É normal acreditar que as cinzas são acinzentadas ou pretas por seu fim, mas é inacreditável que quando o isqueiro queimou meus dedos, meus lábios, o ultimo suspiro de mim, fez me ver as cinzas e os tons azulados de que eu por uma primeira vez experimentei por menos do que conheço, os enfermos de minha mãe trocada pela dona de tesouras. A mentira são como cortes finos, não deixam marcas mas ardem e sangram como rios e depois que cicatrizam, você se pergunta por onde elas foram parar. Você entende meu bem? entende que a correnteza não te empurra se você decidir não estar perto da água, o vento não te derruba se você não escolher estar em pé na tempestade, ela não responderia se ficaria com você porque ela não decidiu estar perto do fogo, e porque você insistiu? eu me olhei diversas vezes no espelho e me vi como ela, me vi girando o chaveiro nos dedos, vi ela repetindo pra mim que isto não era pra mim, olhei para os casais na rua e vi vocês, decidi comigo mesma de que se ela foi digna do pedido mais belo e honesto de um ser que pensa e age por vontade própria, porque eu nunca fui tolerante a receber as ataduras do amor? porque meus cortes são tão abertos para você? se apenas te pedi um abraço e um guardanapo e não os pontos de uma cirurgia na qual eu mesma tenho que fazer, sem luvas, sem proteção, porque uma vez que aprendi que o arder é para reconhecer de que você nunca mais quer sentir a dor. Eu me formei das mentiras por ser a atriz e marionete da melancolia, como uma bailarina em uma caixinha de musica que você abriu até enjoar, até decidir de que eu não era nada, até abrir de novo pra me ver girar pra você, até você derruba-la no chão e fazer da minha casa de madeira, música e espelhos, seu consolo de dúvidas, onde você vê a madeira definhar nas suas falsas lágrimas de arrependimento e diz, "eu não quis realmente, meu amor". Se aguenta o café, a invenção do doce amargo, suas paralisias sentimentais, porque o meu amargor seria seu veneno? quando escolhi um dia te explicar que jamais controlei o que eu sentia, que as toxinas corriam no meu sangue, nas minhas veias, que as meias noites eu esquecia quem era pra enxergar o céu estrelado mais lindo que podia, que observei-me de mais até perder meus restos no chão do banheiro, de que um dia quase parei de respirar pra viver o que eu menti de um dia querer viver. Se um dia foi sua mentira, se um dia você se recusou a olhar pra mim e dizer, "Querida, eu nunca te amei", e traduziu-me com suas cartas de aversão me dizendo que não se sentia bem perto de mim, de que seguiu a pressão do tempo quando decidiu estar comigo, quando me disse uma vez de que um dia olhou pra mim e me enxergou como vazia, do dia que me matou me dizendo de que eu não era nada pra você, do dia que me descreveu como eu me enxergo ao me olhar todos os dias em quaisquer reflexos do mundo, o dia em que me enterrei por alguém dizer que vai me deixar descrevendo as exatas causas do porque um dia eu me odiei, do porque eu ainda me detesto. Se um dia nunca tive aquele otimismo da tua garota, os cabelos encaracolados, a pele clara sem uma mancha se quer, o corpo magro que nunca carregou uma impureza da carne, porque perdeu todo esse tempo buscando que eu mude? tudo o que diz soa pra mim que um dia eu pudesse ser como a versão que você queria que tivesse dado certo da mulher que você amou infinitamente antes de mim, que surtou quando a viu estar com alguém que não era você, no dia em que eu te beijei e decidi que nada seria um problema pra mim se um dia eu estivesse com você, no dia que você desenhou nos quadros de nós e fez-nos parecer bobos por um dia acreditar em um amor na qual você nunca sentiu. Porque me fez sentir o abraço da sua mãe um dia, me fez acreditar que a juventude se formava dessas coisas complicadas, me fez pensar que um dia você saberia que me amaria, mas você fez, fez como se eu fosse sua carta velha em baixo da cama, e me lê toda vez que se sente mal por nunca ter sentido nada na sua vida que realmente fizesse a pena, de que um dia as lagrimas que você já fez soltar fossem de felicidade. Por tanta indignação nunca se sabe se morreremos sozinhos ou abraçados as pedras dos túmulos sujos que nossos filhos nos lembrarão, e se até seu ultimo ápice eu decidir te amar, eu termino esta carta dizendo que eu posso não ter me amado o suficiente, mas que eu acreditei mais uma vez, e em que mundo eu estaria errada por isto? e se toda esta carta é um desabafo ao reflexo, eu te pergunto por uma ultima ou primeira vez, querido, você consegue dormir sem saber que nunca se enxergou depois de tantas garrafas quebradas?
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Sombra e luz: Tapeçaria do Eu.
PoesíaTextos feitos em balanços ao ego, á complexos e principalmente a parceiros de amor ou outros laços de relações, de tal forma pessoal, ou de que atinga o inconsciente coletivo.