11. SNEHA

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A cidade era incrível, era um lugar tão lindo, tão colorido, tão brilhante! Tinham vendedores de comida, tecidos, doces, roupas, tinha de tudo. Assim que chegaram, Raatri comprou um pote de kumkuma para Sneha e mandou ela se sentar em um banco para que pudesse fazer o tilaka dela.

— Pronto, acho que está bom. — Raatri disse entregando o pedaço de espelho que guardava para a menina ver.

— Ficou perfeito, obrigada.

Então as garotas continuaram andando pela cidade, com o cavalo logo atrás. Pessoas lançavam olhares em direção à Raatri, mas quando viam Sneha ao seu lado, com sua longa trança, logo abriam um sorriso. A menina ouviu milhões de elogios ao seu cabelo, toda rua que cruzavam, a cada venda que passavam, cada um fazia questão de falar o quão lindo era o cabelo dela.

— Quero provar aquilo. — Sneha falou apontando para uma tenda que vendia kulfi (nota: doce indiano) de manga.

— Desse jeito você vai me fazer gastar todas as minhas moedas, sua gulosa.

Mas Raatri não conseguia negar nenhum pedido de Sneha, porque o dinheiro valia a satisfação de ver as caretas da garota enquanto comia algo ruim, a felicidade quando descobria algo gostoso, e os pulinhos que ela deu quando ganhou um sari e um nath (nota: piercing de nariz que algumas hindus usam principalmente em casamentos). 

— Também vai comprar um para a sua serva, senhora? — o senhor que vendia os kulfi perguntou para Sneha, que ficou confusa mas logo Raatri entendeu. Ele achava que ela era uma escrava árabe da garota.

— Minha senhora, eu gostaria de um, se pudesse me dar. — era melhor entrar no personagem do que brigar ali, se começassem a achar ela estranha iriam denunciar para a patrulha, que a levaria para o exército. Se achavam que ela era serva de uma hindu pelo menos estava segura. Raatri entregou o dinheiro na mão de Sneha e piscou para ela, que logo entendeu.

— Ah sim, quero sim! Acho que dessa vez posso dar um para ela...

— Seu cabelo é muito lindo. A senhora deve ser bastante rica e educada com esse cabelo longo e tão brilhante. — o homem disse, e começou a tocar no cabelo da menina. Sneha claramente ficou com medo e desconfortável com o toque.

Raatri então percebeu que odiava ver Sneha assim, se era alguém a fazer medo na menina que ao menos fosse ela que fazia brincando.

— Senhor, tire as mãos. — Raatri disse.

— Ah, eu sou um bom comerciante da região, tenho várias vendas… conseguiria manter você bem, senhora. Não gostaria de se tornar uma de minhas esposas?

Sneha estava boquiaberta, só de pensar na ideia achou aquilo completamente nojento, ela queria sair correndo, sumir para bem longe daquele homem e de todos os outros.

— Tire as mãos dela. — Raatri agora segurava uma faca, bem abaixada para que os outros que passavam na rua não pudessem ver, mas levantada o suficiente para ameaçar o vendedor. — Se encostar mais um dedo nessa mulher eu enfio essa faca no meio das suas costelas.

O homem então se afastou, Raatri estava fervendo, queria matar ele. Aquele homem havia tocado em Sneha, ela queria pegar seu dinheiro de volta e ainda levar todos os kulfi que ele vendia. Em vez disso, segurou a mão de Sneha, com a outra pegou outro kulfi e enfiou inteiro na boca.

— E saiba bem, se encostar mais um dedo na minha menina eu volto aqui e corto sua cabeça! — Raatri falou e saiu andando, puxando Sneha atrás de si, procurando por um lugar que elas pudessem respirar.

— Raatri.

— Estou procurando um lugar para a gente descansar.

— Raatri.

— O que foi? — Raatri falou ríspida. Estava fervendo de ódio, essa garota a deixava louca, não conseguia entender o porquê de ter reagido daquela forma. Não sabia se tinha sido porque o homem a tratou como uma escrava ou apenas porque insinuou se casar com a menina.

As duas se encararam, mesmo no meio da multidão de repente era como se existisse só elas. Raatri não conseguia prestar atenção em mais nada, apenas no subir e descer dos ombros da menina enquanto respirava, na sua boca entreaberta como se fosse dizer algo. Ela queria puxar ela pra si e abraça-la alí e agora, mas sabia que se fizesse isso as duas estariam ferradas, se o homem ainda não tivesse chamado a patrulha, todos à sua volta chamariam.

— Obrigada… por me defender… — Sneha disse olhando bem nos olhos dela, entrelaçando ainda mais os seus dedos.

Raatri ficou perdida naquele olhar por um longo tempo, vendo a expressão da menina se transformar entre medo e indagação. Até ver os homens de azul da patrulha ao fundo, o senhor apontando o dedo na direção delas.

— Sneha, não temos tempo pra isso… temos que correr, a patrulha está aqui. Vem.

As duas então começaram a correr, pularam escadas das ruas, passaram por becos, com o cavalo seguindo atrás.

— Ei, Mahaanatam, você pode levar a gente? — Sneha gritou, e então o cavalo se abaixou, deixando as duas montarem nele. — Eu não sei cavalgar, Raatri.

— Passe por debaixo da corda e me dê ela.

Então as duas começaram a fugir em cima do cavalo, o mais longe possível da patrulha. Sneha sentindo a respiração da garota atrás de si, que agora segurava as rédeas com uma mão e enquanto a outra estava em volta da sua cintura.

Estrelas Flutuantes - Uma releitura sáfica de EnroladosOnde histórias criam vida. Descubra agora