CAPÍTULO 30

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Há um rei no trono. Pele escura como a noite e olhos marrom como avelãs. O reino está caindo. Tão dura como suas feições é sua forma de governar, porém ele costuma fingir...

A maioria de seu povo tem receio. Medo, angustia e desesperança são sentimentos comuns.

Com ele? Cobiça, arrogância, raiva, ansiedade e -bem escondido- o medo.

A Coroa dissipa falsos ideais nesse reino de gelo. Enfatiza uma maldição e alega que tudo será resolvido quando aquilo que se perdeu lhe for devolvido.

Zaphyr, é o nome daquele que a procura.

Estamos de olho. Estamos ouvindo.

*****

-Interessante... -Rhys murmurou.

Estavam treinando havia um tempo considerável que -pelo que sabia- poderiam ser horas. Azriel ainda tinha energia demais para gastar.

Energia para gastar, na verdade, era a desculpa por seus pensamentos tão volúveis e uma ansiedade absurda da qual não gostava. Ele a odiava.

Rhys parecia tão pensativo quanto ele e seguia firme com cada golpe de sua espada. Diferente do tempo após Sob a Montanha, o irmão havia voltado a seu físico anterior e ele podia não ser Cas, mas ainda era um oponente árduo.

- O que quer dizer? -Azriel questionou.

Interessante era uma palavra que ele não usaria para descrever o momento. Angustiante, preocupante, curioso, suspeito, estranho, seriam de melhor uso.

-É só...interessante.

As espadas se chocaram com força. Ele pôde sentir seus músculos vibrando e o impacto sendo absorvido por seu corpo.

Os olhos violeta de Rhys se fixaram nos seus castanhos.

Um sorriso de lado surgiu nos lábios do irmão enquanto se desvencilhava e se punha a andar em torno de Azriel.

Um caçador observando sua presa.

Ele não precisava ler mentes para saber o quão divertido Rhysand achava o mal humor dos infernos que arrebatava o Encarnador toda vez que acontecia algo minimamente preocupante em relação a Lyra.

Não precisava ler mentes para saber que todos já haviam notado essa ocorrência. Ele só não sabia quem no Círculo Íntimo já sabia o que aquilo significava.

As palavras que preferia não dizer por enquanto.

Azriel estava atolado em um monte de merda, essa era a verdade. E estava se afogando bem lentamente.

-Acho interessante- repetiu Rhys lançando-lhe um olhar divertido- tudo o que me contou. O que as sombras viram...mas o mais interessante é que não consigo sequer imaginar o motivo para que esse tal de Zaphyr esteja tão fixado em sua... em Lyra.

Aquilo também o deixava curioso. Não conseguia entender o que de tão grave Lyra teria feito para atrair a ira de um rei, mas ele também sabia que não era incomum pessoas serem punidas por nada.

O problema é que não parecia apenas um rei arrogante incomodado com banalidades. Azriel não achava que o tal Zaphyr enviaria seus lacaios para outro continente atoa...

-Descobriu algo mais? - Rhys havia parado de se mover.

O olhar divertido diminuindo ao ceder lugar à mente do Grão-Senhor.

- Na verdade não - talvez fosse melhor guardar o episódio de pesadelos para si próprio - Mas, para ser sincero, isso tem me preocupado.

- Hm... Nenhum ponto fora da curva. Ela faz tudo certo, não causa problemas e tem uma rotina tão parada que chega a ser suspeito, não é?

- Sim - ele respondeu em meio a um suspiro.

As sombras pareciam se recusar a observá-la como as espiãs que sempre foram e -se tivesse que ser sincero- ele mesmo não gostava da ideia de espioná-la como fez tantas vezes com seus inimigos ou aqueles que pareciam propensos a receber esse título.

A verdade é que ele gostaria de descobrir da maneira normal. Conversando, se conhecendo como todas as outras pessoas faziam.

Talvez fosse egoísta, mas ele não se importava.

-Então...- Rhys começou a dizer, o tom esticado da palavra anunciando que ele provavelmente diria algo que não agradaria Azriel - Considerando que você certemente não estaria aqui agora se tivesse contado à ela, vou me adiantar e ousar perguntar: por que ainda não contou?

Um grunhido foi sua resposta. Ele com certeza não gostava daquele assunto.

Ele queria contar. Queria tanto que sua língua formigava, sua garganta coçava e se fechava com as palavras lá presas.

Contudo, continuava paralisado pensando em como ele falaria e, tinha que cofessar, também estar apreensivo ao contar.

Rhys não precisava saber disso. Ninguém precisava. Não por que ele não confiava em seus irmãos ou nos outros, mas aquilo era algo dele para resolver.

-Vou contar no momento certo... -murmurou.

- Tudo bem. -respondeu seu irmão após um tempo.

Os dois continuaram o treinamento. Golpe atrás de golpe, movimentos calculados e limpos.

Rhysand tinha um sorriso largo colado ao rosto. Sorriso que Azriel espelhava.

Eram só ele e Rhys naquele combate de mentirinha que levavam - de certa forma- bem a sério.

Os treinos geralmente eram um momento de distração. Focado demais em não ser golpeado para pensar em qualquer coisa.

Mas daquela vez, a cada pancada, cada som que as espadas produziam ao se chocar, era ofuscado pela preocupação. Pelas ideias e pelos temores.

Os " e se" que tanto o atormentavam de uns tempos para cá.

Ele se perguntava quanto tempo demoraria para criar coragem de dizer a Lyra o que eram. Se perguntava quando conseguiria ultrapassar suas barreiras e ser capaz de afirmar conhecê-la.

E lá no fundo, um canto escuro de sua mente que se recusava a dar atenção, havia um alerta, uma pitada de medo e ansiedade.

Por que e se ela não for quem ele acha que é? E se ao entregar seu coração estiver prontamente se jogando nas garras e dentes afiados de uma bruxa?

Azriel os ignorava e repudiava esses pensamentos. Lyra não era uma bruxa.

E afinal -para sua frustração e preocupação- importaria mesmo se ela o fosse?



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