Morrer

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A cada dia que passa estamos mais próximos da morte, a cada segundo, minuto, horas despejadas como água nesse largo rio que corre sem nunca chegar a lugar nenhum, dias desperdiçados com alguém ou em algo que não mudará o curso de nada.

Eu pingo lentamente por sobre as folhas repletas de frases sem sentido algum, ainda pingo, ainda me perco, dia após dia, pingando lentamente, me perdendo e perdendo tempo, perdendo o que quer que seja que me faz ser quem sou.

Cada dia mais próxima do fim não sinto o peso da idade, não presto atenção o suficiente no reflexo no espelho ou nos detalhes, porque não gosto, não gosto de olhar para mim, me pergunto o que eu veria se olhasse com atenção, se me afastasse de mim mesma, primeiro, alguns passos, depois alguns metros, então um quilómetro. "E se eu corresse? Se me virar, enquanto finjo olhar para mim de longe e correr, serei outra pessoa? Ou serei somente eu correndo do meu próprio reflexo que ninguém mais vê?"

Não sinto o tempo passar, porque estou numa posição cômoda, estou confortável e aconchegada na mais fofa cama, com os mais conhecidos lençóis, o tempo corre sobre mim, o tempo corre tão rápido que para, não vejo ele se mover, não sinto enjoo apesar de estar deitada. "Como vou correr de mim mesma se ainda estou deitada?".

O silêncio mata, é ele que me mata, um veneno lento e doloroso que faz minha mente dobrar e mudar de forma, joga todas as minhas preocupações diante das minhas mãos incapazes e me obriga a cuidar delas. "Como? Como vou me mover se o silêncio cobre minha alma com um tecido grosso e pesado?" De onde estou não consigo respirar, não consigo me mover, e continuo perdendo tempo, a cada dia mais próxima de um fim comum e vazio, como minha mente, alguém pare o silêncio, alguém tire suas mãos esqueléticas e espinhentas da minha garganta porque preciso de ar, minha cabeça infla como um balão vermelho e minha realidade muda diante de meus olhos porque não tenho oxigênio e não vejo luz em lugar nenhum, escuto o barulho do tempo caindo em algum lugar e isso me deixa mais nervosa, posso ouvir minha vida passando, posso ouvi-la sussurrando no meu ouvido mas não consigo me mexer. "Como vou correr de mim mesma se não consigo me mexer?"

Eu fecho os olhos, ponho o dedo indicador na frente dos lábios e peço silêncio, exijo que minha mente se cale, ela é o pior de mim, faz minhas têmporas doerem, meu estômago revirar e borbulhar, meu coração entrar em taquicardia, meus olhos pesarem, ela para meus sentidos e me mostra o que eu não quero ver, todos os meu problemas, todos os meus problemas estão aqui por causa da minha mente, todos eles, pela minha mente, passeando e gritando, soprando em meus ouvidos e me tirando a energia, a vontade de estar presente, meus pensamentos me impedem de viver.

Cenas escritas no caféOnde histórias criam vida. Descubra agora