25 - Falando Sério

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O apartamento cheirava a fim do mundo, a densa nuvem de fumaça presa ao teto perturbou Ayla e apressou os passos assim que atravessou a porta

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O apartamento cheirava a fim do mundo, a densa nuvem de fumaça presa ao teto perturbou Ayla e apressou os passos assim que atravessou a porta.

— Se não dermos um jeito nisso, Haniel, a Ayla vai nos matar.

O comentário de Beatrice misturado ao fedor a enlaçou e arremessou para a cozinha. Munidos de bacias plásticas, corriam de um lado para o outro. A torneira jorrando tinha o som da catástrofe e jogavam água sobre o fogão. O caldo negro e gorduroso escorria na parede, a qual era branca até pouco antes de hospedá-los, e panelas escuras apinhavam-se sobre a pia abarrotada de louças para lavar.

O ambiente malcheiroso pela mistura de louça suja e fumaça embora sufocasse não foi o estopim da exasperação. O que a lançou ao total colapso foi o burburinho sob o sapato ao pisar na poça nauseabunda, sinistra e oleosa a qual se formou sobre o que um dia veio a ser um piso branco. A nojeira respingou na perna e o rastro do líquido trágico manchou a meia-calça. A cozinha de Ayla era o cenário da desolação e quis chorar pela milésima vez. Bia cutucou Haniel e ambos a defrontaram.

— Desculpe, Ayla, acho que teremos que jantar fora. — Haniel agarrou os dedos da mão e se balançou de um lado para o outro como uma criança arteira.

— Jantar fora? — berrou, fora de si. — Eu comprei milhares de pipocas de microondas para você! Como colocaram fogo na minha cozinha?

— Eu pedi para Haniel cozinhar algo saudável para nós.

O anjo balançou a cabeça, concordando com Beatrice.

Ayla desabou na cadeira, jogando a pasta plástica sobre a mesa. Dois dias! O tempo em que os deixou por conta própria. Dois malditos dias e sua casa se transformou no cenário perfeito para uma distopia! Necessitava resolver a própria vida no Mundo dos Vivos para se decidir sobre o que fazer no Submundo. Embora Beatrice tivesse insistido para chamar o novo mundo de Érebo por achar mais chique, Mundo dos Vivos e Mundo dos Mortos fazia mais sentido. Ou nenhum. Em meio ao desastre domiciliar não fazia diferença.

O dinheiro recebido do emprego abandonado mal daria para sustentá-la até encontrar outro. E a ideia de um novo emprego a fazia questionar sobre as opções no Submundo para Bastardos desempregados. Não dava mais para fingir não fazer parte da loucura, não quando se tinha um anjo viciado em pipoca e a possuída do demônio hospedados em casa.

Diogo não tornara nada mais fácil ainda que alegasse estar feliz por saber que estava bem, a questionou sobre o sumiço, estranhou a postura, as palavras usadas. Por todos aqueles anos jamais suspeitou de que soubesse tanto a respeito dela para assinalar, com certa exatidão, as palavras faladas com assiduidade. Ou como ele mesmo exclamou: "Nunca te ouvir usar essas expressões antes." Taciturnos, ambos a fitavam, ansiosos. Não conseguia se conformar que as duas pragas colocaram fogo na cozinha.

Pipocas soltas competindo pelo espaço com garrafas vazias em qualquer cômodo do apartamento ao qual adentrasse eram as letras usadas por Deus na carta escrita de próprio punho, e a mensagem decodificada significava que a combinação de Haniel e Beatrice equivalia a punição divina. Puro castigo!

E o Verbo Se Fez Carne  ⚠️Completo⚠️Onde histórias criam vida. Descubra agora