- Eu não tranquei a porta...?
Ao subir pela escada na lateral do pequeno complexo de apartamentos e adiantar o corpo até a entrada da sua respectiva moradia, a porta encostada mostrava um vão sutil por onde o ar de fora entrava para o corredor.
Batendo-a logo atrás de si e fazendo questão de girar a chave até que a trava alcançasse o fim da fechadura, Theoto cobriu o rosto fazendo como que uma concha com ambas as mãos e, em seguida, suspirou amargamente.
Essa sua ação não tinha nada a ver com o cansaço de estudar pela manhã, tampouco por ter que caminhar bastante até chegar em casa. O Sol do meio-dia realmente mexia com seu cérebro à medida que ele voltava a pé, e isso era o bastante para que o garoto se incomodasse o suficiente para ter esse tipo de reação. Ademais, o fato de que estava gradativamente esquecendo de trancar a porta da frente também ajudava para essa frustração.
Não se lembrava ao certo quando havia começado, mas as coisas foram escalonando a ponto de, pelo menos, três vezes na semana Theoto acabar deixando a porta ou uma janela aberta, e isso não poderia continuar. Mesmo que a área onde morasse era segura o suficiente para nunca ter tido qualquer tentativa de assalto aos moradores em anos, simplesmente não era agradável dar sorte ao azar.
Por isso, quando encostou a mochila ao lado da sua cama, pegou uma folha do caderno e escreveu de forma chamativa: "TRANQUE A PORTA DA FRENTE". Posta na frente da geladeira, suspensa por uma fita colocada na parte de cima, o aviso estava em um lugar que não tinha como passar despercebido.
A expectativa era de que, com isso, as coisas iriam melhorar. Se iriam mesmo, era Theoto quem decidiria ao não esquecer de olhar para a geladeira, nesse caso. Soluções sempre são achadas, mas novos problemas surgem a partir disso, e o garoto tinha que estar esperto para não baixar sua guarda.
Mas enfim, após beber um copo de água, o jovem rapaz cambaleou até o quarto e, sem qualquer tipo de preparação, jogou-se na cama. Era uma ação rotineira, tal qual o edredom já possuía certas marcas do corpo do garoto, onde ele só precisava encaixar o corpo. Além disso, era um milagre que a madeira não tivesse cedido, mesmo depois de tanto tempo.
O ambiente aconchegante estava envolto por um sutil sopro gelado, muito provavelmente por que a porta da frente estava aberta desde que ele saiu de casa, e as cortinas fechadas seguravam a claridade do mundo exterior, com apenas pequenos feixes pálidos iluminando as frestas e apenas dando a impressão de que podiam se ver a forma dos objetos na escuridão.
- Quando foi que esse quarto começou a parecer maior do que era...? - comentou, enquanto aproveitava o cheiro do travesseiro.
Depois de ter esclarecido melhor com Ryan sobre o horário de sua chegada e qual trabalho exatamente ambos fariam, Theoto ainda conseguiu tempo para tentar decifrar as silhuetas e formas que estavam além do escuro.
- Quem diria que alguém como ela perdesse tempo com vídeo game, também...
Enquanto alongava o corpo cansado, ele ficou se lembrando da conversa que teve com os amigos de Ryan.
O que estava contribuindo para o forte cansaço repentino era o incômodo do garoto em frequentemente esquecer das coisas. Ele só não estava mentalmente estável para resolver isso o mais rápido possível, mesmo que fosse algo simples.
- ...A vida é mesmo uma caixa de surpresas - disse o rapaz, enfiando a cara no travesseiro.
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A Garota e a Chave
RomanceApós o início de mais um ano, começa o novo período escolar. O retorno dos dias pacíficos e maçantes teve início, mas logo fora interrompido por uma presença feminina um tanto quanto... súbita. "Você é irritante demais para ser ouvido--".