14. Castigo

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''Ninguém pode fugir ao amor e à morte.'' - Públio Siro


Sinto que os braços de Spencer se apertam ao meu redor, como se quisesse me proteger de algo que ele nem mesmo sabia e eu, que outrora também não sabia o quanto desejava estar aqui e me sentir acolhida, segura e livre. Livre da constante ansiedade de ser outro alguém, livre de desejar aquilo que não posso ter mais, livre para apenas me permitir apreciar o quente e doce toque de Spencer, livre como apenas me sentia quando estava em casa.

Sinto meu corpo esquentar e um arrepio me percorrer, a sensação de relaxar habita em mim e me embala dentro desse abraço terno. Não sei quantos segundos, minutos ou horas se passam, mas a vontade de chorar se vai, sem ele precisar emitir uma palavra. Parece que apenas sua presença cura, ou me faz esquecer do que tanto antes precisava empurrar para dentro da gaveta. Ao lado dele, tudo parece mais fácil, essa é a famosa droga do amor. Solto um riso nasal em seu peito, menos mórbida que antes e graças a ele.

Sua mão esquerda acha espaço entre meus fios e faz um cafuné desajeitado, afinal Reid não parece ser um típico acariciador de cabeças. Respiro fundo e inflo as bochechas, criando coragem para olhá-lo depois de tanto constrangimento.

— Rodrigues...— chama, afasto o rosto enfiado em seu peito e lhe olho, de baixo. Perto, muito perto. Faço algum som e pisco os olhos rápido, tentando não cair na tentação de olhar sua boca próxima, muito próxima — Não quer sentar? — inclina sua cabeça e seus olhos brilham em preocupação. Fecho os olhos e prendo os lábios, afastando de meus pensamentos o que sua voz dita baixinha e protetora provoca em mim. Dou de ombros e confirmo com a cabeça, sem coragem de deixar minha voz ou a falha dela emitir alguma palavra. Prontamente, Reid direciona seu braço aos meus ombros e me guia até o sofá, deixando uma leve carícia em meu braço com seu polegar. Nos sentamos um ao lado do outro e sinto seu olhar atento em mim — Você quer conversar? — segue com seu tom baixo e rouco. Mordo o lábio e nego com a cabeça. Se eu falar tudo que penso, eu saio dessa casa presa, ele conseguiu afastar todos meus pensamentos nebulosos, deixando só os inadequados — A senhorita costuma ser quem mais fala de nós dois — sua mão deixa meu ombro, apenas para segurar meu queixo e levanta-lo em sua direção. Observo suas orbes cintilantes e suas pupilas dilatadas, será que os olhos dele ficam mais escuros em outros momentos também? Balanço a cabeça, afastando meus pensamentos, o que para ele parece ser uma negação a sua constatação — Não é? — me oferece um sorriso fraco, enquanto sua mão abandona meu rosto, deixando um leve toque na ponta do meu nariz com o indicador. Eu me sinto tão acarinhada agora que meus olhos queimam mais uma vez, mas agora de emoção. Talvez eu seja um pouco carente — Hm, vejamos...O que você quer fazer, Helena? — pergunta em meio ao meu silêncio. Pisco os olhos e dou de ombros. Ele percorre meu rosto, prende os lábios e cerra os olhos, quase me fazendo sorrir por ser sua expressão pensativa padrão. Inclino a cabeça na direção oposta, à medida que ele inclina a sua, como sempre — Que tal...— lhe encaro atenta, curiosa — Se eu contar algumas piadas? Alguns estudos apontam que sorrir quando se está mal pode melhorar o humor... — coça a garganta e morde os lábios, esperando uma resposta ou um sorriso, não consigo ter certeza. Aceno com a cabeça, mantendo-me calada — Certo...Freud estava um dia em seu escritório, falando...— ele limpa a garganta e ajeita a postura, a deixando mais curvada que o normal —...a análise pode ser muito penosa para o paciente e para o doutor...— não consigo manter a posse e rio com a cabeça baixa, jamais esperei que Spencer fosse fazer uma voz de velho com sotaque inglês no meu sofá no meio da noite. Vejo que ele sorri a minha reação, mas volta a sua interpretação, adicionando um cachimbo de mímica a sua cena —...isso exige uma quantidade psíquica imensa de ambas as partes, tempo e confiança...— tento segurar o sorriso e me ajeito no sofá, esperando pela continuação da piada em sua pausa dramática. Reid faz pequenos sons com a boca com seus lábios para dentro, como apenas um velho cachimbeiro faria ao pitar —...o processo de transferência e contratransferência pode gerar bastante sofrimento para os dois — adiciona uma pequena tremedeira ao seu teatro —...mas é claro que o senhor sabe disso, não é, doutor? — ele então vira-se para mim, me fazendo franzir o cenho esperando o Gran Finale — Sabe com quem ele estava falando? — nego com a cabeça — Com um espelho — ele prende seus lábios, segurando o riso. Apenas abaixo a cabeça, soltando riso nasal, incrédula com todo seu teatro para essa piada horrível — Está cada vez mais difícil agradar o público hoje — murmura divertido.

Leave Me Lonely  •  Criminal Minds (Reescrevendo)Onde histórias criam vida. Descubra agora