Vinte Nove

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     Existem alguns lugares que podemos comparar com selvas, justamente por causa das ameaças e das leis da natureza pré-existentes. Especialmente se eles tiverem um grande fluxo de pessoas ou animais, como preferir chamar. Metade do tempo, eles se esforçam para provar que fazem parte de uma segunda espécie mesmo.

Faculdade.

Ao entrar em uma, não se sabe exatamente em qual posição se está, pois tudo é uma novidade. Com sorte, passará despercebido até se graduar. Quando entrei na aula de Introdução à Literatura, estava bastante perdida em relação às salas, horários etc. E ao conhecer Mirella, juntamos nossas dúvidas, deixando de ser apenas uma garota perdida para sermos duas garotas completamente perdidas, mas com um interesse em comum: nos formar. Mesmo sendo apenas uma coisa em comum, foi ela quem nos fez chegar até aqui.

O dia do seu casamento.

Jamais imaginaria estar participando de um momento tão especial na vida dela. Mirella foi minha parceira vitalícia em todos os trabalhos, mas agora eu estava me arrumando para assistir à assinatura de um contrato vitalício, onde ela se uniria ao homem da sua vida. Eu estava muito feliz por minha colega, amiga e irmã.

- Tem alguém te esperando. - Meu avô passou pela porta do meu quarto, mas acredito que, ao me ver, algo em seu olhar o desencorajou a continuar falando. Ele me avaliou por completo. Apesar de já ter visto o vestido, imagino que me ver usando-o causou algo diferente nele. Tinha pedido uma maquiagem leve, pois o casamento seria ao pôr do sol. Meu cabelo havia sido alisado propositalmente, pois não era do meu feitio ir sempre ao salão. Como era uma ocasião especial, optei por usufruir de tudo o que poderia ter direito.

O vestido eu encontrei na terceira loja que procurei, uma recomendação da vendedora: simples e elegante, como eu havia pedido. Um vestido longo com apenas uma alça lateral, sem fendas ou detalhes no tecido. Os acessórios vieram da minha prima.

Ainda estávamos em uma fase estranha, que havia começado há alguns dias, mas como ela não parecia disposta a se abrir, eu não me esforcei para mudar a situação. De vez em quando isso acontece. Pessoas se cansam ou vivem novos ciclos. Eu só não esperava que isso acontecesse conosco. Infelizmente, a política de respeitar o espaço dos outros era algo muito forte em mim. Então, apenas agradeci quando ela me deu os adereços e voltei para casa.

- Está parecendo uma mulher. - Murmurou meu avô, pensativo. Os mesmos olhos orgulhosos se refletiam nos meus. Sim, eu me tornara uma adulta, mas isso foi resultado das incontáveis vezes que ele insistiu em me amar e cuidar.

- Obrigada. - Abri os braços para acolher sua emoção, mas fui consolada igualmente, pois também estava emocionada. Estar deslumbrante, usando um vestido novo, uma maquiagem especial e saltos novos, deveria ser motivo para algo se entristecer dentro de mim. Eu gostaria que meus pais pudessem me ver. Não que meu avô não fosse suficiente, na verdade, eu tive que aprender que, além de suficiente, ele seria o único.

Antes, eu sofria com meus pensamentos destrutivos, mas agora me sinto leve, como se estivesse voando ao me desprender de todo o peso que a mágoa causava. Gradualmente, dentro do meu novo processo, onde eu almejava como resultado ser feliz, comecei pelo meu avô.

Havia dentro de mim certa raiva por meu avô nunca ter ido atrás do filho, mesmo que fosse apenas para discutir. A decisão de eu ter ficado sob sua guarda parecia ter sido simples. Em minha mente, o fato de vovô nunca ter se pronunciado sobre isso foi como se ele tivesse aceitado tudo com tranquilidade, enquanto eu suprimia uma enxurrada de revolta, com questões que ninguém poderia responder.

Agora, acredito fielmente que existe um propósito até nas coisas mais banais. O que quero dizer é que, sem a criação do meu avô, eu não teria encontrado a verdadeira salvação. Nenhum dos meus pais sequer desejou conhecer o Deus a quem sirvo. E acreditar que minha vida está dentro das vontades que Ele permitiu me trouxe conforto. Como se a enxurrada de questões se transformasse em uma nascente seca. Tinha conhecimento agora, que se não a alimentasse, ela jamais poderia me causar nenhuma emoção ruim novamente.

Agora, nada mais importa, além de mim e meu avô.

- O senhor também parece um homem.

Senti seu peito estufar em uma risada.

- Eu a criei muito bem. - Resmungou, se distanciando para me analisar com mais detalhes, vendo minha versão "descente" para uma festa de ricos. - De todos os meus filhos, você é a única da qual tenho orgulho. Seu pai sumiu, e seu tio Amós... tem horas que eu desejo que ele pegue uma carona com seu pai para bem longe. - Ri.

- Então, nunca desejou que eu também sumisse, vovô?

- Todos os dias, minha menina. - Rimos. - Não sabe o quanto é difícil lidar com alguém tão chata. Mas, se eu não a visse mais, meu propósito teria acabado. Meus filhos já estão criados, e minha esposa... ela me espera. Ter você como filha foi o motivo pelo qual continuei. Eu sei que, se não fosse por mim, você não teria muitas oportunidades. Mas, se eu não a tivesse em minha vida, eu não teria motivos para estar aqui.

- Eu amo você, vovô. - Voltei a abraçá-lo, me sentindo inexplicavelmente acolhida.

- Eu também te amo, minha menininha. - Suspirou. - Agora, uma mulher. - Rimos. - Está pronta? Tem alguém te esperando lá fora. Eu vim aqui para dizer isso, mas não consegui concluir. - Me desvencilhei dos braços dele, sentindo a leve ansiedade por Pedro estar a alguns passos de mim. - Gosto desse menino, sabe. - Murmurou baixo, avaliando meu quarto. Fui em direção à minha bolsa de mão, que por enquanto estava vazia, mas eu pretendia voltar com alguns docinhos.

- Quem não gosta, vovô? - Respondi, passando as mãos pela saia do vestido para alinhar o tecido. Suspirei, retirei meu celular do carregador e fui em direção à sala.

Pedro estava mexendo no celular quando entrei, mas acredito que, ao sentir minha presença, ele preferiu guardá-lo. Acho que foi uma decisão sábia, pois eu estava um...

- Uau. - Acho que posso aceitar essas três letras. Esperava algo mais elaborado, como uma palavra, mas isso descreve bem como estou hoje. Claro, eu esperava uma reação dele. Meu avô não poderia ser o único homem a me elogiar hoje. Ao conferir a gravata dele, percebi que os tons estavam diferentes, mas não foi preciso chamar seu José. Ele já estava trazendo uma gravata semelhante à cor do vestido, sem ao menos saber que Pedro havia combinado comigo e estávamos na mesma paleta.

O terno de Pedro era de um azul marinho lindíssimo, com uma camiseta branca por baixo, e os sapatos pareciam ter acabado de engraxar.

- Uau. - Eu devolve, quando meu avô fez menção de ajudá-lo com a gravata. - Tomou banho hoje? Até parece gel no seu cabelo. Se admitir que está usando perfume, vou me sentir especial. - O sorriso inexplicavelmente bonito de Pedro me deu borboletas (ou vermes) no estômago.

Deveria ser a segunda opção, mas então eu estaria mentindo.

- Pode se sentir, porque também cortei o cabelo e fiz a barba. - Sorri, achando graça. Meu avô nos observava silenciosamente, com um sorriso pretensioso. Pedro não tirava os olhos de mim, parecendo embasbacado. Então, tomei uma atitude antes que minhas bochechas ficassem rosadas, e eu não pudesse culpar o blush da maquiagem.

- Vamos?

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Os maiores aí.

Os maiores aí

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Corações em Conflito: Romance CristãoOnde histórias criam vida. Descubra agora