Loira

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Ian
Era tudo bem estranho, mas eu até entendia. Meu corpo, antes de cair no meio da fazenda, parecia ter sido jogado dentro de um liquidificador. Eu me sentia uma pessoa renovada, mas havia falhas em minha mente, como se eu houvesse perdido partes da memória.
Vim de outra dimensão, a terra em que me situava era diferente, o clima era diferente, reafirmando: era tudo bem estranho. Só um rosto minha mente guardava, uma garota, uma loira, e eu sabia que devia encontrá-la.
Alex acordou-me cedinho, sua filha, Giovana, já esperava no campo para ensinar-me a cuidar das plantações. Minha roupa do dia que cair aqui, estava limpa e dobrada sobre uma cômoda. A coloquei e deixei a outra que usava no mesmo lugar da nova.
Nem cheguei a comer. A garota estava lá me olhando. Muito bonita. A pele era queimada e o cabelo bem preto e liso. Sorri para ela e ela baixou o rosto envergonhada.
- Bom dia - direcionei-me a ela
- Bom dia! Ali estão as mudas e aquela área ali é onde você irá plantar. Você só precisa fazer o que faço.
Assenti e fiz tudo o que ela fez. Senti o sol queimar minha pele e fiz de tudo para não pedir arrego. A garota riu de mim. Eu apenas a mirei.
- Que foi?
- Você está cansado, não é?!
- Sim, estou! Como sabe?
- Não preciso saber, eu também estou. Ali tem água e uns biscoitos.
- Ah, certo!
Fui até um caixote em que estavam postos a água e biscoitos, sentei na terra e Giovana fez o mesmo. Comeu em silêncio enquanto observava além da cerca, os carros passavam vagarosos. Todo o dia estava preguiçoso. Eu entendia.
- Hum... Essa garota...
- Não sei nada dela! - concluí - Por que o interesse?
- Eu poderia ajudá-lo a encontrá-la.
- Sério? Você faria isso?
- Mas meus pais nem meus irmãos podem saber.
- Certo. Quer algo em troca?
A menina riu.
- Muitas coisas você poderia me dar em troca.
- Tipo...?
Eu vi malícia em seus olhos e olhei para os quatro cantos antes de me voltar para ela. Eu como homem tinha minhas necessidades, puxei seu rosto e beijei sua boca. Ela ficou parada no o início, mas aos poucos senti sua língua ao encontro da minha.
Ela se retraiu e saiu correndo. Merda! O que eu havia feito de errado? Levantei-me e terminei de plantar o que ela havia deixado.
Quando foi a hora de almoço, sentei de frente para ela, sua cabeça estava baixa e ela sorria. Acho que não havia nada de errado. Esperei estarmos a sós novamente.
- Por que você saiu correndo?
- Eu ... desculpa. Mas nunca beijei ninguém antes.
- Ah.
Acabei rindo alto.
- Você acha isso engraçado?
- É que eu pensei que tinha feito algo errado.
Ela apenas sorriu. Fiquei a olhando, até ouvir a voz de Alex. Ele parecia assustador. Parou e olhou para nós dois. Depois para a plantação.
- Hum. Querem ir a cidade? Levarei um caixote de mudas de rosas em uma casa.
- Por mim, tudo bem. - respondi.
- Ficarei, papai! Tenho que ajudar minha mãe.
- Fique.
Ele assentiu para mim e eu o segui, entramos em sua caminhonete e PUF: tudo era novo para mim. E naquela estrada eu viajei como se estivesse em um sonho.

O lugar era pura névoa, quando levantei da cama que estava deitado, a menina do rosto conhecido me encarava e sorria.
- Não acredito que é mesmo você.
- E porquê não seria eu? - tentei saber.
- Você estava morto...
- Eu?
- Meu Deus, como pode... ? Venha ao meu encontro...
- Onde você está? - ela era tão linda.

Meu corpo quase voou de encontro a janela, Alex havia freado bruscamente interrompendo o sonho. Merda!
- Chegamos? - olhei para ele.
- Chegamos! Ajude-me.
- Você sabe dirigir? - perguntei.
- Cala a boca, moleque.

Ele não deveria saber dirigir. Junto com ele fui ajeitando as mudas e carreguei o caixote até a porta da casa. Alex tomou da minha mão e bateu à porta com mais força.
Afastei-me e esperei. Uma mulher saiu primeiro e sorriu, ela até me parecia familiar, logo após ela entrou e ele entrou em seguida. Um homem alto checou a rua e voltou para dentro.
Esperei mais ainda. Até que a porta abriu e lá vinha o brutamontes, entrou no carro e bateu a porta. "Trabalho concluído". Eu precisava me livrar dele.

Olhei pela janela, o casal parecia feliz, eles olharam para mim e paralisaram. Fiquei os encarando, foi então que Alex deu a partida no carro. Enquanto saíamos uma loira veio até a porta, seus olhos encontraram meu e eu senti meu corpo ferver. Não era qualquer rosto. Não era qualquer fervor. A garota que tinha todas as respostas para a minha existência estava ali.

Adestrando um demônioOnde histórias criam vida. Descubra agora