O vôo de caça

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O pai de Théo o tinha punido com o “castigo” de ficar no Palácio enquanto ele concluía o trabalho de conquista do continente; Haroldo fora para a Praia das Pedras com seu exército colossal e deixara Théo para trás, para que guardasse o território do Palácio e os seus arredores. Théo estava gostando muito da tarefa, a propósito. Só pelo fato de saber que seu pai estaria bem longe dele, sem interferência em suas escolhas e vida pessoal, seria ótimo.

   E pelo quê, afinal, Haroldo estava castigando Théo, já que declarou “que uma águia jovem e fraca, não é digna de ver e participar das principais conquistas de seu povo”? Théo bem sabia que o motivo principal era devido à sua “incompetência e fracasso” na missão contra os Sentinelas do Povo.

   Théo fora mandado para encontrar e exterminar aqueles pequenos rebeldes, um ótimo teste para águias jovens e combatentes iniciantes. Contudo, ele mentira para Haroldo dizendo que não encontrara os misteriosos combatentes, sendo que houvera achado seu esconderijo, juntamente com Melvin, a Coruja-real. Felizmente para Théo, aquela rapinante não o delatou.

   Mesmo assim, seu pai não se contentara e o punira com sua dolorosa indiferença, ou melhor, não tão dolorosa assim. Não para Théo; na verdade, ele gostava quando seu pai o tratava como um objeto qualquer; esse era o momento em que Haroldo quase se esquecia das esperanças e expectativas que depositava em Théo, e este se sentia livre, quase como se não fosse filho do poderoso Rei das águias-serranas. Quase como se não se esperasse dele as intransigentes imposições concernentes a um príncipe.

   Théo estava no topo da rocha a que chamavam “Palácio Resplandecente”. O cenário magnífico se estendia ao seu redor, por todos os lados. Dali, com sua excelente visão, Théo avistava toda a Floresta Frutífera, em toda a sua magnificência. Dali, ele tinha uma vista panorâmica privilegiada de toda a região.

   Do topo do Palácio, a paisagem era um mosaico de cores e texturas, com o verde vibrante da vegetação nativa da caatinga contrastando com o azul claro do céu. A formação rochosa sobre a qual Théo estava, que se assemelhava realmente a um palácio, se destacava no cenário, elevando-se majestosamente sobre a paisagem.

   Olhando para o horizonte, Théo via as colônias, bandos e ninhadas ao longe, com suas casas e árvores formando um mapa vivo da atividade aviária. As serras ao redor, parte da Serra de Fênixaranovo nome dado àquela região serrana pelo pai de Théo —, adicionavam um contorno dramático ao panorama, com seus picos e vales que se perdiam na distância.

   Ao amanhecer ou ao entardecer, os raios do sol banhavam a paisagem em tons dourados e laranjas, criando um espetáculo de luz e sombra que realçava a beleza natural da região. Era um lugar de tranquilidade e contemplação, onde se podia sentir a grandiosidade da natureza e a serenidade do ambiente.

   O rio Brilhante serpenteava bem próximo dali; ele vinha de Oeste, cortando a Floresta Frutífera pelo meio, e continuava em direção a Nordeste, até desaguar no Oceano.

   Era acima da terceira hora do dia, quando Théo decidiu que não iria ficar ali, em situação claramente entediante e passiva. Embora a contemplação daquela paisagem não fosse um dos piores passatempos que uma ave de rapina poderia querer, estava na cara que Théo não passaria ali o resto do dia. Não foi para isso que veio para aquele Reino, afinal de contas. Saiu de Gaivor para provar o seu valor, para dar orgulho à sua espécie e ao seu povo. Quantas daquelas paisagens havia visto durante a sua vida? Não poderia contar as vezes.

   Abriu as asas e as bateu, planando no ar.

   — Michel — disse ele a um dos seus capitães —, fique em meu posto e vigie com os outros. — Como de costume, Théo não falou para onde ia. Seus guardas já haviam habituado-se às suas maneiras principescas.

O Vôo dos Pássaros Nortenhos [PARTE I]Onde histórias criam vida. Descubra agora