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Izuku toma o dele.

Eu bebo o meu.

O uísque desce pela minha garganta como se fosse chumbo grosso. Desta vez não é só um suco. A bebida é forte e eu a sinto. Estou sentindo isso. Como é possível?

Izuku pede outra rodada e batiza de novo as bebidas. Torço para que os garotos sejam pesos-leve como eu, afinal o álcool é proibido por aqui, mas então imagino que quando vão à cidade recuperar coisas, devem dar uma passada em lojas de bebidas.

Eles me passam enquanto ainda bebo meu segundo drinque, maravilhado com as sensações diferentes que rodopiam pelo meu corpo. O barulho do bar fica abafado e olho apenas para Izuku, meu único ponto de foco em uma composição borrada. Ele está rindo um riso livre e sem reservas que nunca vi antes, jogando a cabeça para trás e simplesmente deixando o riso fluir dele. Denki e ele estão relembrando alguma história. Izuku se vira para mim e diz algo, me convidando para aquela piada com uma palavra e um flash de dentes brancos, mas não respondo. Apenas olho para ele, descansando o queixo na mão com o cotovelo apoiado no bar, e sorrio. Será que é isso que é sentir satisfação?

Depois de tomar toda a minha bebida, sinto uma pressão em minhas partes baixas, e percebo que preciso mijar. Como os Mortos não bebem nada, urinar é um evento raro. Espero me lembrar de como fazer isso.

Cambaleio até o banheiro e encosto a testa na parede acima do mictório. Abro o zíper, olho para baixo e lá está ele. O instrumento mítico de vida, morte e transa no primeiro encontro no banco traseiro. Ele está ali pendurado, mole e inútil no momento, me julgando silenciosamente por todos os maus usos que fiz dele durante os anos. Minha mente me trai e penso em meus pais e seu amor desgastado batendo seus corpos frios, um contra o outro. E então penso em Izuku encolhido ao meu lado na cama Kingsize. Penso em seu corpo naquelas engraçadas roupas de baixo que não combinavam, a respiração dele batendo nos meus olhos enquanto estudo cada linha de seu rosto, tentando adivinhar que mistérios insondáveis se escondem dentro dos núcleos brilhantes de cada uma de suas células.

Ali, naquele banheiro, cercado pelo fedor de mijo e merda, penso se é tarde demais para mim. Será que consigo arrancar uma outra chance dos dentes fechados da boca do céu? Quero um novo passado, novas memórias, um novo primeiro aperto de mão com o amor. Quero recomeçar de todos os jeitos possíveis.

Quando saio do banheiro, o chão está girando. As vozes estão amortecidas. Izuku e Denki conversam animados, chegando perto um do outro e rindo. Um homem de uns trinta e poucos anos se aproxima do bar e dá uma cantada em Izuku. Denki olha para ele e diz algo que parece sarcástico, e Izuku o enxota sorrindo. O rapaz dá de ombros e volta para a mesa de sinuca, onde o amigo o aguarda. Izuku acena para ele e diz algum insulto, o amigo ri, mas o homem faz apenas uma careta fria e replica mordazmente. Izuku parece congelado por um momento, então ele e Denki ficam de costas para a mesa de bilhar e Denki sussurra algo no ouvido de Izuku.

- O que... aconteceu? - pergunto, me aproximando do bar. Posso sentir os dois homens na mesa de bilhar olhando para mim.

- Nada - Izuku responde, mas ele parece abalado. - Está tudo bem.

- Pode nos dar licença um minuto, Kat? - Denki pede.

Olho de um para o outro. Eles esperam. Viro-me e saio do bar, sentindo muitas coisas ao mesmo tempo.

No pátio, dou um encontrão na cerca, com as ruas rodando a sete andares lá embaixo. A maioria das luzes da cidade está apagada, mas as luzes da rua piscam e pulsam com sua bioluminescência. O mini gravador de Izuku é um peso insistente no bolso da minha camisa. Eu o pego e fico olhando para ele. Sei que não devia, mas... sinto que preciso...

Warm Bodies | •BakuDeku•Onde histórias criam vida. Descubra agora