Capítulo 14

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Passo a noite remoendo os momentos que não vivenciei com meu pai nos últimos dois anos, desde o divórcio. Não porque não queria, foi mais pela minha mãe, e ele também não insistiu. Sobretudo, ele devia estar com vergonha por tudo o que aconteceu. As traições, as mentiras, a ausência, tudo.

Já me peguei desejando que tudo voltasse ao normal, que meus pais estivessem juntos novamente, e que tudo o que aconteceu não passasse de um mal-entendido. Quanto mais o tempo se passava, mais eu tinha a certeza de que meus pais não seriam mais os mesmos, e eu também não seria. Foi complicado demais lidar com os dois, e mais complicado ainda os ver se acusando o tempo todo.

Por que é tão difícil ser adulto? E por que temos que ser um adulto um dia? Às vezes, tenho certeza de que ser adulto não era sinônimo de  saber tudo na vida, e que ainda erram muito mais do que nós, os adolescentes.

Farei dezessete anos em breve, mas com um misto de sentimentos confusos depois dos últimos acontecimentos. Planejei fazer uma festa e chamar meus amigos, mas já não tenho mais certeza se quero realmente isso. Não dá para fazer uma festa com meu pai no hospital, e toda a confusão que ainda está prestes a acontecer entre minha mãe e Madison.

Acabo adormecendo no ombro de Dylan. Acordo com sua cabeça encostada na minha, sentindo sua respiração tranquila e serena. Ele também acabou adormecendo. Eu o observo calmamente, e ele parece tão tranquilo e em paz. Diferente do cara nervoso que vi correndo para o mar no meio da noite. Já amanheceu e nem percebemos.

Eu me mexo bem devagar para não o acordar, mas ele desperta, olhando diretamente para mim, com o rosto próximo do meu. Ficamos um tempo se olhando, como se tudo ao nosso redor tivesse parado no tempo.

— Preciso... ir ao... banheiro... — Digo, com a voz falha e envergonhada.

— Está bem.

Engulo em seco. Ele, de alguma maneira, me afeta muito mais do que eu imaginava que me afetaria um dia.

Eu me olho no espelho, encarando meu próprio reflexo. Meus cabelos estão bagunçados e meu olhos inchados. Dylan me viu assim. Acho que nenhum garoto me viu desse jeito, nem mesmo meu pai. Não sei se estou surpresa, mas confesso que me sinto estranha, e até um pouco culpada.

Lavo meu rosto e me preparo para voltar ao quarto. Respiro fundo, tento relaxar, respiro novamente. Abro a porta e vejo Dylan olhando minha estante de livros, que nem toquei desde que cheguei.

— Seu gosto literário é curioso. — Comenta ele.

— Qual é o seu gosto?

— Não tenho um específico. Leio o que me dá vontade, desde ficção científica, didáticos... Acho que não tenho uma escolha exata, porque não leio tanto assim.

— Seu gosto literário também é curioso.

Ele se vira para mim, com uma expressão mais séria.

— Quero te conhecer melhor. Saddie. Mas sei que a situação atual não é... boa, e que você já tem muitas coisas com que se preocupar. Sendo assim, gostaria de pelo menos estar ao seu lado, se me permitir. Não quero deixá-la sozinha, nem agora, nem nunca.

— Dylan...

— Eu sei, ainda tem outro cara na parada, mas ele não está aqui. Eu já te disse e volto a dizer, não a forçarei a nada.

— Não é só isso. Só acho que você pode estar confundindo as coisas. Nós nos conhecemos há dois dias apenas, e não sei se...

— Não estou dizendo que estou apaixonado, Saddie. — Ele se aproxima e toca nas pontas dos meus dedos — Eu só não consigo parar de pensar em você, desde o primeiro momento em que a vi na praia. Não sei o que está acontecendo comigo também, meio que admito que estou confuso com meus sentimentos. Mas, uma coisa, eu sei, eu quero conhecer você melhor e descobrir isso.

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