Capítulo 8

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O sol já estava alto quando Louise se espreguiçou na cozinha. Faziam semanas desde a última vez que conseguira uma boa noite de sono sem qualquer medicamento. Ela esticou o pescoço e alongou a coluna. Não tinha roupas, então vestia apenas um vestido lilás reto que usara sob seu casaco na noite anterior.

A cozinha estava bem iluminada por grandes janelas de vidro. A bancada em forma de ilha no centro do cômodo estava vazia e tão limpa que ela usou os dedos para verificar o que seus olhos viam. Mas não havia nada comestível à vista. Ela suspirou e parou pensativa. Estava faminta e com uma ligeira dor de cabeça. Com curiosidade e fome, ela começou a abrir as gavetas. Estava prestes a chegar na geladeira quando um barulho a assustou, e ela se virou na defensiva.

-Deus! -Exclamou ela.

Mas claramente não era o Todo-Poderoso; era uma mulher alta de pele bronzeada e cabelos longos. Tinha olhos verdes e o corpo coberto apenas por uma camisa longa cinza que Louise já tinha visto antes em outra pessoa. A mulher piscou, bocejou e então sorriu antes de ir na direção da geladeira, passando por Louise como se fosse a dona da casa.

-Você deve ser a nova assistente! - Comentou ela com uma voz sonolenta. - Max deve estar vindo, então, se quiser, já ir preparando a mesa. Posso te ajudar a escolher exatamente o que ele gosta!

Louise sorriu sem querer, uma clara demonstração de territorialidade feminina. Louise quase perguntou se ela iria fazer xixi no canto da casa também, mas por fim apenas engoliu todas as respostas ácidas que pensou.

-Acho que se enganou, não sou a nova assistente! - Respondeu educadamente.

A mulher se virou para ela com rapidez impressionante e a analisou descaradamente.

-Oh! Desculpe! É que as assistentes costumavam aparecer nesse horário! - Informou ela com um sorriso nada amistoso.

Louise revirou os olhos. Não estava com paciência para lidar com o caso amoroso de Max e também não tinha a menor intenção de saber sobre sua vida pessoal. Então tentou uma nova abordagem.

-Sou a médica dele! Estou aqui por causa do sério problema que ele adquiriu na pélvis. -Contou ela com seriedade.

Os olhos da mulher se arregalaram como dois arcos.

-Ele está com algum problema?... Na pélvis? Mas eu não vi...

-Ah! Eu achei que ele tivesse contado já que pode ser contagioso.

-O que pode ser contagioso, Louise? -Perguntou Max, entrando no cômodo a passos largos.

Louise se calou e levou os dedos à boca, tentando não gargalhar. A mulher agora parecia assustada e curiosa. Max passou por ela e foi até a mulher, fazendo um leve afago em seu ombro e suspirou.

-Jessica, sei que tem coisas para fazer. Ficaria feliz em pedir ao Davi para te levar para casa!

- Mas, Max, esta mulher disse que é sua médica e que...

-Por favor, Jessi. - Interrompeu ele impaciente. Louise quase ficou com pena da mulher. Quase. - Esta aqui é minha prima. - Informou. -Ela tem problemas sérios. Não deve levar o que ela diz em consideração. Agora, se puder se arrumar, eu terei que sair em breve para trabalhar você sabe!

Louise se virou na direção de Max com uma careta. Ela mereceu aquilo, mas, mesmo assim, ficou irritada. Ela observou Max despachar Jessica sem nenhuma afeição ou carinho; ele era aquele tipo de homem. Mesmo assim, ela não reclamou ou fez escândalos, apenas fez o que ele mandou, o beijou fervorosamente e saiu como se aquele tipo de relacionamento fosse normal.

-Sério, Louise? - Perguntou Max irritado. Se fosse outra mulher, isso poderia render várias colunas de fofocas, sabia?

Louise deu de ombros, não que ela se importasse, pois naquele momento ela estava tentando lidar com a visão de Max parado, sem camisa, a sua frente na cozinha. Ele estava forte, com músculos definidos e entradas em seu abdômen. Louise pigarreou quando encontrou uma tatuagem maori no seu lado esquerdo. Ela não deveria ficar tão impressionada; afinal, não era o primeiro corpo humano que ela via, muito menos um corpo masculino.

Ela ergueu os olhos, ignorando-o, e encontrou um sorriso largo em sua face. Pegar-se admirando-o fez com que ela recuasse um passo. Aquele não era o momento para ter fascínio por um homem, muito menos aquele homem que ela nunca gostou.

-Você pode continuar olhando se quiser, pode fotografar também! - Disse ele antes de se virar e abrir a geladeira. -Eu deveria ter imaginado que você acordaria e procuraria a cozinha. Só não imaginei que iria me difamar tão descaradamente!

-Se quer saber, você mereceu! -Respondeu ela, se recostando na bancada.

-Ah, claro! Eu sempre mereci ser chantageado, difamado e azucrinado por você desde que você era uma coisinha rechonchuda que engatinhava e chorava descontroladamente.

Ela sorriu.

-Não acha que está exagerando?

-Não! - Respondeu ele, colocando queijo, presunto, manteiga e alguns pratos na bancada. -Mas vamos esquecer isso e focar na sua situação. Temos que pegar suas coisas, não quero que você seja confundida com minhas assistentes novamente.

-Você ouviu toda a conversa? - Perguntou ela surpresa.

Ele se virou para ela com rapidez.

-Louise, não sou louco o suficiente para deixar você interagir com a Jessica sozinha, e eu tinha razão!

Louise fez uma careta e cruzou os braços.

-Você me disse para ficar aqui, lembra?

-Sim! Porque aqui temos homens nas entradas, segurança de ponta e ninguém conhece esse endereço além de Jessica e um amigo. Por isso, resolvi tirar alguns dias de férias em casa.

Louise o encarou com uma expressão surpresa e confusa. Ele acabou de dizer que ficaria naquela casa com ela? Algo se movimentou em seu estômago, fome ou talvez a bebida que ingeriu na noite. Max retirou vários tipos de alimentos da geladeira e, por último, um pote de geleia. Após arrumar a mesa detalhadamente, ele se virou para Louise, que o encarava espantada e inquieta.

-Você não vem comer? - Perguntou apontando para um pacote de torradas.

Louise ajeitou os ombros e se deu uma sacudida mental. Precisava dar um fim naquela repentina inquietação. Ela assentiu e foi até ele até um som ecoar pela casa como o sino de uma igreja. Louise arregalou os olhos e se virou para Max, que estava como ela.

-Você está esperando alguém? Você não disse que ninguém sabia deste endereço?"- Perguntou Louise com um fio de voz.

-Ninguém viria aqui! – Informou ele. – Não sem me avisar e não sem um convite!

Max enrijeceu e contornou a bancada; a porta de entrada ficava depois do corredor à frente dele.

-Você tem uma arma? Perguntou.

Louise arregalou os olhos.

-O quê? Por que eu iria carregar uma arma?

Ele se virou para ela com uma expressão severa.

-Você é a droga de uma perita, está sofrendo ameaças de morte e está sob proteção e não carrega uma arma!?

Louise ergueu as mãos e assentiu. Ela não precisava de uma arma; ela era médica, seu trabalho não era ferir, era encontrar criminosos, era tratar e salvar pessoas de enfermidades. O pensamento ruiu em sua mente; ela não estava fazendo nada direito. Duas pessoas tinham morrido, e ela não fora capaz de fazer nada. Os culpados estavam soltos, e ela era a única que estava verdadeiramente em perigo. O som ecoou novamente pela casa, e Max se movimentou para ir até a porta. Louise não soube como reagiu tão depressa; antes que percebesse, ela estava segurando Max com os braços, suas mãos trêmulas contornaram sua cintura, fazendo-o ficar assustado e sem reação. Em sua mente, ela o viu cair e sangrar; em sua mente, ela o viu morrer por um ferimento de bala sem conseguir fazer nada, e aquilo era assustador. 

Uma noite de InvernoOnde histórias criam vida. Descubra agora