O ninho solitário

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Como seria lá embaixo?

   Jouie era um pássaro pequeno e feio. Era um filhote de azulão e não tinha mais do que cinco dias de vida. No momento, encontrava-se sozinho no ninho, na companhia das cascas de ovo quebrado que viria a ser seu irmãozinho se, acidentalmente, sua mãe não o tivesse quebrado. Inclusive, fazia exatamente um dia que sua mãe havia saído para buscar-lhe alimento. Saíra do ninho na manhã anterior, instruindo Jouie a permanecer imóvel e em silêncio, que dentro em pouco ela voltaria com o "café da manhã".

   Jouie permanecera em silêncio até aquele momento, mas a fome apertava tanto agora que sentia vontade de piar. Teve uma súbita sensação de desepero, solidão e amargura quando pensou que sua mãe, provavelmente, teria o abandonado. Mas que mãe-pássaro abandonaria seu próprio filhote?

   Sentiu uma vontade enorme de pular embaixo, no solo, mas encontrava-se há alguns metros de altura e, no entanto, sua estatura frágil e desengonçada não o permitia que o fizesse. Não tinha o belo par de asas que necessitava para um primeiro vôo, e nem sabia para onde ir se o tivesse.

   Esperou pelo retorno da mãe por mais alguns minutos, na ingênua esperança de ver, a qualquer momento, surgir no horizonte sua amável e fraterna figura, para tranquilizar-lhe a alma. Mas, quando convenceu-se de que ela não voltaria mais, surgiu-lhe repentinamente um forte impulso de independência.

   Olhou para baixo, decidido a descer dali e tomar um rumo qualquer. Para um passarinho como ele, filhote e sem nenhum resquício de penugem aparecendo, era fácil que qualquer predador que estivesse a espreita, longe da segurança do ninho, o encurralasse para nunca mais ver a luz de outro dia. Isto sua mãe lhe dissera. Mas Jouie ainda não vira nenhum predador por ali. Logo, começou a pensar que tudo que sua mãe havia lhe dito era mentira.

   Escorregou para fora do ninho com muito cuidado, calculando minimamente os movimentos necessários para a descida. Na árvore em que estava, haviam mais três galhos menores logo abaixo daquele em que estava o ninho. Galhos não tão grossos quanto aquele, mas ideais para amortecer a queda. Jouie não se deu conta disso na hora de saltar, mas saltou.

   Na queda, seu corpo minúsculo de azulão despenado bateu nos dois primeiros galhos, e depois, direto no chão. Suas minúsculas costelas logo começaram a doer. No entanto, estava no chão, como queria. Livre do ninho afinal, mas não dos perigos. Seu bico doía e uma de suas asinhas parecia estar quebrada. Nunca antes havia sentido dor alguma.

   Segurou o piado até onde pôde, mas não mais podia controlar seu instinto natural de filhote, não diante de uma dor. Logo, soltou um piado agudo, estridente e repetitivo, fazendo-se ouvir por metros de distância.

   Neste mesmo momento, surgiu do meio das árvores um pássaro amarelado. Com charme e graciosidade, aterrissou cuidadosamente no solo onde Jouie se encontrava. Deu uns três pulos na direção dele, como quem analisa a situação.

   — Se machucou, criança? — perguntou o pássaro amarelo. — Venha! Levante-se. Não é seguro que fique aqui. Se aquelas malditas gralhas te encontrarem nesse estado, elas fazem picadinho de você.

   O que seriam gralhas? Jouie pensou. A piadeira ficara menos intensa, porém, a dor não diminuíra.

   — E agora? Como hei de levá-lo para cima? — indagou o outro, provavelmente referindo-se à árvore em que Jouie estava. — Vou tentar levá-lo para o ninho novamente.

   — Não! — exclamou Jouie. — Não me leve de volta para lá! Minha mãe abandonou-me no ninho. Saiu ontem para buscar alimento e até agora não retornou. Tire-me daqui! — Jouie estava realmente desesperado, tanto que nem ao menos perguntou o nome daquela bela criatura.

   Realmente, o pássaro que estava diante dele era muito belo: o tom amarelo-esverdeado de suas penas em contraste com o verde-oliva de suas costas fazia com que Jouie sentisse um pouco de inveja, por não ter ele plumagem nenhuma.

   — A essa altura, sua mãe já deveria ter voltado. — falou o pássaro. — Você é um filhote de azulão e, logicamente, as mães azulões não abandonam seus filhotes. Absolutamente nunca os abandonam.

   Terminando de falar, o pássaro agarrou Jouie pelas pequenas asas e o levou a uma árvore que ficava a alguns metros dali. O pequeno filhote de azulão nunca experimentara tal adrenalina; nunca estivera em outra árvore antes em seus cinco dias de vida. Seu corpo ainda estava todo dolorido, e aquele vôo! Ahh! A sensação que tinha era de incômodo, e ao mesmo tempo, de grande liberdade.

   Embora aquele pássaro amarelo tivesse uma aparência bastante agradável, suas garras não estavam nem um pouco agradáveis, fixadas com vontade na pele sensível de Jouie.

   — Pronto. — disse o pássaro amarelo, soltando Jouie cuidadosamente num galho coberto de folhas. - Aqui está seguro.

   Jouie já estava começando a gostar daquele passaro simpático e, ao mesmo tempo, cativante.

   — Agora, deixe-me apresentar. Suponho que não saiba de qual família eu seja; e suponha-se que não saiba nem mesmo quem tu és. Quanto a mim, sou da família Parulidae. Entretanto, nossa espécie vive um pouco afastada dos outros Parulidae. Me chamo Muri e sou um canário-do-mato.

   Depois houve um curto período de silêncio entre eles, um encarando o outro, Muri olhando para Jouie como se pensasse no que iria fazer com um filhote abandonado.

   — Não sei se minha família, digo, o meu grupo, apreciará a ideia de tê-lo conosco. — disse o canário. — Mas também não poderia deixá-lo aqui, a mercê das gralhas comedoras de filhotes.

   — O senhor precisa me levar daqui, senhor Muri! — Jouie só pensava, nesse momento, em encontrar um abrigo o mais rápido possível. — Posso ser útil de alguma forma.

   — Pode ser útil?! Não mesmo! — disse Muri, com um leve tom de sarcasmo que Jouie não percebia. — Como se chama?

   — Jouie. Pelo menos, era assim que minha mãe me chamava.

   — Venha comigo, Jouie. Talvez encontremos sua mãe por aí na floresta.

   Dizendo isto, o canário agarrou Jouie pelas asas novamente e alçou vôo, seguindo para noroeste.

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O Vôo dos Pássaros Nortenhos [PARTE I]Onde histórias criam vida. Descubra agora