Data e local desconhecidosFrio.
Estava tão frio que os ossos dela doíam. Os músculos pareciam rígidos e as articulações machucava a cada mísero movimento. Ada sempre odiou sentir frio.
A bochecha amassada contra o chão de pedra doía tanto, mas ela não tinha forças para se levantar. Esfregou os dedos no chão e pode sentir a frieza que ali havia. Há quanto tempo já não via o sol? Não fazia mais ideia. Perdeu as contas depois de ficar trancada naquela cela por tanto tempo.
O som das correntes se fez presente e o corpo dela inteiro tremeu. O queixo dolorido tomou forças para se erguer e com grande dificuldade ela abriu os olhos, ainda presa no breu de escuridão que era sua cela. Quando a porta se abriu, fechou os olhos imediatamente, sentindo a dor pela luz repentina.
— Bom dia, Rainha Miyamura — a voz de Elliot se fez presente, carregada de sarcasmo e deboche.
Ele se aproximou dela e Ada se esforçou para levantar um pouco, apenas o suficiente para sentir o bico da bota dele debaixo do queixo dela, obrigando-a a olhá-lo.
Com a pouca força que tinha, ela juntou o máximo de saliva que conseguiu e cuspiu nele, recebendo um chute desgostoso como resposta. Não demorou até ele se abaixar e agarrar o cabelo dela com força, aproximando-se do rosto dela.
— Engula seu orgulho e morra em paz, Ada Miyamura — Elliot vociferou, o hálito dele recendia cheiro de álcool. — Peça para morrer e eu atiro na sua cabeça. Continue orgulhosa e vai sofrer, agonizar e definhar até que a morte venha te buscar.
— A morte é uma velha amiga — Ada respondeu com seu sorriso cheio de sangue e recebeu um tapa em resposta.
— Vai sofrer, Ada Miyamura.
Em seguida, o corpo dela foi arrastado para fora da cela e Ada levada até algum lugar do lado de fora. Com os olhos apertados, ela pode ver amontoados de neve próximos às janelas. Já era inverno... ela não imaginou que tinha se passado tanto tempo.
Quando finalmente chegaram no pátio externo, ela foi jogada no centro de algum lugar ainda mais frio que sua cela. Ada encontrou forças para conseguir se ajoelhar, embora ainda não conseguisse abrir os olhos, pois a neve branca e brilhante a cegava. Ergueu o rosto e, ainda com os olhos fechados, permitiu que a luz do dia a invadisse pouco a pouco, acostumando a visão com tamanha iluminação.
Com os olhos semicerrados, percebeu que estava no centro de um pátio de pedra todo fechado por portões de ferro. Os corredores que circundavam o local pareciam abandonados, embora ela pudesse ver uma silhueta humana aqui ou ali.
— Essa é a sua arma de hoje, Rainha — Elliot arremessou para uma uma faca meio cega e Ada rapidamente agarrou a empunhadura.
Travou os dentes com força e encarou-o com ódio, embora ainda não fosse capaz de enxergar completamente. Escutou o som dos latidos altos e dos portões de ferro deslizando. Mais uma vez, Elliot iria brincar com a mente dela.
Ada sabia o que ele estava fazendo. Elliot tentava destruí-la por dentro, acabar com a mente dela e fazê-la morrer muito antes de dar o tiro, mas Miyamura mantinha-se firme, na medida do possível. Ela se recusava a cair pelas mãos sujas de Elliot Davis, mas precisava ser mais ardilosa do que ele se quisesse vencer.
Estava mal alimentada, fraca, mantida em cativeiro e sendo obrigada a fazer coisas odiáveis sempre que Elliot queria se divertir às custas dela.
— O próximo será você — Ada murmurou baixinho, relembrando-se de que era a cabeça de Elliot que ela pretendia arrancar.
Em seguida, os portões foram abertos e os dobermans violentos partiram para cima de Ada, prontos para matá-la.
[...]
Sendo novamente arrastada para o interior de sua cela, Ada ainda sentia a dor na perna em que levou uma mordida antes de matar o cachorro, mas não era aquilo que mais a preocupava. Ela escondeu entre os seios, por dentro da blusa, parte da lâmina da faca. Foi difícil quebrar a lâmina no momento exato e bagunçar a neve para conseguir a peça, mas ela obteve êxito.
Quando novamente se viu largada na cela, sozinha e mergulhada no breu escuro, tateou a parede de pedra até encontrar aquela que estava solta.
Ada tinha garantido que o lugar não tinha câmeras e, sinceramente, nem precisava. Ela estava num lugar tão miserável que não precisava ser observada. Sua cela era nada mais que uma caixa fria e escura, sem nada por perto. Sua escassa alimentação era entregue em pratos de papel nada perigosos. Além disso, não era divertido para Elliot vê-la largada no chão o dia inteiro.
Secretamente, Ada aproveitava o tempo para malhar o que podia, mas a péssima alimentação dificultava seus resultados. Todavia, ela fazia o que podia. Flexões, agachamentos, abdominais... tudo o que ela podia fazer usando apenas o próprio corpo, ela fazia. Mesmo que sentisse dor, mesmo que desmaiasse no processo... ela dependia apenas dela mesma para conseguir sair daquela situação.
Quando puxou a pedra solta, tateou o interior do pequeno buraco e deixou escapar um sorriso. Sentiu a chave de fenda, a corda e os pregos que conseguiu coletar todas as vezes em que fora levada para fora da cela.
Ada ainda não sabia o que faria com aquelas coisas, mas tinha certeza de que seriam úteis para sua fuga.
Escondeu também a lâmina de faca e anotou mentalmente que precisava de algo para inventar um cabo, afinal, se tivesse levado a faca inteira, eles teriam desconfiado. Ela precisava deixar pedaços para trás.
No fim, Ada continuava igualmente indomável.
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Bordeaux - Sablier Rouge
Romance[Livro 03] [Dark Romance] Três anos se passaram desde os eventos traumáticos que forçaram grandes mudanças no submundo. O posto de Sirius foi assumido por outro Ikari, e Ada continua desaparecida. A Hidra parece cada vez mais forte, e todas as noite...