Vila de Llandre

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Casas de pedras, telhados de palha e ruas de lama. Essa era a vida que muitos, se não quase todos os adalis levavam. Nem sempre foi assim. Houve uma época em que eles governavam o mundo, não havia adalis nenhum nas ruas. As cidades eram prosperas, as vilas abundantes e era raro ver um adalis infeliz.

Agora Evya observava bêbados e maltrapilhos jogados nas ruas, alguns pediam por esmola, outros apenas estendiam suas mãos em forma de concha com as cabeças baixas. Esses ainda retinham um pouco da vergonha de morar na rua, esses ainda mantinham alguma dignidade e se lembravam do que diziam nas igrejas e o que era ensinado pelas famílias 'se você não puder dar a si mesmo a dignidade de uma vida boa e alegre, ninguém poderá'.

Evya deixaria alguma moeda na mão dos mendigos, mas ela não havia nenhuma. Seu estômago se revirou quando percebeu que ela poderia estar naquelas ruas muito em breve. Mas, por hora, ela seguia os lenhadores pela vila murada. O castelo se aproximava dela, alguns lançavam olhares curiosos para Evya, outros cochichavam enquanto, espantados, observavam a criança nos braços do lenhador que ia à frente do grupo.

Foi então que a jovem adalis percebeu que aquela criança que ela salvara era alguém importante. Mas quem? Certamente alguém minimamente digno de morar no castelo, foi que Evya percebeu quando os portões do castelo abriram para que eles entrassem.

Aquele era um castelo medíocre. Um espelho da vila colina abaixo. Não havia muralhas de pedra ao redor do castelo. Era um lugar simples, se comparado aos locais de onde Evya vinha. Memórias piscaram em sua mente.

Passando os portões, o pequeno grupo se viu dentro do pátio, as paredes do castelo cercavam três direções, enquanto diretamente a frente dos portões, a estrutura principal do castelo era coroada pelo sol, era quase meio-dia. Mas Evya teve pouco tempo para admirar os arredores e as diferentes casas que haviam dentro do pátio. Um adalis bem vestido e armado veio apressado até eles, seus sapatos se sujaram na lama assim que ele saiu da fortaleza.

— Por Rhagzor! — o sujeito encarava a criança nos braços do lenhador — o que aconteceu?

Os lenhadores abriram espaço para revelar a pequena Evya atrás deles. O adalis bem vestido olhou com certo desdém para Evya, que esboçou um sorriso amarelo.

— E você? Quem é?

— A garota responsável por salvar essa criança — disse o lenhador mais alto.

O adalis elegante olhou com outros olhos para Evya, retomando sua postura ele gesticulou para alguns dos guardas que assistiam aquele encontro. Os guardas prontamente se colocaram ao dispor do sujeito. Suas armaduras eram simples cota de malhas, elmos igualmente simples cobriam parte de suas cabeças e espadas curtas pediam de suas bainhas.

— Levem a jovem Aniriel para seus aposentos.

— E-ela precisa de cuidados médicos... ela perdeu muito sangue na floresta.

O adalis elegante fitou-a por longos instantes e completou:

— E chamem o médico.

— É só isso? Não vai nem agradecer a garota por ter salvado a vida dessa aí? — indignado, o lenhador que carregava Aniriel entregou-a desacordada aos guardas.

— Olha como fala da filha do conde, lenhador. Quer moedas? Além de lenhador, agora também é mercenário? Muito bem. — o adalis elegante entregou uma pequena bolsa com o que parecia poucas moedas dentro. — Tome. Agora pare de importunar.

O lenhador pegou a bolsa e deu-a para um de seus colegas. Irritados, eles se viraram e partiram em direção aos portões do castelo. Evya ainda não sabia o que fazer e ficou parada.

— E você menina? O que ainda está fazendo aqui? Xô. Os mendigos da vila ficam na base da colina.

Evya passou o restante do dia em seu quarto, numa estalagem qualquer da vila. Os lenhadores fizeram o favor de jogar a bolsa de moedas na beira da subida para o castelo, Evya deu sorte de ter sido a primeira a encontrar a pequena bolsa. Mas agora, de estômago cheio e descansando no pequeno quarto que lhe foi cedido, Evya pensava nos próximos passos. Cogitava voltar a vila de Fiskare e reaver qualquer coisa que lhe fosse útil, mas era arriscado, é claro. Talvez ela pudesse ir para a cidade mais próxima e recomeçar sua vida, quem sabe ela conseguisse um bom trabalho. Céus, até mesmo casar-se com Have parece uma boa ideia agora.

Ciente de sua própria fragilidade e incerta sobre se sua vida realmente valia a pena ser vivida, Evya adormeceu. Seus sonhos foram repletos de cavaleiros malignos e misteriosos. Uma mistura de memórias de um grande palácio branco e sangue invadiram seus sonhos. Em meio ao caos e aos gritos de pessoas do passado, pessoas que ela nunca mais viria, uma voz calma e serena cantava. Essa voz foi se tornando cada vez mais alta e o caos parecia cada vez mais distante. Diante da frágil adalena, uma figura luminosa, alada e arrebatadora pairava sorridente. Evya sentia dores em seu corpo, sentia medo, frio e fome. Mas a figura daquele anjo amenizou tudo. Diminuta e incapaz diante de tanta luz, Evya apenas se curvou e chorou.

As batidas da porta ficaram mais forte e a adalena foi arrancada de seus sonhos. Num segundo ela estava diante de uma deusa, e no outro, de volta a realidade. Um quarto minúsculo, deitada sobre finas camadas de palha e coberta com um lençol vagabundo. As batidas na porta voltaram como marteladas na cabeça da adalena, sua cabeça doía e seu estômago roncava.

— Q-quem é?

— Finalmente! — disse a vozdo estalajadeiro do outro lado — pensei que você estivesse morta. Tem alguémaqui querendo te ver.

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