Capítulo 03 - (Re)Encontro

204 22 0
                                    

Erika

Entro na sala e percebo de cara o quanto é grande, com certeza tem uma vista privilegiada também. Acho que ao pôr do sol deve ser impressionante...

Acredito que a tal de Roberta Souza deva estar em sua cadeira, mas como está de costas, não consigo vê-la.

— Senhorita Santos — ela fala, virando a cadeira para frente.

— Caralho — penso alto, sem perceber, totalmente impressionada, mas acho que baixo o suficiente para ela não ouvir o que disse, pelo menos assim espero.

A mulher é simplesmente deslumbrante, acho que linda seria pouco.

— O que disse? — questiona, levantando a sobrancelha, me fazendo ficar um pouco intimidada, o que é bem raro de acontecer.

— Eu disse que me chamo Erika Santos.

— Eu sei, foi exatamente assim que lhe chamei.

Boa, primeira bola fora. Tento respirar profundamente para voltar à minha normalidade. Ela mexeu comigo de um jeito que não sei explicar, mas preciso voltar ao normal para fazer isso funcionar.

— Podemos começar quando quiser, senhora Souza — falo, já um pouco mais calma e concentrada.

Ela parece esperar por algo, mas não consigo compreender o que seja, então ela indica a cadeira à sua frente. Vou até lá.

A entrevista corre bem, as perguntas são aquelas mesmas já esperadas. Tudo flui e não cometo mais nenhuma besteira. Ela para de falar e fica encarando o meu currículo.

— Eu vou ser sincera com você, Santos, não costumo contratar advogados inexperientes. Todavia, achei que era o momento ideal para contratar alguém jovem que pudesse treinar e formar a sua base. Claramente, com intenção de mantê-lo aqui para que cresça e construa sua carreira conosco. Seria algo a longo prazo, certamente uma grande oportunidade, porém, irá exigir muito empenho e esforço. O que acha? Teria interesse em fazer parte do escritório?

— Com certeza! Pra mim seria uma honra poder trabalhar com a senhora, aprender cada vez mais com a prática, assim como auxiliar em tudo que puder, dando o meu máximo — digo, passando confiança.

— Ótimo — ela fala. — Você terá que ter em mente algumas coisas, se for realmente trabalhar aqui. Somos um grande escritório, e por isso, estamos sempre no foco da mídia. Devemos sempre zelar pela nossa imagem. Uma vida discreta, sem escândalos, se é que me entende. Qualquer coisa, por mínima que seja, pode prejudicar o nosso nome e isso eu não tolero de forma alguma. Além disso, pra mim, organização é fundamental, gosto de cada coisa no seu devido lugar, e com os meus processos não seria diferente. Ordem é tudo que quero, consegue compreender?

— Claro, sem problemas. Aliás, concordo completamente, discrição e organização são essenciais — minto na cara dura. Sim, pra mim tem problema, muitos inclusive, já que não costumo ser nada discreta e muito menos organizada, mas quero muito esse emprego, assim como quero sair correndo daqui agora mesmo.

Não sei o que essa mulher tem, mas me sinto um tanto quanto... pressionada? Que merda é essa?! Olho pra ela e posso jurar que vi um sorriso de canto, mas a sua expressão continua séria, como está desde que entrei. Deve ser delírio meu. Será que o álcool ainda tá fazendo efeito?

— Excelente, vejo que estamos na mesma página. Se for realmente do seu interesse, poderá começar amanhã mesmo. É só passar aqui, assinamos o contrato e você receberá todas as orientações — explica e mal posso acreditar que consegui!

— Agradeço imensamente, senhora, amanhã mesmo estarei aqui. Foi um prazer — ia levantar a mão para cumprimentá-la, mas ela logo fala, me fazendo parar.

— Foi um prazer — responde, em um tom que não consigo distinguir. — Já pode sair agora.

— Claro, com licença — digo, saindo da sala.

Roberta

Fico olhando ela sair e não consigo acreditar até agora o quanto a sua presença me impactou.

Sabia muito bem que ao longo desses anos, havia nutrido determinados sentimentos por ela, afinal, foi a pessoa que apareceu do nada e me salvou. E da mesma forma que apareceu, sumiu, é quase como se ela fosse algo místico...

Evidentemente que quando a localizei, passei a observá-la, e ela enfim, se tornou alguém concreto pra mim, mas assim pessoalmente, foi mais do que esperava.

Sabia que ela tinha se tornado uma linda mulher, porém, vê-la em minha frente foi surpreendentemente diferente do que imaginei, senti algo forte... algo? Meus deuses, a quem tô querendo enganar, senti atração por ela. Foi exatamente isso que senti, desde quando virei essa maldita cadeira e a olhei, a desejei como há muito não acontece.

Não esperava que fosse sentir algo assim por ela, mas foi o que aconteceu. Foi tão forte que quando vi que ela ia estender a mão pra mim, tratei de cortá-la naquele instante. Não saberia o que poderia acontecer se entrasse em um mínimo contato físico com ela.

De início, pensei que ela pudesse ter me reconhecido, porque ficou um tempo parada, com uma expressão que não consegui distinguir. Fiquei receosa, mas logo depois, percebi que ela não fazia ideia de quem eu era. Já imaginava, ela era nova na época, estava muito escuro e muitos anos se passaram.

Embora essa vaga tenha sido criada especificamente para ela, Erika me surpreendeu, realmente foi bem na entrevista. Muito embora já soubesse tudo sobre ela, até mesmo sei que mentiu sobre a discrição e organização. Sei que ela não é adepta a nenhuma delas, por isso, não consegui segurar um pequeno sorriso quando ela falou que eram coisas essenciais. Falou com tanta confiança que se eu não soubesse a verdade, teria acreditado.

Acho que conhecê-la melhor vai ser algo realmente interessante...

Vejo ela se afastar da minha sala e se aproximar de alguém que lhe dá um abraço. O que é isso? Tenho certeza que ela não conhece ninguém daqui. Como pode já estar tão íntima de alguém assim?

Fico olhando pra cena, inexplicavelmente, começando a ficar irritada. Reconheço a pessoa que está com ela, Letícia. Não é possível que ela esteja interessada em Erika, é? Conheço bem a sua fama...

Vejo que se despedem e Erika vai embora, então não perco tempo e chamo Letícia em minha sala.

— Me chamou? — ela pergunta.

— Obviamente — digo, sem paciência. — Já terminou de redigir aquele recurso?

— Sim, vou encaminhar agora mesmo pra senhora.

— Certo — ela ia se virando pra sair, mas falo novamente. — Espero que ainda se lembre das políticas desse escritório, Letícia.

Ela me olha confusa. Agora a engraçada tá se fazendo de sonsa...

— Sem relacionamentos entre funcionários. É uma política de extrema importância para que o âmbito pessoal dos meus advogados não interfira no âmbito profissional. Espero que entenda.

— Ah, claro, não precisa se preocupar — fala e se retira.

Mal sabe ela que estou muito mais do que preocupada. Nunca soube de nenhum caso dela aqui dentro, mas é melhor reforçar. Só era o que me faltava ter que lidar com mais essa.

Nem sei o motivo de ter ficado tão chateada, mas preciso manter o foco. A ideia é ajudar Erika a mudar de vida e a crescer na carreira, qualquer coisa que apareça no meio do caminho é só perda de tempo.


Continua...

Minha SalvadoraOnde histórias criam vida. Descubra agora