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Antigamente, nos meus dias de procurar coisas na cidade, eu sempre olhava para as paredes do Estádio e imaginava um paraíso lá dentro. Pensava que era perfeito, que todos eram felizes, bonitos e não queriam mais nada, e em minha visão estúpida e limitada, sentia inveja e queria todos eles mais ainda. Mas olhe para este lugar. As folhas de metal ondulado brilhando sob o sol. O zumbido das moscas sobre o ruminar do gado cheio de hormônios. As roupas manchadas penduradas nos cabos de suporte que existiam entre os prédios, balançando ao vento como bandeiras de rendição.

— Bem-vindo à Cidade Estádio — diz Izuku, abrindo bem os braços. — A maior habitação humana no que antes era chamada de Ásia.

Por que ficamos? Dizem as vozes dentro de mim enquanto Izuku mostra lugares interessantes e cartões postais. O que é uma cidade e porque continuamos construindo cidades? Leve embora a cultura, o comércio, os negócios e o prazer, sobra mais alguma coisa? Apenas uma rede de ruas sem nome cheia de pessoas sem nome?

— Tem mais de vinte mil de nós enfiados neste aquário — Izuku explica enquanto passamos por grandes multidões na praça central. — Logo estará tão apertado que vamos ter que nos espremer. A humanidade será uma grande ameba sem mente.

Por que não nos espalhamos? fugir para as montanhas e plantar nossas raízes onde o ar e a água eram limpos? o que é que precisávamos tanto uns dos outros neste amontoado de corpos?

Tento manter os olhos no chão o máximo que posso, tentando me misturar e evitando ser notado. Dou olhares furtivos para as torres de guarda, tanques de água, novos prédios surgindo sob o brilho das soldadoras, mas olho mais para meus próprios pés. O asfalto. Barro e cocô de cachorro amaciando os cantos afiados.

— Estamos colhendo menos da metade do que precisamos para sobreviver — Izuku diz quando passamos pelos jardins, apenas um sonho embaçado de verde por trás das paredes translúcidas das estufas. — Por isso, as porções de comida de verdade são racionadas e completamos a nossa dieta com Carboteína. — Um trio de adolescentes em macacões amarelos puxa um carrinho de laranjas e passa por nós. Percebo que um deles tem estranhas feridas descendo pelo lado de seu rosto, machucados marrons como amassados em uma maçã, como se as células simplesmente tivessem entrado em colapso. — Sem falar que gastamos quase uma farmácia inteira por mês. As equipes de recuperação de coisas mal conseguem dar conta. É só questão de tempo até entrarmos em guerra contra os outros enclaves por causa das últimas caixas de Prozac.

Será que foi só medo? as vozes se perguntam. tínhamos medo nas épocas boas, como poderíamos resistir nas ruins? Então achamos os muros mais altos e nos fechamos dentro deles. E continuamos lá dentro para sermos os maiores e mais fortes, elegemos grandes generais e achamos as maiores armas, pensando que esse maximalismo, de um jeito ou de outro geraria felicidade. mas nada tão óbvio assim poderia funcionar.

— O que me impressiona — Denki diz, se encolhendo para passar pelo barrigão de uma mulher morbidamente grávida — é que apesar das coisas que faltam e que precisamos, as pessoas continuam a fazer filhos. Inundando o mundo com cópias deles mesmo apenas porque é tradição, porque é o que fazemos. — Izuku olha para Denki e abre a boca, mas depois fecha novamente. — E apesar de estarmos próximos de morrer de fome sob uma montanha de fraldas sujas, ninguém tem coragem de sugerir que as pessoas guardem suas sementes durante um tempo.

— Sim, mas... — Izuku começa, com uma voz estranhamente tímida. — Sei lá... tem algo bonito nisso, não acha? Que continuamos vivendo e crescendo, mesmo em um mundo moribundo? Que continuamos voltando, não importa quantos de nós morram?

Warm Bodies | •BakuDeku•Onde histórias criam vida. Descubra agora