Diferenças

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Capítulo III

Tales abriu os olhos.

Os poucos feixes de luz que invadiam aquele quarto desconhecido não eram o suficiente para que identificasse os detalhes de primeira.

A cama era desconfortável e o recinto um tanto humilde. Além do cômodo em que estava, apenas um outro quarto e uma cozinha completavam o casebre de madeira.

Saindo dela, uma jovem de olhos e cabelos castanho-claros limpava as mãos em uma toalha.

— Você acordou! — ela exclamou.

— O quê...? — O ferimento em seu abdômen lhe deu uma pontada aguda. A dor lacerante quase o fez desmaiar.

— Cuidado! — disse a garota, ajudando-o a se sentar na cama e afofando seu travesseiro para lhe servir de encosto. — Seus ferimentos eram muito feios, vai demorar um pouco a cicatrizar.

— Q-Quem é você? — questionou, com a voz frágil.

— Meu nome é Ângela. — Ela deu um sorriso cansado, porém acolhedor. — Te encontrei ferido na beira do rio há dois dias.

— Me encontrou? — Um desespero tomou conta de Tales, conforme se lembrou do que havia ocorrido. — Não tinha mais ninguém junto comigo?

Já não tinha esperanças sobre Esmeralda, mas quem sabe Raphael e Nesso ainda estivessem vivos.

— Não — disse ela, franzindo as sobrancelhas e reconhecendo que sua resposta lhe traria muita tristeza. — Sinto muito.

A cena do massacre que Deimos cometeu lhe preencheu a mente. Esmeralda, Nesso e Raphael, todos mortos num piscar de olhos. Era um milagre estar vivo. Um milagre tão grande que era até injusto com os que perderam suas vidas.

O garoto cobriu os olhos. De certo modo, já não doía mais como no início.

Tales já havia passado por tanto que estava anestesiado. Desastre corria em seu sangue. E ele odiava.

As pessoas ao seu redor caíam e qualquer esforço seu para impedir isto era inútil.

Não aguentava mais perder amigos.

— Quer comer alguma coisa? — Ângela lhe correu a mão pelas costas.

Tales fez que sim com a cabeça. Não sentia uma ameaça vindo dela e estava tão fraco que mal conseguia raciocinar.

Ângela passou algum tempo na cozinha, enquanto o cavaleiro se recompunha. Perdeu-se em pensamentos. Onde estava? Como faria para retornar ao Santuário?

Um prato fundo e quente pousou em seu colo e o trouxe de volta ao presente.

— Espero que goste — ela sorriu, expondo as marcas impiedosas do sol em seu rosto. Mesmo jovem e bonita, estava estampado em suas rugas que era alguém que trabalhava no campo.

Havia um cozido simples, porém saboroso, fumegando. Tales abandonou toda a civilidade e mergulhou no prato, devorando a comida como um troglodita.

— E qual o seu nome, homem misterioso?

A resposta veio na forma de grunhidos por parte do jovem esfomeado. Seu olhar não arredou do prato.

— Entendi, não vai me responder, né? Eu não sabia que os cavaleiros andavam com duas armaduras. Você roubou de alguém?

Tales engasgou e, como um animal acuado, seus olhos se fixaram na jovem.

— O que você sabe? — questionou.

— N-Nada demais! — Ela balançava as mãos. O semblante do jovem era o de quem não tinha nada a perder. — T-Todo mundo no vilarejo conhece os cavaleiros!

Cavaleiros do Zodíaco: Desatando Nós - Livro 2Onde histórias criam vida. Descubra agora