Narração Karina Coast
Sinceramente, eu acho que gosto culinário é algo bem discutível.
Tipo, raspadinha. Como as pessoas conseguem gostar de comer coisas tão frias? É literalmente gelo com groselha! Quer dizer, estamos no meio de outubro. O verão já acabou faz mais de um mês.
Não que eu não goste de sorvete. Eu tenho um gosto especial por milkshake, mas só isso. Comidas frias não me dão a oportunidade de saborear tão bem quanto as comidas quentes. É como se eu tivesse que engolir logo antes que meu cérebro vire gelo.
Outra coisa que pode influenciar: Eu tenho uma temperatura corporal alta. Quando bebê minha mãe vivia surtando querendo me levar no hospital todos os dias, pensando ser febre. Que bom que a vovó estava lá pra dizer que eu tava bem, que era normal.
Talvez a minha temperatura acabe brigando com o gelado do sorvete, tipo um... choque térmico acho. O Mochila já me explicou sobre isso uma vez, espero ter entendido certo. Deve ser por isso que não gosto tanto de sorvete e detesto raspadinha.
Por isso, acho que tenho direito de franzir o nariz para Sabrina quando ela pediu uma raspadinha acompanhada de bolinhos de amendoim.
Cake e William também pediram coisas geladas. Ela pediu por um milkshake de creme de avelã com cacau e ele brownie com sorvete de morango.
Cake o questionou se esse era seu sabor favorito de sorvete. Ele fez que sim com a cabeça. Parece que esses dois terão dificuldade em interagir.
Maxwell tem um gosto melhor do que os outros, não posso negar. Ele pediu um café expresso com alguns cupcakes de baunilha com canela e chantilly que eu recomendei.
Os outros pediram seus pratos de sempre. Mochila um capuccino, Vic seu chá ao estilo britânico, o Ricky croissant de queijo com refrigerante, e Cecelih chá verde com cookies.
E eu? Eu amo comida. Um grande medo que eu tenho é morrer antes de experimentar todos os doces da América. É triste, já que é provável que isso aconteça mesmo.
Pedi um prato diferente. Dessa vez foram três fatias de bolo de limão, um pouco de calda de morango separada em um potinho muito fofo e um chá de camomila fervendo.
Eu ouvi uma vez que refeições coloridas são mais saudáveis. Quando meus pedidos chegaram com aquele verde claro e vermelho chamativo, fiquei muito orgulhosa da minha alimentação.
—Kara, você não queria experimentar uma coisa diferente? —Sabrina pergunta confusa.
—Eu sempre experimento um doce diferente.
Ela me olhou meio pensativa por um momento. Vic pareceu perceber o que ela quis dizer.
—Sim, Sabrina. A Kara já pediu calda de morango umas mil vezes!
—Mas em combinações diferentes! —Eu me senti um pouco ofendida, amo o Sweet Tea e vou experimentar todos os pratos!
—Da outra vez ela comeu com bolo de baunilha e chantilly —Cecelih e sua memória de elefante.
—Há! Eu disse!
Enfiei o dedo no potinho com o líquido doce avermelhado e levei a boca sentindo o gosto do morango derreter e minha boca salivar ainda mais.
—Esse cupcake é muito bom.
Olhei para o lado, vendo que Maxwell falava comigo. Dei um sorrisinho convencido.
—É claro! Eu tenho um ótimo gosto para comida.
—Pensei que você tivesse escolhido uma coisa estranha pra me zoar...
A fala parecia me provocar, mas o tom estava próximo do alívio. Acho que ele não queria implicar, pelo menos, não naquele momento. Na verdade, eu também estava um pouco mais suave com ele, sei lá o motivo.
—Nisso eu sou muito confiável.
—Mas você cozinha também ou é só uma glutona?
—Eu sei fazer bolo e coisas doces. A Bela me ensina algumas coisas quando meu irmão não está em casa. E esse adjetivo é estranho, parece um velho falando —respondi tranquilamente. Eu não vou negar que sou gulosa e nem brigar. A voz dele estava amigável.
—Você prefere doces então. E... Seu irmão fica bravo por você monopolizar a namorada dele?
—Namorada? A Bela? Nunca. Eles são amigos.
Vic riu do outro lado da mesa, se desviando de sua conversa animada com Ricky para olhar para mim com aqueles olhos espertos. Como se soubesse algo que eu não sabia.
—Foi o que me pareceu —Maxwell não parecia me contrariar de propósito. Eu posso dizer que ele estava sendo sincero, depois de tudo.
—De jeito nenhum. A Bela é gentil, se importa muito com os outros. O Zack é um encrenqueiro, egoísta e tem aqueles amigos babacas que cochicham sobre mim quando ele não está prestando atenção.
Maxwell franziu as sobrancelhas encarou seu café quando eu acabei. Deve ter percebido que eles realmente não combinam.
—Eles... cochicham o que sobre você? —Ele parecia incerto da pergunta. Como se não soubesse se tem permissão pra fazê-la.
—Não tenho certeza, mas acho que é sobre minhas roupas. Ou sobre eu estar “magra demais” algo assim. Parecem garotinhas fofoqueiras ao invés de universitários.
Ele balançou a cabeça e sorriu.
Voltei a atenção pra comida.
Eu tomei meu primeiro gole do líquido claro que soltava bastante fumaça ainda. O gosto quentinho anestesiou brevemente a careta que fiz.
Credo.
—O que foi Karina? Esqueceu algo... —disse Sabrina rindo com a mão tampando a boca.
—Experimentar calda açucarada antes do chá, já é uma ideia ruim. Esquecendo de colocar açúcar então... —Mochila explicou com bom humor em quanto esticava a mão com o potinho de açúcar para Cake que passou para mim.
Coloquei três colherinhas bem cheias e mexi sem parar em quanto observava meus amigos conversando, alguns falando bem alto e outros, bem baixo.
Achei engraçado que os chás maravilhosos daqui tem o poder de me acalmar, sarar dor de cabeça e outras propriedades dependendo de qual erva pedimos na bebida. Talvez fossem poções preparadas por um bruxo ou mago.
Ri sozinha de minhas conclusões.
A partir do momento em que descobri sobre a magia, tudo a minha volta pareceu ganhar tonalidades místicas demais para passar batido.
Talvez eu tenha uma intuição de bruxa ou algo assim. Quero contar isso para o William depois.
—Um cupcake pelos seus pensamentos.
—O quê? —Olhei confusa para Maxwell que me olhava com um sorriso simples demais para ser ignorado. E isso me deixou um pouco tímida, pra falar a verdade.
—Você está pensando em algo legal, ou tem algo muito interessante nessa xícara que você está mexendo há tanto tempo.
—Ah, não percebi...
Olhei para os lados e vi que todos estavam entretidos demais com a história de quando a Sabrina quebrou a prancha de surf de um cara que ela gostava.
Toquei no braço de Maxwell, que desistiu de conseguir uma respostas e já estava encarando o teto. Quando consegui sua atenção, falei o mais baixo possível, mas sem precisar sussurrar para não chamar a atenção.
—Eu só estava pensando... agora que eu acredito, a magia parece estar em todos os lugares, coisas... até pessoas.
Ele sorriu com aquela mesma simplicidade de antes e apontou com a mão para mim parecendo empolgado.
—Também tenho pensado nisso. Não consigo ver o mundo da mesma forma.
—É, parece que mudou tudo.
—Tudo não. Só nós —pontuou em quanto desviou o olhar para o lugar.
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Cartas aos Mortos (Delphine E Os Doze Cavaleiros - Livro 1)
FantasiKarina Coast é uma adolescente imatura e comilona que vem tentando agir como um fantasma, igual aos que ela vê e tenta ignorar a vida toda, até que um conselho de uma troca de cartas com sua falecida avó faz com que descubra que seus dons vão muito...