07

110 23 0
                                    

Feliz Páscoa 💗

   

   CAPÍTULO SETE


A antessala da igreja Swedenborgian, em Pacific Heights, explodia em tons de bordo, cobre, champanhe e… Cheetos

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.


   CAPÍTULO SETE


A antessala da igreja Swedenborgian, em Pacific Heights, explodia em tons de bordo, cobre, champanhe e… Cheetos. Vestidos de crinolina farfalhavam, risos nervosos escapavam de lábios delicadamente pintados, e um pai orgulhoso e eminente aguardava.
A noiva deu um passo à frente para tomar o braço dele, e as madrinhas e os padrinhos se reuniram à frente dela com as mãos recheadas de dálias cor de pêssego e creme. Jillian estava imponente e majestosa; corada, mas de modo algum acanhada. Envolta em seda marfim e renda italiana antiga, a única cor provinha do diamante amarelo de quatro quilates no dedo anelar da mão esquerda.
As portas de carvalho se abriram. Os olhos dela dançaram.
Enquanto o quarteto de cordas tocava, as madrinhas douraram o corredor, uma após a outra. A igreja estava cheia, porém não abarrotada. A pequena capela, rústica e charmosa, possuía um teto artesoado feito de madeira antiga, adornado por milhares de velas na cor creme as quais brilhavam suavemente. Na lareira, incomum à maior parte das igrejas, mas perfeitamente adequada à decoração rústica, o fogo crepitava alegremente, lançando a sua luz de conto de fadas.
Os convidados sorriram, o rosto iluminado por uma expectativa serena, e se viraram para o corredor central. Ao caminhar por esse mesmo corredor antes da noiva, avistei Benjamin à frente, fulgurante. Ao lado dele? O meu próprio pedaço de céu. Sorri ao vê-lo, resplandecente num terno cujo corte acentuava o seu porte alto e forte. Os olhos de Yibo resplandeciam  à luz do fogo, o rosto extraordinário. Ele abriu um sorriso de orelha a orelha quando me aproximei. Yibo piscou, eu desfaleci. Tal qual a maioria dos ômegas na capela.
Assumindo o meu lugar, observei a dama de honra de Jillian se unir a nós, e a música mudou, pois a noiva estava prestes a entrar. Eu me virei, não para olhar para Jillian, mas para Benjamin. Você já parou para observar o noivo no momento em que a noiva entra na igreja? Todos os olhos se voltam para ela, claro, mas a verdadeira mágica acontece no rosto dele. Testemunhar os olhos do noivo se acendendo, a emoção tomando a sua expressão. Presenciar enquanto ele luta consigo mesmo para controlar os sentimentos, como se espera que os alfas façam nessa situação. Nesses segundos iniciais, você enxerga a verdade. Você compreende tudo o que o noivo sente no instante em que ele a vê. Eu não precisei me virar para ver Jillian entrando na capela; eu vi tudo pelos olhos de Benjamin, no segundo em que ele pôs os olhos nela.
Surpresa.
Anseio.
Alívio.
Necessidade.
Alegria. Alegria crua e pura.
Lágrimas saltaram dos meus olhos, como eu sabia que iria acontecer. Um sorriso invadiu o meu rosto e ameaçou dividi – lo em dois. Ao me virar para Jillian, o meu olhar cruzou com o de Yibo.
Posso jurar que vi uma lágrima nos olhos dele também.
A cerimônia foi breve e fofa. Votos foram trocados, lágrimas foram derramadas por quase todos, e, sob uma chuva de pétalas, os recém-casados saíram da igreja para uma tarde perfeita de outono.
E quem eu vi jogando as pétalas? Mimi e Ryan, claro, Sophia e Barry Derry (que era notoriamente gostoso), Neil e… ninguém.
No final das contas, ele não veio acompanhado.
O que não passou despercebido por Sophia, ainda que ela tenha fingido nem notar a presença dele.
Embora eu tivesse sido eleito como ômega de companhia oficial de Jillian no casamento, acompanhando-a aonde quer que ela fosse (sim, isso incluía o banheiro; já posso dizer que ajudei a minha chefe a mijar), dei um jeitinho de ficar um pouco com os meus amigos antes de entrar no ônibus muito deselegante, porém necessário, que nos levaria à festa.
Yibo e eu fomos separados por “obrigações matrimoniais”, já que o padrinho é sempre fotografado oficialmente ao lado da dama de honra, mas, no intervalo entre as fotos, consegui roubar um beijinho ou dois.
– Eu sabia que você ia ficar lindo de padrinhp. – Ele me girou para apreciar o smoking, arregalando os olhos quando viu como apertava as minhas coxas.
– Você também caprichou – falei, admirando o pecado que era o Trepador de Paredes de terno cor chumbo.
– E agora, o que acontece?
– Agora a gente entra no ônibus, bebe champanhe com o resto dos convidados, tira foto na Baker Beach com a noiva, depois vai pra recepção. Onde você pode me embebedar, se quiser.
– Quero! Gostei da cerimônia. Eles pareciam felizes de verdade, não é?
– Pareciam mesmo. – Sorri ao fitar aqueles olhos de castanhos, que então olharam por cima do meu ombro e se perturbaram.
– O que foi?
–  Nada. Nada, não. – Ele fez uma careta, e eu me virei.
Sophia e Barry Derry conversavam com Mimi e Ryan, e Neil caminhava em direção a eles.
– Ai, ai – murmurei enquanto caminhávamos.
– Então eu falei: “Sem chance, Barry… aqui não! Alguém pode ver a gente!” – berrou Sophia, agarrando o cara, que não fazia a menor ideia de onde tinha se metido.

Olhei para Mimi, que se esforçava para manter a elegância; Ryan simplesmente franziu a sobrancelha.
– E aí, gente, que cerimônia linda, hein? – perguntei, puxando Yibo para perto no exato momento em que Neil se unia ao grupo.
Mimi sacou a deixa e respondeu alto:
– Foi mesmo! Sophia, você viu aquelas rosas no altar? A gente podia tirar umas fotos antes que eles…
– Oi, Sophia – disse Neil atrás de Sophia, e os olhos dela arderam em chamas.
Olhei para Yibo, Yibo olhou para Ryan, Ryan olhou para Neil. Neil olhou para a nuca de Sophia, enquanto Barry Derry olhava para as próprias unhas. Finalmente, Yibo se aproximou de Neil e deu um tapa nas costas dele daquele jeito que os homens fazem.
– E aí, cara, já falou com o Benjamin? Acho que ele ainda está cumprimentando os convidados. Vou te levar lá. – Yibo assentiu para Ryan, que passou para o lado deles, o que deixou Mimi, Sophia e eu num lado do círculo e os nossos meninos no outro.
Derry permaneceu no meio, alheio a tudo. Mas continuava bem gostoso.
– Sophia, por favor, amor, vai me ignorar a noite toda? – Neil perguntou, e a espinha de Sophia endureceu.
–  Amor? Você me chamou de amor? – ela esbravejou, girando sobre os saltos. Saltos modelo Por-Favor-Me-Coma, devo acrescentar; a mulher estava espetacular. O cabelo ondulava em mechas perfeitas; a maquiagem estava impecável; o corpo – com os quilinhos a mais por conta do término da relação –, acomodado em um vestido justo e preto. E os peitos? Puta que pariu. Até eu fiquei instigado.
Mas Neil? Ele estava perplexo. Chocado. Sem chão. O ex-atleta olhou para a violoncelista com olhos do tamanho de pires. Pires famintos – esse cara ainda estava estupidamente apaixonado. Já Sophia estava basicamente furiosa. E eu não posso culpá-la. Ninguém pode te machucar tanto quanto aquele que diz que te ama.
– Você não tem o direito de me chamar de amor – ela retrucou, as mãos apoiadas na cintura e o peito estufado; Sophia sabia tirar proveito do que tinha. Agarrando Barry pela gravata, ela o conduziu em direção ao estacionamento.
O nosso círculo se fechou; eu segurei a mão de Yibo, e o braço de Mimi envolveu a cintura de Ryan.
– Ela não vai falar comigo, né? – Neil perguntou, com uma expressão de tristeza. Revirei os olhos.
– Duvido muito. – O ônibus estacionou, e eu puxei Yibo.
– Vamos, temos que ir. Encontramos vocês na recepção. – Acenei para Mimi e, olhando para trás, lancei mais um olhar fulminante para Neil enquanto nos retirávamos.
– Pega leve, tá? – Yibo pediu conforme atravessávamos o estacionamento.
– Você só pode estar brincando.
– Não. Não estou. Ela é sua amiga, ok, eu entendo, mas ele é meu amigo – ele afirmou, o olhar terno e ao mesmo tempo repreendedor.
Vi Sophia caminhando com Barry Gostosão e rindo escandalosamente.
– Vamos curtir a noite? – sussurrei para Yibo ao entrar no ônibus.
Nós nos acomodamos nos assentos junto aos demais padrinhos, madrinhas e familiares, celebrando com o casal radiante. Conforme percorríamos as ruas de San Francisco a caminho da baía, observando Jillian e Benjamin se beijando de um em um minuto, me senti extremamente feliz por ter o meu Yibo ao meu lado. E muito triste por Sophia não ter o seu Neil.
Mas era um dia feliz e, depois de algumas taças de champanhe, eu estava pronto para uma noite incrível na cidade.
E com uma recepção no Hotel Fairmont? A diversão estava garantida.
Se a cerimônia foi simples, não se podia dizer o mesmo da recepção. Elegante era a palavra que melhor descrevia o Salão Veneziano do Fairmont e a recepção de modo geral.
Se nem todas as velas de San Francisco estavam naquela capela, então todas as outras estavam dentro deste salão. Sem contar os candelabros dourados, as contas de cristal penduradas em cada uma das arandelas, os espelhos refletindo cada centelha dançante, proporcionando um efeito que não era deste mundo.
Era do mundo do Dinheiro. Pertencente à galáxia dos Sem-Noção, de tão pomposo. Mas com o toque de Jillian e Benjamin.
Os vasos de flores eram mais altos do que eu? Sim, mas também havia fotos da formatura dos dois espalhadas pelo salão. Havia uma orquestra completa? É… mas que tocava versões instrumentais de Def Leppard, Journey e U2. Ah! E de uma banda chamada Rush, que aparentemente deixava os caras retardados.
Quando chegamos com os noivos a tiracolo, fizemos a nossa entrada triunfal sob os aplausos da multidão. Depois que sentamos à mesa, notei que Jillian dispusera os lugares de modo que, embora fosse padrinho, Yibo ficaria ao meu lado. Ao olhar ao redor daquela decoração cheia de pompa e circunstância, percebi que Jillian tinha deixado Sophia e Neil em mesas separadas (um ajuste de última hora), porém vizinhas. Ao lado de Neil, um lugar vazio.
– Não estou entendendo… Você não disse que ele ia trazer alguém? – sussurrei para Yibo.
– Ia, mas mudou de ideia. Ele queria conversar com ela e achou que seria melhor se estivesse sozinho – Yibo explicou, com uma cara de “eu avisei”.
– Hum.
Enquanto eu assistia de camarote ao desenrolar da história, a comunicação entre Sophia e Neil se tornou bastante evidente.
Primeiro, Sophia notou, pelo cartão com o seu nome, que, embora ela e Neil estivessem tecnicamente em mesas diferentes, se sentaria exatamente de costas para ele. Ao dar a volta na mesa redonda e puxar a própria cadeira (mandou bem, Barry Derry; só que não), ela fez questão de acidentalmente batê-la na de Neil.
E então, quando Neil se levantou para cumprimentar alguém e, por acidente (ou de propósito), bateu a cadeira na dela, vi Sophia pegar o garfo de salada e começar a se virar, até que Mimi a desarmou.
Quando as entradas foram servidas, os dois se esbarraram tanto que parecia haver formiga na cueca de um e na calcinha da outra. Se bem que o vestido de Sophia era tão colado ao corpo que eu tinha certeza de que ela não estava usando calcinha alguma.
– Você está vendo isso? – eu perguntei a Yibo, gesticulando com a cabeça em direção aos duelistas de cadeiras.
– Tem como não ver?
Nesse exato instante, Neil se virou e cutucou o ombro de Sophia. A reação dela foi empurrar a cadeira para trás o máximo que conseguiu, se levantar e convenientemente pisar no pé dele com o salto agulha enquanto arrastava uma relutante Mimi até o banheiro feminino, deixando Neil praguejando contra o guardanapo. Ao chegar ao canto do salão, Sophia se virou, olhou para mim e me chamou com o dedo.
Merda. Reunião no banheiro.
– Já volto. Não deixa cortarem o bolo sem mim.
– Ah, claro, eu vou explicar pros noivos e seus gentis convidados que eles precisam esperar pra cortar o bolo por motivo de fofoca no galinheiro – Yibo provocou.
Dei um beijo na testa dele e segui até o banheiro.
Quando me aproximei, percebi no rosto das mulheres que estavam saindo do toalete uma expressão de choque absoluto, de horror mesmo. Apressei o passo.
Assim que entrei, entendi tudo. A sequência extremamente criativa de palavrões que vazava da boca de Sophia fez os meus pelos se arrepiarem. Mimi estava sentada no sofá, sem saber o que fazer.
Entrei bem no final de uma frase que dizia:
– … aquele morfético-craquelento-filho-de-uma-puta-desgraçado-cuzão que se foda!
– De quem estamos falando? – perguntei espirituosamente.
Mimi conteve um sorriso.
– Qual seria a pena se eu roubasse a faca do bolo e cortasse o pinto dele fora? – Sophia indagou, e outras duas mulheres se apressaram para sair do banheiro.
– Pesada. Podemos conversar sobre isso sem mencionar castração?
– Duvido. Neste exato momento, quero o pinto dele dentro de um pão de cachorro-quente.
Ra-paz…
– Posso ser a voz da razão aqui? Você precisa se acalmar, mocinha – intervi, erguendo o dedo quando ela começou a me interromper –, porque ama a Jillian. E ela certamente não quer que seu casamento fique conhecido como o casamento-do-cachorro-quente-de-pinto, ok?
– Daria uma bela manchete.
Suspirei.
– Nada de duelo de cadeiras nem de tentativa de homicídio de pênis com garfo, tudo bem? Volta pra lá e se comporta como uma convidada civilizada.
– Te odeio! – Sophia retrucou, alisando o vestido e verificando no espelho o gloss labial.
– Não, não odeia, não – rebati, depois me virei para Mimi:
– Quanto a você, achei que fosse ficar de olho nela – murmurei enquanto Sophia ajustava os peitos no vestido.
– Eu estava, mas aí o Ryan enfiou a mão na minha perna por baixo da mesa e…
– Nos poupe… Anda, senão vamos perder a valsa – disse, me olhando no espelho. Caraca, eu fico bem mesmo de Cheetos!
– Senhoritas, peitões a postos: vamos voltar pra festa. Chega de drama – instruí, e nós três retornamos ao salão.
E nos demos conta de que a cadeira ao lado de Neil não estava mais desocupada.
Uma loira gostosona a ocupava agora, e, entre risos e gritinhos dela, Neil fez questão de chamar a atenção de Sophia. E de dar uma piscadinha.
Mensagem dada: este jogo pode ser jogado por dois. Merda.
  ▸ 🎕 ┈┈┈┈ 🎕 ┈┈┈┈ 🎕 ◂
O restante do casamento passou num turbilhão de imagens. Jillian e Benjamin dançando sob os olhares de todos. Um bolo de cinco andares sendo cortado e enfiado sem a menor cerimônia na cara linda do noivo. Yibo brindando Benjamin com champanhe e risadas – não sem limpar a garganta (leia-se engolir o choro) algumas vezes.
Neil desfilando com a Loira Gostosona na frente de Sophia e de Barry Gostosão. Sophia cutucando Barry Gostosão quando ele cometeu a cachorrada de olhar para a Loira Gostosona. A cara de pôquer de Neil ao observar Sophia e Barry Gostosão dançando bem, bem colados. Um Benjamin completamente confuso quando Barry Gostosão tentou lhe vender um seguro de vida adicional.
A minha dança com Yibo, requebrando sob o globo espelhado – que, embora sempre pareça uma péssima ideia, banhava o ambiente com a luz mais incrível de todas. Yibo me conduziu com firmeza, uma mão na minha lombar e a outra segurando a minha mão. Casamentos são românticos por natureza, e eu não era o único com um brilho no olhar nesta noite. As chamas dos olhos de Yibo estavam estonteantes.
– No que você está pensando? – perguntei a ele com uma voz sonhadora. Yibo também parecia sonhar. O que estava passando pela cabeça dele? Euzinho com este smoking? Ou euzinho sem este smoking?
– Varas de pescar.
– O quê?! – Definitivamente, não era a resposta que eu esperava.
– Varas de pescar. Você perguntou. – Ele riu e me rodopiou.
– Sei. O que têm as varas de pescar? – questionei, torcendo o nariz.
– Onde eu cresci, tinha um parque a menos de dez minutos da minha casa. Rios, pedras, um vertedouro antigo e trilhas por todos os lugares. – A expressão de Yibo se tornou serena. Ele quase nunca falava sobre o seu passado, e eu me perguntei o que o fez pensar nisso hoje. – Enfim, a última vez que eu, meu pai e Benjamin estivemos juntos foi numa tarde de domingo, pescando, o Benjamin sentou na vara favorita do meu pai e quase quebrou a coisa! – Ele riu e segurou a minha mão com um pouquinho mais de força.
– É engraçado como a gente lembra de algumas coisas. Alguém tinha posto fogo numas folhas, então tudo cheirava a fumaça… Sabe aquele cheiro de fumaça que a gente só sente no outono? Eu lembro disso e do quanto a água estava fria. Ninguém pegou nada naquele dia, nem isca –  Yibo concluiu, o olhar distante.
Deixei a minha mão se enroscar nos seus cabelos e então a deslizei para acariciar a sua testa com a pontinha dos dedos.
– Parece que foi um dia legal.
– Foi um dia legal. – Ele sorriu para mim e me puxou para mais perto. A banda começou a tocar Duke Ellington, e o Trepador de Paredes me rodopiou pelo salão.
Este também foi um dia muito legal.
Ainda mais legal porque não acabou em cachorro-quente de pinto.
(....)

Amor entre as paredes ( livro II)Onde histórias criam vida. Descubra agora