Capítulo 21 - Khaos

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As vantagens de ter sido abençoado por algum deus eram grandes, comi maior tempo de vida, imunidade quase que perfeita, sentidos apurados, os poderes claro, mas tinha uma coisa que se intensificava ainda mais, os sentimentos.
Se eram bons, a sensação boa crescente no peito era tão fervorosa que ninguém queria parar de sentir, mas se fossem ruins a dor era tamanha que podia desejar a morte.

Eu cogitei a morte.

A comoção foi crescente. Vi Amália passar correndo junta de outras três mulheres, empregadas do castelo, e só aquela cena foi suficiente para algo ruim começar a crescer no meu peito.
Não sabia o que estava acontecendo e por mais que parecesse de uma enorme urgência tinha medo de descobrir

Krissy entrou ofegante na minha sala, sem rodeios. Um calor absurdo tinha visto com ela, fruto de seu poder mas o seu desespero que era nítido só pelo olhar.

— Vossa majestade, aconteceu algo com a senhorita Melinoe, o coração dela...

Não escutava mais o que ela falava, como se um vácuo tivesse sido colocado em volta de mim e nada mais era audível a não ser o barulho dos meus sapatos batendo forte no chão conforme eu corria pelos corredores. Não podia ser.

A porta do quarto dela estava aberta, empregadas saiam rápido de lá olhando para o chão, como se não me percebessem ali.
De todos os horrores, os pesadelos vividos que eu tinha com a morte, nada tinha sido tão pior do que aquilo.

Melinoe estava deitadq na cama, extremamente pálida e doentiu. Tinha sangue no seu rosto que eu não sabia de onde vinha.
Amália falava e falava enquanto movimentava as mãos pelo corpo da princesa, a minha princesa.

Tudo estava girando, nada fazia barulho, nada fazia sentido.
Minhas pernas fraquejaram mas não me permiti ceder ali, eu precisava fazer alguma coisa.

O meu primeiro passo foi interrompendo por um estalo forte, o que me despertou do devaneio do resto do mundo. A queimação na minha bochecha foi instantânea me fazendo focar na figura da minha irmã, parada na minha frente, não a tinha notado ali até agora, agora notava tudo.

— É culpa sua seu bastardo maldito!

Sua voz estridente me fez perceber que ela chorava, não só ela como Amália também tinha lágrimas na bochecha.

— Amália, o que aconteceu? – Me aproximei da cama logo sendo empurrado por Celine.

— Fica longe. – Celine gritou mais uma vez.

A ignorei colocando sua forma para o lado me ajoelhando ao lado da cama vendo como Melinoe poderia ser confudida com um cadáver.

— Seu coração parou. Ela teve uma convulsão antes disso. Ele está batendo fraco agora.

— Mas você consegue fazer ela melhorar né?

— Khaos...Meu poder está sendo anulado pelo quarto.

— Então mudamos de quarto!

— Não é só isso. Vem acontecendo aos poucos. A toxina no corpo dela está anulando os meus poderes, e está matando ela. Um abençoado sem sua benção está morto, é a primeira página de todo livro dos deuses que nós concederam essa benção. – Apertei a mão gelada demais de Melinoe sentindo a bile subir pela minha garganta. — Não tenho como salva-la.

Meu mundo estava prestes a ruir, por que meu mundo era ela.
Várias coisas passavam pela minha cabeça naquele momento, e em todos alguma voz estava me culpando, e eu era culpado.

— Leve ela pro quarto mais longe que tiver deste. As coisas dela também. – Ordenei pra quem pudesse escutar, e alguém escutou pois entraram no quarto recolhendo os pertences de Melinoe. — Todas as jóias com pedras da rosa jogue fora imediatamente.

Tentava controlar a respiração e o tom de voz mas era inútil, queria gritar com todos, culpar alguém que não fosse eu pelo meu próprio erro.

Em poucas ocasiões, ou quase nunca, eu me permitia chorar. Chorar não iriam fazer as vozes pararem, chorar não iria resolver meus problemas no reino, nem curar a Melinoe, por isso engoli o choro andando de volta para meu escritório.
A movimentação parecia mais agitada agora no castelo, os empregados sussurravam o que se misturava com as vozes dos espíritos e minha cabeça quase explodia de dor. Tudo estava indo para um caminho errado.

As grandes portas de madeira não bateram com força pois alguém impediu, mas não queria alguém ali, não para verem a bagunça que eu estava, que eu era.

— Quero ficar sozinho. Deve ter algum trabalho para fazer.

— Acho que temos algo mais importante que o trabalho.

Eu conhecia aquela voz e por mais que eu negasse um conforto pequeno se instalava em mim.

— Felip, não sabia que estava no castelo.

— Que bom que eu estou, não acha?

Não respondi. Apenas me sentei em uma das poltronas e ele fez o mesmo na minha frente.

Melinoe estava ali a pouco tempo atrás, ela sorria e nós conversamos sem que ela me mandasse morrer ou coisa assim.

O silêncio continuou por mais algum tempo, Felip não falava nada mas eu sabia o que ele estava pensando. Você é o culpado, você tem que fazer algo, deixa-a livre.

Não ergui o olhar quando a porta foi aberta novamente, já imaginava quem estaria entrando ali.

— Ela está instável. – Amália disse se sentando no braço da poltrona de Felip. — Ajudou bastante trocar ela de quarto, mas o que mais preocupa é a toxina.

— Não tem como remover ela do corpo?

— É arriscado demais, ela pode perder muito sangue e como está fraca não sei se ela vai aguentar.

Nunca pensei que palavras fossem me machucar tanto quanto uma facada, como se uma lâmina cega fosse enfiada no meu coração.

— Você a ama, não do jeito convencional eu acho. – Amália voltou a falar e silenciosamente segurou a mão de Felip entrelaçando seus dedos. — Se você a ama tem que a deixar ir Khaos.

— Não.

— Khaos olha o que está acontecendo, isso está saindo como você queria? – Felip me confrontou, fazendo um frio subir pela espinha.

— Não mas...

— Acha que vai conseguir perde-la? Ou se ela acordar vai continuar a envenenando?

— Por favor. Eu sei que eu sou culpado. – Suspirei querendo acabar com a conversa.

Eles eram os únicos que conseguiam me fazer sentir assim. E Celine. Mas ela parecia que me odiava por inteiro agora e com razão, pelo que fiz com ela, e pelo que fiz com a Melinoe.
Elas tinham se tornado amigas. Na verdade Melinoe parecia ter conquistado um pouquinho de todos, que gostavam dela e conversavam com ela, sorriam sem falsidade, ela era fácil de gostar, fácil de se apaixonar.

— Se sabe disso filho...espero que também saiba qual a melhor decisão.

Depois de tempo consegui erguer meu olhar para eles. Felip estava sério e Amália ainda tinha as bochechas coradas pelo choro recente e não escondia. Os dois olhavam direto para mim com compreenssão, mas também com um tom de alerta.

— Felip, dê a ordem em meu nome, destrua as paredes do quarto antigo da Melinoe. – Ele suspirou concordando. — Eu vou ficar com a Melinoe.

E não podia sair do seu lado pois não sabia se ela voltaria para o meu.


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