Crônicas dos Mundos (Livro 2) - Domínios do Leão

Capítulo 26 - O culto dos deuses

Alice e Norami só conseguiam olhar para o alto, observando as ultimas partículas de areia caírem onde antes eles haviam caído. Um pequeno monte ia se formando, e o raio de luz que entrava iluminava muito pouco. A garota gato tentou saltar usando sua pata, mas, sentia algo família, algo diminui sua força dentro daquelas paredes. De certo, o seu raciocínio funcionava bem, e ela sabia que tinha algo semelhante a um inibidor, algo selando seus poderes de alma, ou os resquícios que ela tinha do que uma vez foi seu poder. Um pensamento indevido e rápido passa, imaginando que sua perna e braço de gato cairiam se o inibidor fosse mais forte, porém, na verdade, não sentiu muita diferença, o máximo foram alguns arrepios e uma sensação desconfortável. Norami permaneceu calado, estava assustado, tudo aquilo aconteceu por culpa dele. Alice, percebendo isso, logo se aproximou do menino que olhava ao redor forçando a vista para tentar entender as escritas nas paredes. 

-Tudo bem, Norami? - Alice pergunta, colocando a mão no ombro dele. Norami deu um pequeno pulo de susto, mas logo se recompôs.

-Ah, sim... - Norami continua olhando ao redor. - Essas imagens, são mais semelhantes que as outras da parte de cima dessas ruinas. 

-O que? - Alice inclina a cabeça, olhando nos olhos do rapaz, que desvia pois a garota colocou a cabeça a sua frente, e ele estava completamente focado naquilo, demorou para ouvir, fazendo Alice repetir de novo. - Como assim, Norami? 

-São animais mais comuns, é como se os animais acima de nós tivesses sido colocados para assustar, e esses aqui para louvar, eu não consigo entender direito mas isso que me remeteu. 

Os dois olham ao redor, e, usando do mesmo esforço que o garoto Norami, Alice consegue ver as figuras, e dessa vez identificou, mas, conforme ia percebendo os animais, sentia um calafrio na coluna, passando por todo seu corpo. Era uma revelação, mas, ao mesmo tempo uma descoberta antiga, uma coisa que ela ja tinha visto: uma coruja, polvo, dragão e por final, como uma tabua rachada, um leão. 

-Netzach... - Alice sussurra. 

-Alice, tem mais! - Norami vira a mulher para o outro lado da sala, e outras figuras, também conhecidas surgem: uma guerreira, um anjo, uma mulher com seios de fora, assim como uma mulher com as mãos tapando-os. 

-É como na igreja de Albert... - Alice disse essas palavras, Norami olhou para ela. 

-Você já viu essas figuras antes? - Alice respira fundo. 

Ela percebeu o que tinha falado para ele, para o garoto Norami. Não era exatamente a revelação que queria fazer para ele nesse momento, mas, algo ligava o culto dos deuses primordiais com esse mundo também. A primeira hipótese que surge em sua mente era de que, por algum motivo, esses eram os deuses que criaram o sistema dos mundos, mas Alice não sabia ao certo. Norami a faz a mesma pergunta, ela fecha a boca, e respira fundo. Não queria responde-lo, não queria trazer aquele conhecimento para esse mundo. Não queria fazer o pequeno Norami, de apenas quinze anos, conhecer o fardo que ela carregava, não queria faze-lo ter o mesmo conhecimento de que todo o mundo, todos os mundos, correm perigos maiores do que Netzach. 

-Não. - A palavra saiu seca, mas falhada. Saiu dura, e amarga. Era uma mentira. Norami percebeu isso. 

-Pode me contar, Alice. - Ela respira fundo de novo, e desvia o olhar. - Confie em mim.

Aquelas palavras eram como espinhos dolorosos, era o que ela queria ouvir, queria confiar em alguém, em qualquer pessoa, mas estava incapacitada disso. Todos em quem ela um dia confiou nesse momento estavam mortos, e ela só conseguia ver aquelas pessoas quando olhava para Norami. Era como se elas olhassem de volta para ela, a cada pensamento de querer dividir esse fardo com o garoto, ou pelo menos dividir essa experiência, cada um desses pensamentos a faz pensar que aqueles que ela amou repudiariam isso. Alice estaria tragando Norami para aquele problema, e ele ja tinha seus próprios, Miquilandir já tinha seus próprios problemas, não cabia a garota complicar ainda mais tudo nesse mundo.