Com as mãos trêmulas, Crowley abriu o envelope com a inscrição "Para: Crowley". O seu coração acelerou enquanto ele retirava o papel de dentro e começava a ler o conteúdo escrito pela mão do próprio Aziraphale.
"Meu caro Crowley,
Houve um tempo em que os nossos destinos pareciam estar gravados em pedra, diametralmente opostos, mas, ao longo dos séculos, aprendi que as linhas que definem o bem e o mal são muito mais ténues do que imaginamos.
Vi em ti muito mais que apenas um demônio. Confesso que, em muitas ocasiões, a tua presença foi uma luz em meio à escuridão.
Há algo mais que devo te confessar, algo que mantive oculto por medo das consequências, mas que agora, neste momento de clareza, sinto-me compelido a revelar.
Com todo o meu..."
O texto terminava abruptamente, como se a escrita tivesse sido interrompida subitamente. Crowley olhou para a carta, suas sobrancelhas franzidas em confusão. O que Aziraphale estava a tentar dizer? Por que a carta terminava assim?
Uma sensação de inquietação o dominou enquanto ele relia a última frase várias vezes, procurando por algum indício do que poderia ter acontecido. Mas não havia nada além do silêncio desconcertante que permeava o papel.
Crowley juntou a carta ao peito e voltou a se afundar no chão do seu apartamento, as lágrimas fluindo livremente pelo seu rosto. Ele abraçou a carta como se fosse uma âncora, uma das poucas coisas tangíveis que restavam do seu amado Aziraphale.
*
Determinado a encontrar respostas, Aziraphale continuou sua investigação, aprofundando-se cada vez mais nos meandros do passado celestial. Ele sabia que não seria fácil desvendar os segredos guardados pelo próprio Céu, mas estava determinado a fazer o que fosse necessário para descobrir a verdade sobre a expulsão de Crowley do céu.
Gadiel entrou novamente no escritório celestial com um arquivo sem nome em mãos, uma expressão de expectativa estampada em seu rosto angelical. Aziraphale olhou para o assistente com curiosidade enquanto este depositava o arquivo sobre a mesa, revelando sua descoberta com um gesto solene.
— Meu senhor, encontrei este arquivo nos registros mais antigos do Céu — disse Gadiel, sua voz ecoando no amplo escritório. — Acho que pode conter algo do seu interesse —
Aziraphale arqueou as sobrancelhas, surpreso com a revelação. Ele pegou o arquivo com cuidado, sentindo um arrepio percorrer sua espinha enquanto contemplava o que poderia estar contido ali.
O Anjo respirou fundo e pressionou o botão de reprodução na gravação do tribunal. Uma voz grave ecoou pelo escritório celestial, preenchendo o ambiente com uma aura solene e carregada de significado.
Metatron, o arauto divino, assumiu o papel de juiz no tribunal, enquanto os arcanjos mais poderosos e os anjos mais antigos se reuniam para julgar o caso de Crowley.
— O tribunal celestial está agora em sessão — proclamou Metatron, a sua voz reverberando com autoridade. — Nós estamos reunimos aqui para julgar o caso do anjo Samael, acusado de crimes contra a vontade divina. —
— Samael, por os teus crimes contra a vontade divina e tua desobediência aos decretos celestiais, serás enviado para o inferno— Declarou Metatron, a sua voz ressoando com autoridade.
Mas a sentença não parou por aí. Metatron continuou, suas palavras cortando como lâminas afiadas no coração de Crowley.
— Além disso, como punição adicional, vais ser proibido de ver as coisas que mais amas neste universo, as estrelas que ajudas-te a criar — Anunciou o arauto divino.
Aziraphale sentiu um aperto no coração ao ouvir a sentença. Ele viu nos olhos de Crowley não apenas a tristeza da punição imposta, mas também a agonia de ser privado daquilo que mais amava neste universo. As estrelas não eram apenas corpos celestes para Crowley, eram sua fonte de conforto, sua conexão com a beleza e o mistério do cosmos.
Aziraphale avistou as lagrimas a formarem-se nos olhos de Crowley, uma mistura de tristeza e resignação que ameaçava consumi-lo enquanto dois anjos o seguravam com firmeza.
O Anjo fechou a gravação com um suspiro pesado, lembrando-se com angústia das histórias que Crowley havia compartilhado sobre sua queda. Ele podia sentir a dor do demônio, como se estivesse presente naquele momento fatídico. A imagem de Crowley se levantando, ferido e desamparado, suas asas cobertas com um líquido negro, assombrava Aziraphale, enchendo-o de tristeza e pesar.
*
Três batidas leves ecoaram na porta do apartamento de Crowley, mas o demônio estava tão imerso na sua tristeza que mal registrou o som. Ele permanecia no chão, perdido nos seus pensamentos sombrios, sem vontade de enfrentar o mundo lá fora.
Enquanto o silêncio se arrastava, o som das chaves girando na fechadura rompeu o ar. A porta abriu-se lentamente, revelando Nina e Maggie, duas das três únicas pessoas que ainda significavam algo para Crowley naquele momento de escuridão.
Nina entrou no apartamento primeiro, o seu rosto denotando preocupação enquanto observava Crowley no chão. Aproximou-se com cautela, tocando suavemente o seu ombro.
"Crowley, o que aconteceu?" perguntou Nina, a sua voz suave e cheia de preocupação.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Chuva Ácida (Good omens)
Historical FictionDepois de Aziraphale ter partido para ser o novo Arcanjo Supremo, Londres nunca foi o mesmo sítio; chovia todos os dias, mas não como antes. Eram chuvas agressivas que causaram inundações em muitos lugares. As chuvas eram intensas, especialmente em...