Recolhi suas roupas secas do varal, senti o cheiro suave do amaciante e as segurei firme contra o peito, como eu costumo fazer. As coloquei na secadora, só para garantir que sairiam secas, passadas e aquecidas. Dobrei uma por uma e as deixei descansando na cadeira de meu quarto, pensando em quantas vezes mais teria de entregá-las para que você as levasse embora outra vez. O quão distante é o sonho de ter você aqui pra sempre.
Dormi do seu lado da cama, imaginando que você estivesse ali. Que o travesseiro do qual eu abraçava formava as suas costas e que meu nariz estaria repousando em sua nuca, sentindo o agradável perfume que você exala até que eu caísse no sono. E acordar procurando por algo, esperando algo que não estava ali, não poderia estar.
E voltar a dormir novamente com a esperança de te encontrar nos meus sonhos, mas até mesmo neles eu não te vejo mais.
A última vez que sonhei com você, você estava indo embora. Você voltava para ela e eu voltava para essa casa vazia, cheia de fantasmas de nós dois.
E acordei sobressaltada, com medo de ser verdade. Mas lá no fundo algo me dizia, já é hora de se despedir.
Eu guardei os seus presentes na casa de minha mãe, escondi as nossas fotos e tentei levar meus pensamentos para longe. Vi amigos que há tempos não ouvia a voz, falei com uma parte da família que há muito não via, ouvi a voz do meu coração e ela disse que era chegada a hora.
Lembrei dos sorrisos dos quais você me tirou, das lembranças boas e de quando eu não sabia de nada, não temia nada, de quando te amar era planar entre as nuvens e caminhar pelas colinas, estar naquele meio de céu que tanto nos conheceu e nos ensinou. Lembrei do "eu te amo" que te disse e do "eu te amo mais" que você me retribuiu, mas nunca foi verdade.
Não existe nada que mensure o quanto eu amo você. E o quanto ser machucada por você me dói.
Eu gostaria que você pudesse ter entendido isso. Que suas ações, embora destrutivas, não me machucaram pelo poder de dano que tinham, mas sim porque vieram de você. E porque eu te amava, e acreditei que você poderia me curar, curar o meu coração, me ensinar sobre um amor que não dói.
Mas você fez o que todos os outros fizeram, e agora eu preciso me curar de novo. Ajuntar o que sobrou pra poder restaurar aquele enorme coração que você um dia conheceu, o coração que é capaz de acender uma cidade inteira, de amar sem esperar nada em troca, simplesmente pelo prazer que há.
Olhei em volta, para o meu – (nosso) – quarto, para a cama que fizemos juntos, para o sofá que nos rendeu tardes inteiras, para o quintal onde tudo começou. Para o portão grande de alumínio onde começávamos a manhã, para o chuveiro que eu só dividi com você. Para esta casa inteira que serviu de anfiteatro para performarmos a nossa história.
Me despedi de cada parte dela e do que tinha de você. Agradeci pelas boas memórias mas não posso esquecer de toda a dor que ficou, que ainda fica, e que vai ficar presa a essas paredes até que tudo o que ficou de você se vá. E eu não posso suportar, este lugar já não é mais meu.
O seu maior ato de covardia foi me socar, bem no estômago, com tudo aquilo que eu te pedi, quase implorei pra que nunca fizesse. Eu abri as minhas portas, o meu eu e o meu coração, e agora o que me resta são apenas rosas mortas e um punhado do que um dia eu já fui.
E eu sigo confusa, perdida, sinto que existem tantas coisas fora do lugar e que eu preciso consertar essa bagunça, mesmo não sendo eu quem a fez. Sinto como se tivesse falado demais, até a saliva secar e a voz falhar, para um alguém que nunca quis ouvir. Me sinto explicando o que é o amor de um escritor para alguém que nunca gostou de ler, me sinto tentando mostrar o que eu vejo para alguém que nunca quis abrir os olhos. Estou exausta, com um mar de coisas que não são minhas e que ainda assim ficaram só pra mim.
Eu queria que você pudesse me amar desde o princípio, que sempre tivesse me visto como algo que você não pudesse perder. Queria que você entendesse as minhas necessidades, que fizesse com que eu me sentisse tão segura ao seu lado que nada mais pudesse me abalar. Queria que você soubesse o que fazer, o que não fazer, queria que me visse como algo tão único e singular e tão seu – somente seu –, que te fizesse prezar por isso. Cuidar, porque se cuidar, pode durar.
Queria que você não me visse com olhos ruins. Queria que não me visse como uma egoísta duas caras, como uma criança birrenta e infantil, como uma constantemente insatisfeita. Queria que não me visse com olhos tão cruéis.
Queria que me olhasse com os olhos de quem ama. Que entendesse que quem chora sou eu, e eu preciso que você faça parar de doer.
Mas você não pode. Você nunca pôde.
E para não te chatear mais, eu vou embora.Estou me despedindo dessa casa e do que ficou, estou me despedindo de você e do nosso quase amor, estou deixando para trás todas essas coisas das quais eu sonhei viver com você porque viver com você é viver só.
Eu preciso ir.
E estou indo.No badalar das zero horas, aquele que aponta o início de um novo ano. E você sabe, eu sei que sabe, que eu tentei com todas as minhas forças e com todo o meu coração ser algo importante pra você.
Eu tentei, mas não posso fazer por você.
Tampouco forçar você a ver o que eu vejo, sentir o que eu sinto, chorar o meu choro e acolher o meu coração partido.Eu sei que você tentou.
Mas agora você está preparado para amar com todo o seu coração aquela que realmente é destinada a você.Foi boa a jornada, terei lembranças felizes suas. Lembrarei do seu sorriso e do som da sua risada e, por mais que tenha custado a minha alma, vou estar feliz em ter dividido parte da minha vida com você.
Te desejo os caminhos mais prósperos, um amor que saiba te amar, uma vida tranquila e muita paz para o seu coração. Te desejo as melhores coisas porque você não merece nada menos do que isso.
Eu me despeço, como quem experimenta uma paz de ver que não irá mais voltar. E com o meu mais sucinto instinto primitivo, aquele que me acompanha desde os primórdios, eu dedico as minhas últimas palavras a você.
Porque eu prometo, meu amor, como antes prometi.
Que seria até a morte,
e eu morri.(pra renascer em outro lugar).
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O Amor de Um Escritor
PuisiApesar da solidão que me assola e da descomunal amargura que cresce dentre meus ossos, falar de amor ainda é algo que faço com maestria. Não como romancistas lunáticos e os jovens que acabaram de se encontrar com o doce gosto da paixão. Não, é claro...