Perseguição?

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Tarik Pacagnan

Estou no hospital há alguns dias e não tive problemas em me adaptar rapidamente. Ainda não conheço muitas pessoas e nem sei me locomover por muitas partes do prédio sozinho, mas aos poucos vou conseguindo alcançar esses objetivos. Durante todos esses dias, tiro uma hora do dia para poder conhecer um pouco mais do prédio e aproveito, para fazer uma caminhada, já que não estou liberado para isso nem tão cedo. Mikhael me disse que não tenho data prevista para sair do hospital para fazer algo, mas eu não me incomodo com isso, pois realmente gosto desse ambiente ameno. Por enquanto, apenas consegui ter Felipe como um amigo e para mim, está de bom tamanho. Ele é uma ótima companhia e fazemos bastante coisas juntos. Na verdade, passamos a maior parte do tempo juntos, tentando criar coisas novas. Agora, já consigo ver o hospital como um lar. Sou muito bem cuidado por pessoas que realmente se importam e se preocupam comigo. Nunca tive isso em toda minha vida, então, está sendo uma experiência nova e muito boa. Por mais que vem acontecendo coisas estranhas no hospital, acho que é questão de tempo para acharem o culpado e voltar tudo a ser em paz. Tento não pensar nisso, porque estar aqui nesse hospital, é a melhor coisa que me aconteceu. Não quero que tudo seja horrível, não de novo.

No momento, estou no berçário. Um dos primeiros locais que aprendi o caminho, foi aqui. Realmente, um local muito reconfortante. Ver os bebês recém-nascidos me acalma e faz todos os problemas irem embora da minha mente. Mesmo tendo esse vidro que me separa deles, consigo notar todos os seus traços. Espero que todos eles tenham uma boa família e sejam amados, isso é o que mais desejo. Não tenho muitas fotos de quando era menor, acabei perdendo a maioria, o que me deixa um pouco chateado. Não tenho muitas memórias da minha infância e eu realmente me pergunto se isso é algo bom ou não. Não tenho pai, mãe e nem irmãos. Sinto falta de ter uma família que me amava. Na verdade, eu nem me lembro do sentimento de ter uma família. Para mim, agora, minha família é o Mikhael, Felipe e Rafael. Pessoas que vem me ajudando muito nos últimos dias e eu faria qualquer coisa para poder retribuo-los. Sei que não estou aqui por muitos dias ao ponto de conhecer eles de verdade, mas tenho certeza que os mesmos são melhores do que minha família de verdade. Sorrio enquanto olho mais um bebê sendo colocado ali.

— Você também gosta de ficar aqui? — Acabo levando um pequeno susto com a fala de alguém que não havia sentido a presença. Olho para o lado e é Batista. — Desculpa por ter te assustado. — Ele sorri, se virando para mim e me olhando de cima a baixo.

— Sim, eu gosto de ficar aqui. É um lugar que me conforta. — Permaneço olhando para os bebês, sentindo seu olhar ainda em mim.

— Te observar assim, também é confortante. — Sinto minhas bochechas queimando e tento não parecer envergonhado ou até mesmo, desconfortável com sua fala. Isso é tão estranho, ainda mais vindo dele. — Ah! Você decorou mais a sua porta? Passei por lá e notei algo de diferente.

— Bem... Não necessariamente. — Tento pensar em algum detalhe que coloquei ao ponto das pessoas repararem, mas nada me veio na mente. — O que você viu?

— Mais desenhos! — Fico em dúvida sobre aquilo. — Se não foi você, pode ter sido Felps, não é? Vocês dois parecem se dar tão bem! Fico feliz por ele ter conseguido uma amizade como a sua. — Lentamente, ele coloca sua mão em meu ombro, fazendo um breve carinho com o polegar. — Sua presença é boa, Tarik.

— Obrigado? — Falo em um tom de pergunta, achando tudo aquilo muito desconfortável. Nós nem se falamos, onde ele queria chegar com tudo aquilo? Não é como se o mesmo tivesse toda essa liberdade para falar comigo, é até desrespeitoso. — Nem somos próximos, me impressiona você dizer isso.

— Sua presença é notável em todo o hospital. — Ele guia sua mão até meu cabelo, bagunçado-o. — Gostaria de ficar mais, porém minha agenda é cheia. Até mais, Pac! — Me despeço dele em seguida e fico estático por um tempo, pensando o quanto aquele diálogo foi estranho, em antes de resolver voltar para o meu quarto.

Caminho lentamente tentando processar o que havia acabado de acontecer. Eu e Batista conversamos apenas uma vez desde que cheguei no hospital, não faz sentido ele me dizer palavras tão estranhas. Entenderia se fôssemos próximos, mas nem isso somos. Notei que ele é um dos melhores médicos do hospital, mas é o que menos tem proximidade com os outros médicos e costuma ficar sozinho, somente tendo contato com seus pacientes. Não sei se ele se afasta assim por vontade própria ou se tem algo que o mesmo possa ter feito que afetou sua reputação entre a equipe. Além de tudo, ficarei com isso na cabeça por um bom tempo. Se ele decidir fazer isso de novo, provavelmente falarei com Mikhael, pois não posso confiar em alguém aqui dentro, apenas por ser um médico. Suas frases nem ao menos faz sentido e isso me trouxe medo. Sim, Batista é uma pessoa muito simpática e parece se preocupar com seus pacientes. Eu o observava trabalhando - assim como todos os outros médicos - e da para ver claramente que ele é bom no que faz e não é atoa que é nomeado um dos melhores. Talvez ele seja assim com todos, talvez não seja. Cresci numa família que pouco se importa comigo, por isso, acabo pensando demais por conta de certas situações, mas eu acho isso positivo, principalmente para conseguir me defender de algo futuro.

Viro o corredor que da acesso ao meu quarto e logo de longe consigo ver desenhos em cor escuras que não estavam ali até eu sair. Me aproximo um pouco mais e percebo que são desenhos normais, assim como os que já havia feito. Poderia ser Felipe, assim como Batista me disse, mas ele não faria algo em minha porta sem nem ao menos me avisar. Confesso que isso me deu um pouco de medo, pois me lembrei do desenho colado em minha parede há alguns dias atrás e ainda por cima, foi feito de sangue. Observando aqueles desenhos, aparentava ser tinta mesmo. Adentrando em meu quarto, entro em completo desespero. Ele está completamente revirado, com coisas quebradas e jogadas ao chão. Entrando lentamente nele, consigo ver um bilhete jogado entre aquela bagunça, mesmo tremendo, pego-o e nele está escrito "eu irei voltar" com uma caneta azul comum, em letras maiusculas. Me levanto do chão, já sentindo lágrimas passando pelo meu rosto e saio correndo, deixando a porta aberta e levando comigo apenas aquele bilhete. Saio de forma desesperada, procurando por Mike. Agora eu tenho quase 100% de certeza que o alvo era eu, ou pelo menos, eu sou o principal deles. Passei anos sofrendo nas mãos da minha família e quando chego aqui e finalmente me sinto em casa, não consigo ter paz. Assim que encontro quem estava procurando a algum tempo, vou correndo em sua direção e lhe abraço forte, desabando ainda mais em lágrimas.

— Ei, Pac... Tá tudo bem, eu tô com você agora. — Mesmo ele não sabendo o que havia acontecido, me passa toda a segurança possível. Coloco meu rosto em seu busto coberto por seu uniforme, tentando ficar calmo para poder contar sobre o que acabei de ver.

Sei que estou em perigo, mas tendo Mikhael me apoiando, as coisas se tornam mais suportáveis.

Falsas pistas (Mitw).Onde histórias criam vida. Descubra agora