Capítulo 4

31 6 0
                                    

Enquanto preparo o jantar, meu pai está ao telefone lá fora. Parece ser coisa de trabalho, mas estranho o fato de ligarem numa noite de sábado. Ele é gerente em uma das maiores companhias de seguros do estado, e vive viajando. Ou vivia.

Preparo um macarrão com queijo e fritada de filé mignon. Separo pequenas porções em dois pratos na bancada e abandono a panela no fogão.

— O cheiro está bom. — Comenta meu pai, entrando pela porta e guardando o celular no bolso.

— Está pronto. — Aviso.

Comemos em silêncio, mas seu olhar diz que ele quer conversar algo comigo. Algo importante, que não quer deixar para depois. Já faz dois anos, mas eu ainda o conheço. Sei quando ele tem algo preso na garganta e não aguenta mais guardar. Ele nunca foi bom em esconder as coisas.

Após terminar o meu prato, bebo água e levo o prato na pia. Ele ainda está comendo.

— Quer me dizer alguma coisa? — Indago.

Ele me encara, como se estivesse se perguntando como eu sei.

— Podemos conversar depois.

Dou de ombros e começo a lavar a louça que se acumulara na pia.

Estou na varanda, sentada em uma das cadeiras de palha quando meu pai se aproxima e se senta ao lado, fumando seu cigarro cujo cheiro é tão forte que me falta o ar.

— A noite está fresca. — Comenta ele.

— É, está.

— Saddie, preciso contar algo a você.

Olho para ele, que se inclina para frente e joga a bituca do cigarro fora.

— Diga.

— Eu... estou doente.

— Doente?

— É, doente.

— O que quer dizer?

— Talvez eu não venda a casa. Descobri a poucos dias, e ainda preciso fazer alguns exames.

— A mamãe sabe disso?

— Não contei a ela, ainda.

— O que você tem?

— Acharam algo aqui — apontou para a cabeça— um caroço, algo assim.

— Um... tumor?

Ele assente com a cabeça.

Ficamos alguns minutos em silêncio, enquanto fiquei absorvendo a notícia. Não sei como minha mãe vai reagir quando souber, mas imagino que seja choque pra ela.

— Quando você queria vender a casa, tinha algo por trás, não tinha? — Pergunto.

— Acho que estou ressentido com o divórcio, Saddie. Sua mãe e eu já tivemos muitos problemas e conseguimos contorná-los. Não imagina que ela fosse pedir o divórcio por uns... deslizes meus. — reflete.

— Está chamando suas traições de deslizes? Isso é sério?

— Eu sei que errei, querida. E sinto muito por ter feito sua mãe sofrer, mas eu também não estava bem... e acabou acontecendo. Sei que não é justificativa, mas estou sendo sincero.

— Pai, você... Eu não posso ignorar o caos que você causou. E se a mamãe não pedisse o divórcio, eu a odiaria.

Os olhos dele se arregalam.

— Sei que não tenho direito de pedir perdão, eu sei disso. Mas, tudo que peço é que não me condene como um todo. Não sou um todo ruim, Saddie. Eu errei, e muito feio, mas também tenho minhas qualidades, embora isso deixa de ser importante depois de tudo o que fiz.

Má CompanhiaOnde histórias criam vida. Descubra agora