Briga de cílios

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Eu proponho uma briga de cílios, uma desculpa boba para chegar mais perto, sentir a respiração, a pele na pele, o calor. Nós dois fingimos que não temos segundas intenções e vamos adiante com a ideia, você se aproxima devagar, com calma, eu vou com pressa e bato minha bochecha na sua, você assustado se afasta rindo, eu retribuo com um riso nervoso e envergonhado. Somos só dois jovens bobos atraindo os olhares ansiosos dos indivíduos ali, eles criam expectativas, nós temos expectativas, o nervosismo é sentido do outro lado da praça, onde as crianças brincando no parquinho olham confusas para onde todos os outros olhos estão olhando, não notamos eles, não vemos mais nada, atrás de você tem só o seu brilho, atrás de mim você vê somente um tom de azul, claro como o céu. Nos aproximamos de novo, devagar, bem devagar, eu encosto a bochecha na sua, nossos olhos tão próximos que quase posso ver sua alma, quase, você a esconde muito bem. Já você consegue me ver por completo, sou transparente, nem precisa chegar tão perto para enxergar. Eu começo a piscar o olho rápido, você segue o movimento, silenciosamente torcemos para que ninguém ganhe, assim podemos nos manter colados, com a brincadeira como desculpa, por pelo menos uma tarde inteira. Então eu sopro sua orelha e você estremece. "escorregou" penso sorrindo. Pisco mais rápido ainda e machuco seu olho, me afasto rindo e batendo palmas, saudando a mim mesma por ter derrubado os grandes muros ao redor do seu coração por um segundo, você coça o olho e me encara, rindo de volta e se curvando como um servo. E para os espectadores ao redor você realmente é, mas somos jovens demais, nossa visão não é tão apurada ou sagaz, não vemos muito além do nosso próprio nariz, estamos sempre voltados para nós mesmos. Você não enxerga meu amor, eu não enxergo sua devoção, nós só hesitamos e estremecemos, trocamos piadas e olhares, ninguém confirma nada, ninguém tenta nada, ainda assim nossos dias seguem, ansiosos, coloridos, tensos e desejosos, vivemos despreocupadamente todos os dias, amando como só jovens sabem.

Cenas escritas no caféOnde histórias criam vida. Descubra agora