Chuva?

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O demónio ergueu-se, caminhando pelo pub vazio sem compreender o que estava a acontecer, e de seguida decidiu então olhar pela janela e analisar os seus arredores.

Lá fora chovia a maior quantidade de chuva que Crowley testemunhara em seus mais que 6000 anos de existência. Pessoas corriam, em busca de abrigo da tempestade torrencial. Intrigado, Crowley decidiu sair para investigar o fenômeno climático anormal.

 Assim que colocou os pés fora do pub, o demônio sentiu um ardor nas costas. A chuva que caía queimava sua pele.

— O que raio é isto? — exclamou o demónio

Crowley colocou o seu casaco de cabedal preto sobre a cabeça e e adentrou a multidão em busca de respostas.

— Samael! — Gritou uma voz familiar.

— Aziraphale? — O demónio olhou em redor, deixando acidentalmente partículas de chuva cair em suas bochechas corroendo lentamente a sua pele — Argh — gemeu de dor.

Crowley mal prestava atenção ao nome que escapava dos lábios de Aziraphale; estava totalmente focado em encontrar seu Anjo. O demónio correu pela multidão ignorando a dor agoniante no seu rosto.

— Aziraphale! — Gritou Crowley, correndo desesperado em direção ao seu Anjo. No entanto, a chuva continuava corroendo sua pele, dificultando cada passo.  Após o que parecia ser uma eternidade a correr em direção aos gritos de Aziraphale, Crowley colapsou no chão, vencido pela dor. Por mais que tentasse se levantar, suas pernas pareciam recusar-se a obedecer.

 Mesmo imerso na angústia, ele arrastava-se incansavelmente em direção ao Anjo, a determinação sobrepondo a dor insuportável.

Quando finalmente estava prestes a tocar em Aziraphale, que estava de costas para ele, Crowley despertou abruptamente de seu sonho. Respirando ofegante, percebeu que tudo não passara de uma ilusão, mas o ardor imaginário em suas costas permaneceu como uma lembrança vívida.

                                                                   *

— Saudações meu senhor — Gadiel adentrou o imenso escritório do Arcanjo supremo.

— Oh! — Exclamou Aziraphale, assustado pela repentina entrada do seu assistente — Saudações Gadiel, conseguiste encontrar os arquivos dos anjos caídos? — 

— Consegui sim, minha excelência! — Gadiel depositou uma quantidade incontável de arquivos empoeirados sobre a mesa — Aqui estão, meu senhor — disse, sorrindo.

Aziraphale agradeceu a Gadiel enquanto examinava os arquivos empoeirados. A busca pelos registros dos anjos caídos tomou horas, mas finalmente, entre os documentos desgastados, Aziraphale deparou-se com um arquivo que se destacava com letras grandes e riscadas: "Samael".

Aziraphale deslizou os dedos sobre o empoeirado arquivo, abrindo-o com cuidado. Seus olhos varreram as páginas amareladas enquanto ele lia atentamente o conteúdo que se desenrolava diante dele.

"Samael é um anjo celestial, um dos mais poderosos arcanjos que não tem uma posição exata de trabalho. Já colaborou em vários projetos junto a Deus e aos arcanjos mais poderosos, sendo o responsável, por exemplo, pela criação da Nebula Cabeça de Cavalo e por grande parte das estrelas, além de ter auxiliado na formação do universo."

Aziraphale virou a página, mas deparou-se com um trecho praticamente ilegível, com palavras riscadas sobre o texto original.

                                                                           *

Crowley acordou repentinamente, sentindo a frieza do chão do seu apartamento sob seu corpo. Os olhos meio cerrados, ele piscou para se orientar, percebendo que estava estendido no chão de forma desordenada. Um gemido escapou de seus lábios enquanto tentava se recompor.

O apartamento encontrava-se imerso em uma penumbra espectral, as cortinas cerradas impedindo a entrada da luz do dia. O som da chuva batendo contra a janela ecoava de forma mais intensa do que antes. Crowley esfregou os olhos, tentando dissipar os resquícios do sono e compreender o que havia acontecido.

Foi então que ele reparou no aroma de whisky  no ar. Seu olhar vagou até a garrafa caída, percebendo que o líquido havia se espalhado pelo chão. 

Um arrepio percorreu a espinha de Crowley quando seus olhos se fixaram no diário de Aziraphale, agora manchado pelo whisky derramado. Ele se aproximou, cauteloso, e viu as páginas do diário encharcadas, as palavras borradas pela bebida.

O demônio pegou o diário, examinando-o para avaliar sua condição. Estava quase totalmente encharcado, a tinta escorria das páginas, transformando as palavras cuidadosamente escritas pelo anjo em manchas ilegíveis.

— Não, não, não! — Repetia o demónio enquanto lagrimas se formavam nos seus olhos.

Mas, de repente uma carta caiu de dentro do diário que estava magicamente seca. No seu envelope dizia "Para: Crowley".

Com cuidado, Crowley pegou a carta, abrindo-a lentamente para ler seu conteúdo.


Chuva Ácida (Good omens)Onde histórias criam vida. Descubra agora