Eu me considero uma pessoa trabalhadora.
Precisei começar a trabalhar para ajudar minha mãe e para comprar coisas que ela não podia me dar, não porque não queria, mas porque seu salário de enfermeira só dava para pagar o aluguel, as contas e o carro e outras despesas da casa. Somos uma equipe.Porém, hoje eu não queria vir trabalhar.
Pensei em uma centena de desculpas para não vir, mas a verdade é que preciso do dinheiro e as aulas começam na segunda-feira, então são meus últimos dias em período integral. Quando as aulas voltarem, só poderei trabalhar algumas noites e aos fins de semana, sem exceder as horas permitidas para estudantes durante o ano letivo.
Já se passou quase uma semana desde a última vez que vi Ares. Para ser honesta, não esperava sentir saudades dele, já que ficamos juntos pouquíssimas vezes. Como posso sentir tanta falta de alguém? Acho que também sinto falta de segui-lo; esse era meu hobby estranho que me dava emoção e adrenalina, e agora perdi os dois. Suspiro, pegando minhas coisas e colocando-as na mochila. Dizer que tive um dia ruim é pouco.
Ultimamente, ando distraída e bocejando o tempo todo.
Meu chefe me chamou a atenção três vezes e tivemos que dar batata frita de graça para um cliente porque confundi o pedido dele. Tiro o boné do McDonald’s e o coloco no armário. Penso em trocar de camisa, mas nem tento; estou com preguiça de ir ao banheiro, trocarei quando chegar em casa.
— Dia ruim, hein? — A voz de Gabriel me faz pular, e bato o ombro na porta do armário.
— Meu Deus! Que susto.
Ele dá um sorriso tímido.
— Desculpa.
Sorrio de volta.
— Tudo bem.
Gabriel tira o boné, deixando à mostra o cabelo ruivo, e agora posso ver sua cara direito: ele tem um rosto meio fofo, do tipo que, se fizer olhinhos pidões, é capaz de você cair aos seus pés.
— Então, estou curioso. Tem algum motivo para você ter servido nuggets para alguém que pediu um McFlurry?
— Ah, você viu?
— Todo mundo viu. Você estava viajando.
Ele abre o armário e tira suas coisas.
— Que droga.
— Não se preocupe, já fiquei assim também.
Olho para ele com tristeza.
— Dani?
— Aham. — Ele olha para o interior do armário, perdido em pensamentos. — Ela e eu somos de mundos diferentes.Para ela, eu sou só o cara gato que trabalha no McDonald’s, mais nada.
— Sinto muito.
— Relaxa, eu sabia que não daria certo, mas não esperava me importar tanto com ela e tão rápido.Ah, acredite em mim, eu entendo.
— Nem sei o que dizer, Gabi.
— Me conta a sua história.
— Minha história?
— Por que você está tão distraída hoje?
Fecho meu armário e coloco a mochila nas costas.
— Eu… tirei uma pessoa da minha vida há pouco tempo.Ele… — Lembro-me das palavras frias de Ares. — Ele não era o que eu esperava.
— Decepção, né? Isso dói.
— E como. — Ando em direção a ele. — Tenho que ir. — Passo ao seu lado para caminhar até a porta. — Boa noite, Gabi.