Um cenário extremamente parecido com o que o meu Eddie descrevera se mostrava em toda a Hawkins enquanto eu e ele nos deslocávamos receosos entre pessoas sumindo, plantas se decompondo instantaneamente e fragmentos cinzentos flutuantes, nos dando novos calafrios a cada passo.
A bagagem que eu carregava consistia nas roupas roubadas do HHS mal enfiadas numa bolsa de mesma procedência junto daquela tesoura, um pouco de comida e minha escova de dentes, mas nada que pesasse tanto quanto a bagagem de dúvidas que me seguravam para trás, realmente nada comparado ao peso de ter trazido sofrimento para quem eu mais amava na vida para mergulhar num destino incerto no qual ele não cabia mais.
- Entendeu?
- Hein? - eu não tinha entendido.
Eddie respirou fundo antes de responder, ele me puxava pela mão ao caminhar na frente como se soubesse o caminho enquanto me detalhava o seu plano elaborado minutos antes de deixarmos a casa com Eddie e Mary.
- Mas ela se mandou da cidade, não vai estar lá - rebati quando ele sugeriu que procurássemos na casa dos "meus" pais, isto é, onde eles moravam antes de eu nascer.
- Talvez não em 1986 - ele me olhou para dizer. - mas não custa dar uma olhada em 82.
Oitenta e dois. A versão original do segundo mundo que acabamos encontrando sem querer, aquela que ainda não tinha concretizado nenhuma das dimensões alternativas que conhecemos, quando Eddie e Mary começaram a namorar. Fazia sentido, mas como chegaríamos lá?
- E como chegamos lá? - perguntei e não tive resposta. - Eddie?
- Wayne - ele sussurrou subitamente imóvel como uma estátua, a atenção voltada para algo distante que precisei avançar alguns passos e forçar a vista para enxergar. - aquele é o...
Lá na frente, um Sr. Munson muito apressado movia-se provavelmente para chegar em casa após ser liberado do trabalho devido o temporal.
"Tio Wayne", eu associei àquela época perdida em minha memória com o nostálgico sentimento de saudade com nuances de felicidade que durou apenas até que eu me perguntasse sobre o motivo de tanta surpresa vinda dele ao vê-lo, quando de repente me ocorreu: o meu Eddie havia perdido o tio durante a pandemia de 2020, apenas um ano antes do fim do nosso relacionamento. Foi uma época sombria e difícil ao que conseguia me lembrar, e até o nosso último dia de interação aquele ainda era um tópico evitado em nossas conversas. Não fazia ideia de como ele se sentia ou como reagiria àquele momento.
- Vamos - eu puxei de leve sua mão nervosamente colada à minha e apesar de não ter dito para onde, vi ele concordar e voltar a caminhar, para a minha surpresa, ignorando sua presença e seguindo um rumo diferente do que ia de encontro ao homem.
Resolvi não comentar nada e dessa forma restringimos o assunto durante o trajeto à formas com que poderíamos ajudar a Mary que estava em perigo, mas internamente eu estranhava sua atitude. Quando em fim chegamos à casa dos meus pais, passei um bom tempo imaginando o jardim da entrada em condições normais e saudáveis em vez do que encarava, onde a grama ainda fosse verde e as flores estivessem coloridas e de pé, e não murchas. Fiz isso em silêncio por alguns minutos até sugerir
- Da última vez a gente discutiu e aí fomos parar lá - eu disse sobre 82. - então o quê, é só a gente brigar feio?
Encostado na cerca com os braços cruzados ele deu de ombros como "pode ser" e começou a listar coisas que detestava em mim, uma após a outra, sem dificuldade, não como em "10 coisas que odeio em você" com uma declaração fofa no final, mas realmente irritado como quando me viu com o outro Eddie de manhãzinha. Pedi que ele parasse imediatamente.
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A Glimpse Of Us | Eddie Munson
FanfictionPode o amor resistir ao tempo? "Contemplei a loucura na qual eu estava metida: agora os dois Eddies estavam na mesma realidade e se encontrariam em breve, eu não tinha sido capaz de escolher só um deles e agora beirava uma hipotermia depois de me af...