Acordei no dia seguinte com uma sensação estranha, uma mistura de náusea e tontura que me deixou inquieta. Pensei sobre os últimos dias, sobre o estresse e as emoções fortes que tinha vivido, mas algo mais parecia estar acontecendo. Eu estava atrasada. Já fazia alguns meses que deveria ter menstruado e nada.
Comecei a suspeitar que algo estava errado. Lembrei-me das aulas de biologia do colégio, dos sintomas iniciais da gravidez. Náuseas, tonturas, atraso menstrual... Uma sensação de medo tomou conta de mim. Será que eu poderia estar grávida?
A possibilidade da gravidez me assombrava, enchendo meus pensamentos com um medo que eu nunca havia experimentado antes. Cada vez que eu pensava nisso, a lembrança daquele dia horrendo voltava, como se estivesse acontecendo tudo de novo.
A revolta e o medo que eu senti naquele dia voltavam com força total, fazendo meu estômago revirar e meu coração acelerar.
Eu estava com medo, um medo tão profundo que parecia me consumir. Medo do que estava por vir, medo de estar grávida, medo de ter que enfrentar tudo isso sozinha. Medo de que minha mãe não acreditasse em mim.
A ideia de levar adiante uma gravidez, fruto de um ato tão terrível, era quase insuportável. Eu me sentia suja, violada, traída. E o pior de tudo era que cada vez que eu pensava na possibilidade de estar grávida, eu me lembrava daquele dia nojento.
Eu precisava ter certeza. Então, comprei um teste de gravidez na farmácia no caminho de volta do trabalho. O caminho até em casa pareceu mais longo do que o normal, cada passo carregado de ansiedade. Quando finalmente cheguei, trancada no banheiro, fiz o teste. Esperei os minutos mais longos da minha vida e então, lá estava ele: positivo.
Minhas suspeitas estavam corretas. Eu estava grávida. A notícia me deixou traumatizada. Eu era apenas uma garota, mal havia terminado os estudos e agora estava grávida devido a um ato terrível. A ideia de ter que carregar o filho do meu abusador me deixava aterrorizada.
Minha mente começou a girar. Como eu poderia estar grávida? E como eu poderia contar para minha mãe? Ela sempre foi muito rígida, com expectativas claras para o meu futuro. Ela sonhava que eu faria faculdade, teria uma carreira de sucesso. Uma gravidez agora, e do homem que acabou de abandonar ela, definitivamente não fazia parte desses planos.
Senti um nó na garganta e uma sensação de revolta tomou conta de mim. Minha mãe precisava saber, mas ela já estava tão machucada...
°°°
Esperei ansiosamente até que minha mãe voltasse do trabalho. Quando ela entrou em casa, exausta como sempre, eu entreguei o teste a ela. Ela olhou em silêncio, sua expressão passando da confusão para a compreensão e, finalmente, para a raiva.- Você sempre foi oferecida! - ela gritou, com os olhos cheios e raiva. - Sempre flertando com Miguel, sempre provocando!
Eu não podia acreditar no que estava ouvindo. Eu esperava por muitas reações, mas essa... essa eu não esperava. Minha mãe, a mulher que deveria me proteger, estava me culpando pelo que aconteceu.
- Nunca sequer pensei em flertar com o seu ex, mãe! Você trouxe um homem alcoolizado e desequilibrado para dentro desta casa, tudo porque você estava sedenta por um pouco de afeto. Como poderia achar que um homem assim seria fiel a você? A culpa é toda sua! - Eu gritei, sentindo a raiva pulsar em meu peito.
- Você sempre foi uma provocadora, usando esses shorts minúsculos só para tentar seduzi-lo - ela acusou, o dedo apontado para mim, o rosto contorcido pela ira.
- Eu vestia esses shorts muito antes de sequer conhecer esse seu ex detestável! E ele jamais se interessaria por mim, afinal de contas, você mesma vivia me chamando de feia! - retruquei, sentindo as lágrimas quentes escorrendo pelo meu rosto.
- De fato, como poderia sentir atração por uma menina gorda como você? Olhe para si mesma, mal consegue andar direito, sempre comendo sem parar. Sua culpa que eu nunca conseguia poupar o dinheiro que ganhava me prostituindo, porque você gastava tudo comprando fast food... às vezes me pergunto como pude gerar você no meu ventre - ela disse, o desprezo evidente em sua voz.
Eu não me abalei. Já estava acostumada com as palavras duras da minha mãe, já estava habituada a ser chamada de feia e gorda. Ainda assim, cada palavra dela era um golpe, um lembrete doloroso de que eu não era amada pela minha própria mãe.
Porém, o que realmente me chocou foi a defesa apaixonada que minha mãe fez do ex-namorado. Mesmo após tudo o que ele tinha feito, ela ainda o protegia. Aquilo era incompreensível, uma traição que doía mais do que qualquer palavra.
A sensação de traição e desespero me consumiu. A única pessoa que eu pensava que poderia contar estava me acusando. As lágrimas rolaram pelo meu rosto enquanto eu tentava processar a crueldade da situação. Naquele momento, eu nunca me senti tão perdida e sozinha.
- Você vai se livrar dessa criança, porque eu não vou te ajudar a criar - disse ela, friamente.
Depois disso, se virou e foi para o seu quarto, deixando-me sozinha com a minha dor e a minha confusão.
As palavras dela soaram como um julgamento final, como uma sentença cruel e desalmada. Meu coração bateu forte no peito, o desespero se apossando de mim.
Passei a noite em claro, as lágrimas constantes e silenciosas molhando meu travesseiro. A sensação de solidão era avassaladora. Me sentia como se estivesse em um pesadelo do qual não conseguia acordar.
E agora, eu carregava dentro de mim uma vida que não pedi, que não queria, mas que era impossível de tirar. O aborto não era legalizado onde morávamos. O meu desespero era palpável.
°°°
Nos dias seguintes, tentei buscar ajuda. Procurei por clínicas clandestinas, mas o medo de ser presa ou de algo dar errado me paralisava. A cada passo, sentia o olhar julgador da sociedade, sentia a culpa que não era minha, mas que todos pareciam querer jogar sobre mim.Eu estava sozinha, sem a ajuda da minha mãe. E, acima de tudo, estava apavorada. Apavorada pelo futuro, apavorada pela vida que crescia dentro de mim.
Minha vida virou um pesadelo. Nunca imaginei que meu futuro seria assim. Estou presa em um ciclo de medo e tristeza. Tenho medo do futuro, medo do bebê que cresce dentro de mim. Sinto que estou me tornando uma versão da minha mãe, uma mulher solitária e amargurada.
A luz da minha vida se apagou. Só resta escuridão e desespero. Não vejo saída para essa situação. Estou sozinha e perdida.
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AS LÁGRIMAS NUNCA VÃO PARAR DE CAIR
Fiksi RemajaEm meio a adversidades, essa é a história de superação de uma mulher. Sofrendo abusos na infância e marcada pela obesidade, ela desafia as circunstâncias e constrói uma nova vida. Ela encontra o amor verdadeiro e juntos, eles criam um lar feliz e am...