariedade. E meus olhos queimaram em lágrimas. Ela não sabia o que realmente havia acontecido. Aquele tempo todo. Não sabia da verdadeira história por trás daquela farsa, não sabia que eu traí Caio com Ludmilla e agora estava grávida dela.
Fechei os olhos e respirei fundo e apertei sua mão. Era um pedido de desculpas silencioso. E tinham coisas que não envolviam apenas a mim, e eu teria que falar com Ludmilla sobre. E Paty não era sua maior fã, logo, arrebentaria Ludmilla na primeira oportunidade que tivesse. Como se tudo fosse apenas culpa dela.
Quando a morena subiu no pequeno palco, os murmurinhos cessaram e todos estavam prestando atenção em Ludmilla. Inclusive eu.
××× Ludmilla Oliveira ×××
Eu sabia que era a pessoa menos indicada para estar falando de Caio, em seu funeral. Sabia que ele merecia muito mais. Merecia uma amiga muito melhor, que fosse sincera e ignorasse qualquer coisa que sentisse pela namorada dele. Sabia que a culpa de Caio não estar mais aqui era totalmente minha. Sabia que deveria tê-lo protegido e não o fiz.
Como eu preferia que aquela bala tivesse enfiado na merda da minha cabeça.
-- Boa noite. - Disse e ouvi um murmurinho em resposta. - Eu... eu não tenho palavras para descrever o quão incrível Caio foi em toda sua vida... Um amigo sensacional, um médico incrível e uma pessoa maravilhosa. Nenhum de nós merecia Caio em nossas vidas....
Agradeço do fundo do meu coração por me deixar amá-la primeiro.
Engoli em seco, respirando fundo e esperando o nó na minha garganta se desfazer.
-- Foi uma tragédia o que aconteceu, e com uma pessoa tão boa. - Cerrei minhas mãos atrás das costas, querendo fazê-las parar de tremer. - Ele sabia o quão amado era, e isso jamais irá mudar.
Agradeci os poucos aplausos e saí dali, indo lá para fora fumar.
Encontrei Natalie mexendo no celular, na varanda. Ao me ver, ela desligou o aparelho e veio me abraçar.
-- Tá tudo bem, Lili. - Disse, abraçando-a de volta.
-- Não tá. - Ela me agarrou mais forte. - Para de fingir que não se importa, tia. Ele era seu amigo.
As palavras da adolescente foram afiadas como várias facas, me cortando.
-- Eu sei. - Engoli em seco e me afastei. - E isso é o mais foda.
-- Me sinto mal de não gostar dele. - Ela olhou para baixo e depois para cima. - Ele era bom. Mas eu nunca gostei do jeito como você só entregou a Brunna para ele.
-- A Brunna escolheu ele. - Rebati. Quem não escolheria?
-- Ele lutou por ela. Você só deixou. Como se...
-- Não merecesse ela. - Disse. - Eu realmente não mereço. - Esfreguei o rosto ao lembrar da nossa situação. - Eu não quero conversar agora, Lili.
Natalie só assentiu, e saiu dali. Me deixando sozinha.
Não sem antes se virar e dizer:
-- Você também merece ela.
E ir embora com seu vestido esvoaçante preto.
Apenas acendi um cigarro e fiquei ali. Tentando não pensar muito. E falhando miseravelmente.
××× Brunna Gonçalves×××
Não discursei. Não consegui. Não mesmo. Não senti que eu conseguiria. Caio merecia bem mais que a namorada que estava grávida da melhor amiga dele.
Voltei para casa mais cedo, e me arrastando. Sem falar com ninguém. Desliguei todas as chamadas de Paty e Gabriel. Até de Natalie. Vi o carro de Ludmilla indo estacionar na garagem de seu prédio. E senti que ela me entenderia.
Ludmilla entendia minha dor, Ludmilla sabia da verdade. Nós só tínhamos uma à outra, e nem era tanto assim. Lutei contra meu cérebro que dizia que era uma ideia estúpida, e caminhei até o enorme e chique prédio. O porteiro já me conhecia e me deixou entrar.
Subi até o último andar. E bati na porta. Três vezes.
A porta se abriu, revelando uma Ludmilla cansada e triste. Cheirando a cigarro e bebida. Ao me ver, pareceu confusa. Seus olhos estavam claramente inchados, talvez de chorar. Sua aparência estava desgastada e seu jeito era de quem havia acabado de ser atropelada.
-- Ludmilla... - Comecei. Tentei.
-- Você não pode voltar aqui toda vez que tiver um problema grandioso na sua vida, e me usar como distração. - Disse ela.
E bateu à porta na minha cara.