Capítulo 31 - Morado

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AAAAAAAHHHHH ESSE CAPÍTULO <3

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As luzes do morro pareciam se acender para mim a medida que eu subia, ruas e becos repletos de gente conversando, aproveitando o ar fresco fora do barraco quente, pelos telhados, meninos empunhando fuzis, esperando uma ordem, um comando, um caminho.

Eu devia muito para aquelas pessoas, para a comunidade no geral. Cuidar, zelar, proteger, alimentar. Funções do tráfico que iam muito além do ganho com as drogas.

Raramente eu ia ao nosso cartel, as decisões quase sempre tomadas remotamente, ainda mais com o risco de atentados que eu vinha sofrendo. Parei a van em frente as portas duplas de alumínio que fechavam o galpão e ela se abriu, um rangido agudo deixou todos alerta, entrei com o veículo e estacionei no ponto mais fundo.

Devia ter cinquenta homens ali, talvez mais, dos cargos mais altos aos intermediários, por mais que eles mantivessem a pose, eu sentia o medo deles, nenhum me conhecia de verdade. Dei a volta no carro, abri o porta-malas e puxei o plástico que enrolava o corpo de Alisson, o fazendo cair no chão, os buracos de bala eram inúmeros e o corpo já começava a enrijecer.

Tem algo de maligno em alguém que mata o próprio irmão. Mas era mais que isso, aqueles homens estavam aprendendo que não deviam mexer comigo e que não importava quem conspirasse contra mim, teria o mesmo fim.

Me virei para eles, todos em silêncio, alguns balançavam a cabeça lentamente em afirmação, o que me dava a certeza de que tinham entendido e aprovavam.

- Esse é o Falcão, sangue do meu sangue e que me apunhalou pelas costas. Ele era um traidor, não só para mim, ele traiu cada um de vocês, cada um dessa comunidade. Eu não vou caçar os que o apoiaram contra mim, vocês têm meu perdão. Nossa luta, essa noite, é contra algo maior.

- A gente tá contigo, chefe. Seja o que for – um dos mais novos se adiantou.

Eu me orgulhava daqueles homens, deixando suas casas e famílias para servir ao morro. A única pergunta era: eles estavam prontos para o que viria a seguir?

-- Hoje tem baile na sete, quero todo mundo lá, avisa que tá proibido subir. Não precisamos de ninguém de fora hoje e todos os meninos armados até os dentes – olhei para o corpo sem vida de Alisson no chão, decidido a não dar paz a ele tão cedo – e quero ele lá.

Dei as costas para eles, sem o medo de ser atingido por trás, não fui para casa depois disso, Agatha e Ceci precisavam descansar e quanto menos elas soubessem o que eu estava fazendo melhor,

Peguei carona com um dos rapazes e desci até a casa de Mané, geralmente onde recolhíamos armas e esse tipo de coisa, tomei um banho e me troquei, percebendo marcas no meu corpo que não estavam ali antes e eu não lembrava de ter feito, provavelmente no tiroteio com a adrenalina nas alturas.

Dei uma última olhada na cicatriz que ficou com o tiro de raspão que levei semanas antes. Um desfalque no meu braço fechado de tatuagens.

Eu já ouvia a música de onde eu estava, alta e estridente, era minha hora de aparecer, segui pelas vielas a pé, as meninas saindo de casa vestindo quase nada, maquiadas, cheirosas, buscando a diversão que não viria. No baile, alguém colocou uma cerveja na minha mão.

Era uma dessas coisas que esquecemos que existe até alguém nos oferecer, foi nostálgico, como se eu não bebesse a anos, molhei a garganta virando a garrafa toda de uma vez.

Subi no degrau que servia como um palanque, estendi a mão e um dos rapazes me deu um megafone, era ridículo, mas necessário, a música parou, uma vaia se estendeu ao longo do baile, centenas de pessoas reclamando até me verem parado no lugar mais alto, o barulho foi cessando até ser apenas um burburinho apreensivo.

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