Boas convivências.

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Mikhael Linnyker

Após conseguirmos estabilizar Felipe, opto por ficar próximo do quarto de Tarik, apenas verificando se essa mesma pessoa não voltaria novamente, e até mesmo, não fizesse algo com o mesmo. Essa situação está ficando cada vez mais extrema e o que mais me impressiona é o fato de que os investigadores não parecem estar tão preocupados assim para encontrarem essa pessoa que tanto vaga por este hospital. É algo muito confuso: Como ninguém não vê? As câmeras estão aqui, existem pessoas para vigiarem durante 24h ao dia. É como se realmente estivessem fechando os olhos e fingindo que nada está acontecendo. No fim de tudo, acho que será sempre nós quatro - eu, Felipe, Rafael e Tarik - e precisaremos ir atrás dessa pessoa por conta própria. Porque pelo o que parece, somos o que mais nos precupamos com isso, os outros desse hospital estão vivendo suas vidas como se nada estivesse acontecendo. Claro que eles estão dessa maneira, não é eles que estão sendo um alvo, então, tudo se torna irrelevante. Se para mim já está sendo agoniante, imagina para Tarik que precisa viver dessa maneira, com medo de acontecer algo a qualquer momento. Não estou aqui para ele o tempo todo e a preocupação vai tomando conta de meu corpo, que é quase impossível exercer meu trabalho de forma realmente profissional. Estou disposto a resolver isso, nem que seja preciso resolver de outras maneiras.

Tarik é um menino bom. Mesmo passando por tudo isso, ele é capaz de colocar um sorriso no rosto e tem o objetivo de tentar animar alguns pacientes. Nunca vi um paciente tão carismatico como ele. Da para perceber o quanto o mesmo é grato por estar aqui e ser cuidado. Apenas por poder ter a oportunidade de conhece-lo, para mim, já é uma forma de retribuição. Por ele, eu sou capaz de ir a qualquer lugar, apenas por ter certeza que ficará bem. Não sei quem é essa pessoa, mas sei que é ou pelo menos, já foi um médico. Alguém que não conhece o hospital, não teria capacidade o suficiente de conseguir se desviar das câmeras. E sinceramente, olhando em volta, não consigo ver alguém que realmente gostaria de fazer mal a Tarik e se faria, não consigo imaginar qual seria o motivo. Ele chegou agora e não existem nem motivos para tentar atingi-lo de alguma maneira. A única explicação, poderia ser, que querem me atingir através dele, mas isso não é nada confirmado. Infelizmente, é preciso esperar um pouco mais para poder ter certeza do que essa pessoa é capaz de fazer e principalmente, do que ela irá fazer. Precisamos ir juntando pistas de tudo o que conseguimos. Acredito fielmente em Felipe e tenho certeza que ele viu uma pessoa na porta de Tarik, até porque, essa não foi a primeira vez. Andando em direção ao quarto dele, dou de cara com Batista. Fazia tempos que não o via.

— Ah, Mike! Você anda trabalhando tanto, cara. Mal te vejo. — Ele me abraça forte. Um abraço um tanto quanto reconfortante em uma situação como essas. Batista é um grande amigo e por mais que não somos tão próximos, já estamos convivendo juntos aqui no hospital, já vai fazer alguns anos.

— Pois é... A situação aqui no hospital não tá tão fácil ultimamente. Tarik vem sendo a minha maior preocupação e você sabe o porquê. — Ele me escuta atentamente, sem me interromper, enquanto se encosta na parede, relaxando suas costas.

— É, tô sabendo... — Ele parece pensativo. — Nunca pensei que isso poderia acontecer aqui. É assustador, imagina para você que é médico responsável por ele. — O mesmo posiciona uma de suas mãos em meu ombro direito. — Mesmo não podendo ajudar muito, saiba que tô aqui, caso seja necessário.

— Agradeço imensamente, Batista. O Rafael vem me ajudado bastante e acho que podemos ir reunindo algumas pistas sobre quem possa ser. — Vejo meu relógio e percebo que está ficando tarde. Me preocupo com Tarik ainda mais nessas horas, mesmo sabendo que essa pessoa pode ser capaz de fazer algo com ele em qualquer horário do dia. — Acho melhor irmos trabalhar, né?

— Sendo sincero, provavelmente essa pessoa não tá sozinha. Acho melhor tomar cuidado. — Pensando por esse lado, realmente, ninguém seria tão burro ao ponto de agir sozinho. Todo cuidado é pouco. — A gente se vê, Mike!

Ele começa a andar para o lado ao contrário de mim e eu continuo o meu percurso até chegar ao local que queria: O quarto de Tarik. Antes de entrar, bato em sua porta e abro-a lentamente, para não assusta-lo de nenhuma maneira. Ele está sentado em sua maca, enquanto assistia algo em seu notebook. Aliás, é um aparelho muito antigo e provavelmente não tão bom. Já sei qual será o presente ideal para o dar em seu aniversário que é daqui uns meses.

Achei que não iria vir. Estava demorando muito. — Ele me recebe com um sorriso, enquanto deixava seu notebook de lado para dar total atenção a mim. — Enquanto não vinha, organizei mais o meu quarto, você gostou? — Está quase que brilhando de tão limpo e ele havia mudado algumas coisas de lugar, o que deixou o cômodo com um ar ainda mais dele. Ter seu próprio espaço deve ser libertador.

— Tudo o que você faz, fica lindo. — Me sento em uma poltrona que havia ali no quarto e acomodo minhas costas, sentindo elas bem doloridas pelo dia cansativo que tive de trabalho. Mas me sentir assim, me faz sentir bem, pois sei que ajudei muitas pessoas. — Você jantou? — Ele assenti. — Não mente pra mim, Pac. Eu te conheço. — Digo um pouco sério e ele revira os olhos. Acho que o mesmo odeia o fato de eu o conhecer muito bem. Sempre percebo os comportamentos dos meus pacientes, assim, é bem fácil perceber quando eles estão mentindo sobre algo.

— Eu deixei a comida ali na mesa. Não tava com fome quando trouxeram. — Ele diz, não olhando para mim, mexendo em seus dedos. Suspiro e me levanto, indo em direção a comida e me sentando em sua maca, em seguida.

Vamos dividir? — Ele ficou assustado, mas sabia que não iria recusar um pedido meu, ainda mais um desses. O mesmo faz um mínimo movimento com a cabeça, confirmando e assim, pego dois pratos descartáveis que estavam ali e consigo dividir a comida para nós dois. Confesso que estou com fome, então, foi uma ótima ideia. Aliás, ver ele comer, me deixa bem seguro sobre estar seguindo o tratamento corretamente.

— Mike... Você não vai ficar cansado pra trabalhar amanhã? Tá bem tarde... — Enquanto se alimentava, ele olha para o relógio de parede, que pontuava exatamente 03:26 da manhã.

— Eu tô sem sono... e com fome. — Ele solta uma mínima risada com minha fala e continua comendo.

— Você é preguiçoso ao ponto de não ir na cozinha pra comer? — Assinto e ele bate em meu braço, de forma leve. — Como você quer que eu tenha uma boa alimentação, se você não tem? — Sentia seu olhar sobre mim, mas permanecia olhando para baixo. Sei que não sou o melhor em relação a alimentação, mas tenho o dia muito cheio para pensar sobre isso.

— Bom... Você quer que eu venha jantar com você nos dias que eu estiver de plantão? — Ele assentiu, bem animado. — Ótimo! Agora não precisa se preocupar comigo. — Deveria ser exemplo para ele e poder ter a oportunidade de ve-lo comer, me deixa menos preocupado em relação ao mesmo estar seguindo o tratamento corretamente.

Sei que não está tudo bem e que vim para cá, porque quero protege-lo, mas quero criar memórias boas com ele. Sei que não irei conviver com o mesmo a vida inteira e que ele irá embora daqui uns meses, assim que melhorar, por isso, quero ter as melhores vivências possíveis, mesmo sabendo que nem tudo, está ao meu alcance.

Falsas pistas (Mitw).Onde histórias criam vida. Descubra agora