Capítulo 21

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POV SAMANTHA

– Tia Sam – ouço a voz doce de Becca sussurrar em meu ouvido. Ainda deitada olho para o lado e encaro seus grandes olhos chocolate. – Você gosta de garotas? – franzo o cenho.

O que devo dizer? Não sei se posso dizer isso a ela, não sei se Mon é aberta com esse assunto.

– Be-becca, e-eu – Meus olhos estão arregalados, nunca me senti tão nervosa ao conversar com uma criança como estou agora.
– Sim Becca, a tia Sam gosta de garotas assim como eu – Agradeço aos céus quando Jennie toma a frente. A mulher que está sentada no sofá ao lado de Lisa, com seus braços por trás da outra, sorri cúmplice em minha direção.
– Oh… – nada responde. Céus, será que ela não gostou? Será que cogitou que tenho algo com Mon e não tenha gostado disso?

Passou-se às horas, o silêncio ensurdecedor de Becca me assusta, mesmo que a criança esteja concentrada no desenho. Todos já estão reunidos novamente na sala.

– Graças a Deus! Achei que nunca iria acabar! – Jim levanta as mãos para o alto quando começa a passar os créditos no fim do filme.
– Não diga como se não tivesse ficado vidrada na tela também Jim – disse Rosé em um tom brincalhão.
– Óbvio! Não tinha nada a mais para assistir. Todos riram.

– Becca? – Ela olha para mim – está bem? Quer ir embora? – Com seus olhos chocolates fixados aos meus, concorda vagarosamente com a cabeça e sorri de canto.
– Está se sentindo mal? – Sussurro, Becca nada diz, apenas vira-se para a televisão e volta a olhar os créditos. Os créditos nem são tão interessantes assim, né? ou talvez ela goste.
– Becca? – chama Mon se levantando do sofá, vamos filha? Sua tia ficará aqui. – A criança faz um bico com os lábios porém se levanta cabisbaixa. O que ocorreu? Sua mudança de humor está assustando e preocupando. Me levanto rapidamente.

– Eu-eu levo vocês – passo as mãos pela minha blusa branca, agora levemente amarrotada. Amo usar roupas brancas.
– Não precisa Sam, eu- corto sua fala.
– Eu já estava indo – mentira – não se preocupe.
– Tudo bem então – ela sorri. E céus que sorriso maravilhoso.

Nos despedimos de todos. Antes mesmo de sair pela porta após Becca e Mon saírem primeiro, olho para Kirk que está logo atrás para fechar a porta.

– Boa noite viu, se cuide – lança uma piscadela e faço o mesmo. Saio porta a fora e antes mesmo dele fechá-la, diz – Cuide delas na estrada Samantha – dá um leve soco em meu ombro e fecha a porta antes que eu diga algo. Sem educação esse gay. Me viro e percebo que estou sobre o olhar das duas, sorrio. Como podem ser tão parecidas assim? Até o brilho dos olhos.
– Vamos? – desço o pequeno degrau da casa e ando atrás delas. Vou em direção ao carro. – Becca, não trouxe cadeirinha para você – faço um bico com os lábios ao abrir a porta traseira do carro.
– Tudo bem Sam, eu sento atrás com ela também, para não correr risco. – aceno com a cabeça e ambas entram no carro. Coloco o cinto na criança antes mesmo da mãe, que coloca seu cinto também.

[...]

Chego em casa e jogo meus sapatos na sala. Me deito no sofá de barriga para cima, me recordando de minutos atrás com Mon. Céus, que sensação maravilhosa é estar com ela. 

Tiro alguns minutos ali, pensando em tudo que está acontecendo rapidamente, com uma velocidade um pouco assustadora para mim, porém consigo me adaptar.

Me levanto e preparo algo para comer. Ligo meu notebook e o deixo em cima da mesa. 

Minha casa grande sempre foi assim, vazia e silenciosa, desde que me mudei após um ano da morte de minha mãe. Moro aqui há um ano, porém não fico muito em casa. Odeio a solidão. Deixo sempre a televisão ligada com um som suave, nada barulhento porém que me deixe confortável. 

Como e deixo meu prato na pia para lavar no outro dia. Volto para a copa e começo a estudar. Sempre deixo meu caderno na mesa por preguiça de subir e descer os degraus da escada sempre que vou estudar. 

Uma hora foi necessária para conseguir terminar o que deixei para estudar hoje. Minha cabeça estava a mil, preciso de descanso, sequer tomei banho. Fecho o notebook e subo a escada da casa, vou ao meu quarto tomar banho no banheiro.

Minutos depois eu já estava deitada em minha cama de casal quente, sentindo aquela solidão chata novamente, a mesma que me persegue sempre. Por isso estudo e trabalho tanto, ocupa a minha mente de pensar demais no que me falta e no que sinto saudade.

Saudade… 

A saudade que sinto de Matthew, meu irmão mais novo. 

Eu era nova, tinha meus oito anos, vivíamos juntos sempre, ninguém poderia nos separar… só a morte.

Matthew aos seis anos faleceu, vítima do câncer infantil. Ele não tinha muito tempo de vida, apenas três meses, porém eu não sabia, apenas meus pais e familiares. 

Lembro-me daquela quarta-feira à tarde, o último dia de vida de Matthew. Estávamos sentados no jardim já que ele já não conseguia ficar em pé. Passamos aquela tarde juntos e mal sabia eu que seria a última vez que estaria escutando sua risada já fraca. Seus cabelos já estavam crescendo já que o mesmo tinha parado o tratamento. Porém ainda ralos e claros.

E esse foi o último dia em que dei boa noite ao meu falecido irmão, Matthew.

Lágrimas desceram sobre minha bochecha e não ouso limpá-las, estou em casa, posso chorar o quanto quiser. 

Durmo em meio às lágrimas, completamente inconsciente, completamente triste, aos pedaços. 

Meus olhos começaram a pesar assim como meu corpo e lentamente foram fechando, até eu cair em um sono profundo em meio às lágrimas. 

[...]

Ando em passos rápidos até o hospital, pedindo licença às pessoas ao redor. Céus! está cheio hoje e ainda fiz a proeza de atrasar!

– Você está atrasada bonitona – avisou Tee olhando o relógio, encostada na bancada da recepção. Ao olhar para mim franze os olhos. – Está bem? Seus olhos estão um pouco vermelhos – Eu não iria dizer a verdade. Quando acordei ainda estava com o pensamento em meu irmão e acabei desabando novamente, não consegui evitar. 

– Está sim, apenas – corto minha fala e mudo o assunto – Meu pai chegou? – Minha amiga semicerrou os olhos, percebendo que estou mentindo, porém resolveu ignorar. Ela aponta para o teto indicando o andar de cima, onde fica a sala do mesmo. 

– Eu te substituo enquanto fala com ele, vai lá – Dá três leves tapas no meu ombro, pegando a planilha que estava em cima da bancada e saindo em seguida.

Vou em direção a sala do meu pai. Ao chegar, bato três vezes na porta e escuto o mais velho dizer um "entra". Abro a porta com um certo cuidado, entro e a fecho atrás de mim. 

Junto às minhas mãos e faço o cumprimento de costume a meu pai, que sorri da sua maneira doce. O mesmo sorriso de Matthew. 

– Desculpe o atraso Pai – Sento na cadeira à sua frente.

– Chegou atrasada hoje? Não sabia, cheguei e já entrei na sala, tenho alguns problemas para resolver. – Balança os papéis em sua mão. Me fazendo rir de sua careta. – Aconteceu algo com você e a moça? Seus olhos estão vermelhos – Tenho cara que chora por mulher? 

– Na-Não, não aconteceu nada, está tudo bem! – Ele estreita os olhos. Ah qualé, todo mundo deu de fazer isso pra mim hoje?.

Consegui despistá-lo mudando de assunto. 

– Como andam as coisas no hospital? O gerenciamento?. – Ele olha para o papéis em mãos e os coloca na mesa, verificando um por um.

– O gerenciamento estava uma bagunça, ontem demiti um gerente porque estava demais, apontaram para mim que ela era quem estava atrasando os pedidos das novas máquinas. Sequer sabia disso! – Rio da maneira exagerada que ele me diz.

Fiquei ali por mais alguns minutos até voltar para minha sala, tirando o peso nas costas de Tee, já que além de atender eu estava lotada de tarefas que a mesma estava fazendo no meu lugar. 

Dois Amores - MonsamOnde histórias criam vida. Descubra agora