Valentina

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Valentina estava ali, naquele começo de manhã, olhando para o horizonte distante daquela praia chamada Praia das Pedras

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Valentina estava ali, naquele começo de manhã, olhando para o horizonte distante daquela praia chamada Praia das Pedras. Ela estava empoleirada num coqueiro alto e velho, que se balançava de um lado para o outro ao sabor do vento.

  Valentina era uma coruja-orelhuda. Estava cansada e com sono, pois caçara a noite toda. Comera um rato grande e um morcego, e, portanto, estava cheia. Há tempos não comia tão bem.

  Todas as manhãs, após a caça, Valentina ia para aquele mesmo coqueiro, por doze anos. Durante 12 anos, servia aos cardeais-do-nordeste como vigilante dos arredores da Costa Norte, próxima a Floresta Frutífera.

  Assim que os seus pais a expulsaram do território do ninho em que havia nascido, com apenas 4 meses de vida, Valentina voara para o Norte, sempre em busca de novos territórios de caça. Voou, voou, até que chegou à belíssima Floresta Frutífera, pela qual encantou-se. Ali também havia muita caça, o que a fez ficar.

  Mas isto foi há muito tempo, numa época boa; tempo em que a floresta ainda era governada por quem entendia de justiça, misericórdia e sabedoria: John Brason. Sim! Valentina o serviu com gosto e satisfação, ao contrário do “novo Rei” que haviam escolhido para ocupar o seu lugar. O mimado Wilhelm não entendia nada de política.

  Contudo, “segundo as leis dos cardeais”, John Brason não vivia mais no continente; havia sido deposto e exilado na Ilha Primeira. Valentina estava de guarda quando levaram o rei. Ela sabia que era o rei que estava enrolado ali, naquela enorme folha de abacateiro; sua intuição nunca falhava — vinha de uma longa linhagem de corujas videntes —, e os boatos corriam soltos na Floresta. E além de tudo, os cardeais-do-nordeste nunca saíam do continente, nem sozinhos, nem em bandos.

   Depois que derrubaram Brason, Valentina saíra imediatamente do serviço do Exército. Seus princípios e natureza justa não permitiam que ela ficasse por mais tempo, pois estaria vivendo em prol de uma mentira, e lutando por uma causa que não era sua. Ela viera para o Norte em busca de condições melhores de vida, e não a interessava nem um pouco servir como encarregada de alguém. E ela poderia muito bem ser independente, pois, como uma ave curiosa e experiente, já conhecera toda a Floresta Frutífera e seus arredores. Sabia onde ficava cada recanto, esconderijo e atalho daquele Reino e, consequentemente, podia muito bem esconder-se, rebelar-se e não trabalhar mais.

   Já fazia quase um ano que largara o seu serviço de vigilante, desde o dia que Brason fora levado, e ainda não tinham notado sua ausência no posto. Primeiro, porque os cardeais-do-nordeste e demais aves eram criaturas diurnas, e não a caçariam à noite; segundo, porque, mesmo que a buscassem, nunca a encontrariam. Valentina sabia se esconder melhor do que qualquer ave das redondezas.

   Ali, naquele coqueiro onde estava, era um dos lugares perfeitos para repousar durante o dia, visto que os cardeais e os outros pássaros do Exército nunca frequentavam a praia; mas Valentina não ficaria ali por muito tempo; logo depois do nascer do sol, voaria para o seu esconderijo em uma palmeira de folhagem densa ao Sul daquela praia.

O Vôo dos Pássaros Nortenhos [PARTE I]Onde histórias criam vida. Descubra agora