° Capítulo 30 °

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─ O que você tem de errado, porra? ─ meu pai gritou na cara dela.

Era para ser uma conversa banal de família. Mas se esqueceram que isso não é uma família, é um hospício a céu aberto. É como se cagaram para os doentes do hospício e deixaram-os no céu aberto.

─ O que eu tenho de errado? ─ ela rebate, gritando tão auto quanto ele, empurrando seu peito ─ O que você tem errado?

─ Viro-me para meu irmão na mesa ─ Isso era para ser um Natal?

Ele da de ombros. Continuam discutindo, com nós aqui.

Era para conversar. Agora gritam. Não duvido nada que Alice na cidade vizinha, não sinta um médio abalo do terremoto Fabrício e Ester.

Senti um pouco de vergonha por estarmos resolvendo nossos problemas "familiares" na frente do resto da família. Mas fodasse. Estamos na nossa casa. Os incomodados que saiam - e é o que já fizeram, todos, levaram a festa para outro local. Até mandei Slash tirar sua família daqui, de uma forma... meio que escondido, antes que esse abalo sísmico começasse.

─ Tem muitas coisas erradas nessa porra! ─ papai grita ─ Tipo o fato de você amar mais Dantan do que a Tina! De você sempre ter transformado os dois em rivais!

─ Ele enfiou um dedo na cara dele ─ E você não ama mais sua bonequinha ruiva de porcelana do que a mim?

Senti mãos vindo aos meus ouvidos. Afastei meu irmão. Não tenho mais nove anos. Posso ouvir, devo ouvir, e quero ouvir.

─ Ela é minha filha ─ papai rebateu no mesmo tom, com olhos canteiros repousados em mim e Dantan ─ E você é doente pra caralho!

─ Você tem que parar de passar a mão na cabeça dela!

─ Ela é uma criança! ─ exclama.

─ Pai- ─ tento dizer que já tenho vinte, mas do que importa mesmo.

─ É um bebê, porra! ─ eu tentei, mas seu grito me cortou ─ E o meu bebê!

Ester começou a rir.

Meu irmão e eu nos olhamos, sem reação, como durante todo esse percurso.

─ Para de rir, sua cadela! ─ a voz dele surge das cinzas e eu nunca pensei que a chingaria ─ Admite que você não ama mais Dantan como antes porque ele é viado!

Cobri a mão com a boca, tentando não rir.

Viado. Também achei que meu pai nunca falaria isso.

Ela grita algo. Não ligo, pois sigo tentando não rir pela cara do meu irmão.

─ Você é uma péssima mãe, Ester. ─ ele admite, de voz calma, e meu riso é consumido. ─ Eu nunca percebi isso. Meu amor por você me deixa cego. Você foi ruim para as crianças, foi ruim para mim.

Eu me vi abismada, notando que uma vez na vida meu pai teve opinião formada, que uma vez foi contra ela.

Lágrimas de dor preenchiam os olhos de meu pai. Também nunca o vi chorar por culpa dela - ou pelo menos, não, não na minha frente.

─ Mas ainda assim... ─ aquelas lágrimas grossas brotam de seus olhos, escorrendo, pingando para fora. Ia me levantar para abraça-lo, só que Dantan me segura ─ não me arrependo de nada. Você me deu filhos incríveis. É uma pena que você não perceba isso. Que não perceba o quão especial essas crianças são... ─ seus olhos se fecham ─ mesmo não sendo mais crianças.

Para eles, não estávamos mais ali, então estavam a vontade para fazer e dizer qualquer coisa.

Seus olhos abrem, já sem lágrimas, tão seco quanto suas próximas palavras.

❛ ANJO CAÍDO 2 ❜ ‣ Slash Onde histórias criam vida. Descubra agora