Capítulo 23

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O inverno chegava com suas paisagens frias, por vezes melancólicas, e por vezes bonita, pela neve que caia do lado de fora do teatro. E parecia que nada no mundo iria fazer Ayla sair do seu próprio casulo. Ela era como uma lagarta que se recusava a abrir sua crisalida. Queria apenas se enrolar em si mesma e dormir eternamente. Permanecer fechada no inverno e quem sabe sua vida toda. Mas, a vida lhe chamava. As obrigações sociais, o seu trabalho. Os ensaios. Tudo isso a mantinha com a mente ocupada. Mas, se recusava a mudanças. Não conseguia aceitar que o mundo ao seu redor estava se alterando. Não de novo.

Lembrava-se do tempo em que vivera com seu tio. O quanto ele era esnobe e que não se importava com ela. Dos seus primos. Principalmente de David, que a perseguia pelos corredores da mansão. Seu tio fazia vista grossa, assim como sua tia. Eles não se importavam que ela sofresse, nem que usasse roupas que não cabiam corretamente. Eles a deixavam aos cuidados das babás e governantas, que pareciam ter prazer em dar castigos físicos severos, caso ela saísse da linha. E o que mais irritava ela era o favoritismo que parecia cercar os para seus primos. Enquanto ela era tratada como um peso. Obviamente um incomodo para sua família. Talvez, estivesse sendo injusta ao se lembrar do passado, pois ao menos os empregos pareciam gostar da menina, mas não interferiam, por medo de represálias. Era compreensível. Quem iria querer enfrentar seu tio e perder as recomendações para uma nova colocação? Ela sabia que a sociedade inglesa presava muito pela reputação e sem isso, ninguém era nada naquela maldita Londres. Naquela maldita ilha!

Chegou um dia que a jovem Ayla não suportou mais os maus tratos. David havia destruído uma boneca de pano dela. Ela, em sua fúria, atacou o garoto. Por ele ser mais forte, acertou uma bofetada no rosto da prima. Ela caiu no chão, e o covarde aproveitando da situação, a puxou pelos cabelos, com violência. Logo viera a intervenção, para o alívio de Ayla, mas não por muito tempo. A babá presenciou a situação, separando as duas crianças. Mas, seus tios, não desejavam ouvir sua sobrinha, apenas a trancaram no quarto, sem o jantar, para aprender a não ser uma menina levada. Ayla passou dois dias assim e parecia que iria passar muito mais, se não fosse por uma criada com bom coração. Ayla conseguiu comer e tomar água graças a criada e sair por um tempo. A criada pediu que ela ficasse na cozinha com ela, enquanto a cozinheira assava um bolo. Ayla, que se sentia aprisionada naquela casa, resolvera passear pelos jardins. E sem que ninguém percebesse, ela conseguira sua liberdade, devido ao portão aberto. Contudo, ela pensou que conseguiria lidar com as ruas. E essa mudança quase fora fatal e talvez, o fim da sua vida. Ayla poderia ter morrido. Tinha consciência disso agora. E isso devido ao fato de ter passado tanta fome e até quase esquecido seu nome. Apenas sobreviveu pela caridade de lorde Hamilton. E o cavalheiro desejava ficar adotá-la, mas ela era tão arisca que não permitia que ninguém chegasse perto. Fugira na primeira oportunidade. Pensou no seu passado, agora, adulta e se lembrou das crianças que deveriam estar passando pelas mesmas dificuldades pelas ruas. Sendo forçadas a trabalhar para sobreviver, limpando telhados e chaminés. Vivendo em situações insalubres. Seu coração se doeu tanto, pois ela viu seus amigos, um pouco mais velhos que ela, passando a mesma situação. Ela queria ter levados eles consigo, mas ao que parecia, somente ela tivera a sorte grande de ir para um orfanato.

Detestava mudanças. Não gostava delas. Como queria que tudo permanecesse igual. Como desejava que Erik não tivesse partido. Seu silêncio a machucava tanto. E em um ato impensado, movido pela raiva e despeito, aceitou se casar com o conde de Chagny. Fazia um mês que estava noiva dele. E dentro de poucas semanas iria se casar. Aceitara para de alguma maneira ferir Erik. Até mesmo enviou-lhe uma carta. E ele respondera a parabenizando. Apenas isso. Não parecia desesperado. O que a fez se sentir uma idiota e ao mesmo tempo ferida. Como poderia ter pensado que Erik se importaria com isso? E como poderia ter aceitado o compromisso, visando apenas alfinetá-lo e quem sabe chamar sua atenção? Sabia que havia cometido um erro grave. Mas, já que tinha empenhado sua palavra, iria honrar o compromisso. Mesmo não amado Philip.

Um assassino em Paris - O Fantasma da ÓperaOnde histórias criam vida. Descubra agora