Vinte Cinco

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Maya Leal

     Eu não sou difícil de ler para aqueles que enxergam com o coração. Aqueles que veem com olhos turvos jamais compreenderão a profundidade do que busco.

Cresci em uma família pequena e rígida, em um ambiente tóxico. Sentia-me constantemente castrada e ofuscada por aqueles que deveriam me apoiar para que eu pudesse brilhar por mim mesma. A luz que me era permitida era apenas um reflexo daquilo que os outros esperavam de mim. Um diamante incolor e opaco, que cresceu solitário e inconstante. Ninguém pode dizer que eu não tentei me encaixar, mas era impossível. Entreguei as rédeas quando percebi que não sabia como lidar nem como conduzir as coisas por aqui. O meu voo não era tão natural quanto eu gostaria.

Eu não era como Roberta. Forte, livre, independente.

O sentimento de não pertencimento pulsava diariamente, cada vez mais intenso. Ansiava encontrar um lugar para pousar e descansar. O cansaço das inúmeras tentativas falhas me colocou em um estado de letargia, onde eu apenas via a vida passar diante de meus olhos de forma atemporal, sem sonhos ou desejos a alcançar. Sabia que não me encaixaria, então, para onde eu iria? Foi assim que compreendi que, se você não se encaixa, talvez seja porque nasceu para construir um novo caminho, algo que somente você é capaz de realizar com a sua forma natural de ser.

Isso tem me dado forças para continuar em meio às tempestades de desconfiança. No instante em que você desiste de tentar ser igual a todos, é o momento em que aprende uma lição importante.

Eu ainda estava dentro de uma gaiola metafórica. E foi exatamente assim que aconteceu:

Eu criei você.

Nos meus sonhos, eu te inventei. Te imaginei com todas as qualidades que desejo encontrar em alguém. Te idealizei para não me sentir sozinha, para me sentir protegida. Eu criei você para me amar e construir uma família comigo. Te projetei para ser meu conto de fadas, para vivermos juntos o antes e o depois do "felizes para sempre".

— Eu amo a sua prima. — A frase de Pedro me atingiu como um soco. Meu coração palpitava forte, mas o restante do meu corpo permanecia em um estado de congelamento.

Roberta? Como isso era possível? Ela sabia dos meus sentimentos. Então, o que significava aquilo? Um turbilhão de pensamentos me acometeu. Em minha ausência, seria possível que algo tivesse acontecido entre ambos, do qual eu não soubera? Como poderia existir tamanho sentimento, sem que Roberta tivesse qualquer consciência disso?

— Ela não sabe. — Pedro respondeu minha pergunta, ainda me encarando como um pássaro com a asa quebrada, merecendo sua ajuda e pena. — Não ainda, pelo menos. — A indignação corria dentro de mim, mas o choque era tão grande, que eu continuava ouvindo, sem saber o que fazer ou falar. Como Roberta poderia não saber? Ela, apesar de tudo, não era indiferente ao sexo masculino.

Eu poderia até absorver um "fora", por mais difícil que fosse, mas jamais poderia permitir tamanha traição de alguém que eu via como irmã.

— Como? — Minha voz tremia, e Pedro demonstrava desconforto. Era óbvio que essa conversa era penosa, mas eu não podia sair sem suas respostas. — Como isso aconteceu, Pedro? — Ele desviou os olhos e coçou a nuca, mostrando vergonha.

Apertei os olhos, me esforçando para permanecer racional. Me irritar ou chorar não ajudaria. Já me sentia humilhada e enganada o suficiente.

— Apesar de todos acharem, Maya, eu não conhece sua prima aqui. — Pedro olhou para um ponto distante, mas o brilho nos seus olhos me entregava algo. Ele estava sendo sincero, embora o desconforto fosse visível. — Isso aconteceu bem antes de nos dois conhecermos, entende?- Se referiu a nós.-  Não vou entrar em detalhes sobre como aconteceu, mas desde o exato momento em que conheci a Roberta...— Pedro me encarou, suspirando de forma cansada ou até sentimental. —Primeiro, conheci seu lado genioso, mas contundente, que me repeliria como se eu fosse uma das pragas do Egito.— Ele sorriu, o sorriso fraco, mas genuíno. À medida que ia descrevendo, o sorriso se abria mais, e eu podia perceber a sinceridade em suas palavras, nos seus olhos, talvez até no seu coração. Percebi que Pedro me chamara para aquele momento com um motivo claro.

Corações em Conflito: Romance CristãoOnde histórias criam vida. Descubra agora