05: Coisas que nunca fiz.

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Serena

Acho que fiz alguma coisa errada. A Lena disse que na primeira oportunidade ele me beijaria, mas as oportunidades estão acabando. Tomo água na cozinha. Já comemos e eu ajudei a secar a louça enquanto ele lavava. Passo perto do sofá e o Elias está deitado nele, deve ser desconfortável passar a noite ali. Me aproximo, agachado perto dele ficando com o rosto na altura do seu.

— Elias? Pode dormir na cama comigo se quiser! — Ofereço de novo.

— Não, tudo bem, o sofá não é tão ruim assim! — Sorri tentando me tranquilizar.

— Porra, por que você não me escuta? — Solto sem perceber. Quando me acostumo com a pessoa falo palavrão sem perceber.

Ele arregala os olhos, chocado, cobre a boca:
— Você sabe falar palavrão?

— É claro que sei. — Ri levando na brincadeira. — Vai, dormi na cama comigo. Estou com medo de ficar no andar de cima sozinha!

— Ok, tive uma ideia. — Se senta no sofá. Levanto prontamente, todo ouvidos. Ele levanta também.

Empurra o sofá para o canto da parede. Afasta a mesa de centro também. Fico parada analisando e tentando entender. Sobe as escadas e trás o colchão de casal. Ponhe no chão, ajudo a arrumar o lençol animada. Subo correndo para buscar o travesseiro e o cobertor. Ele penso em tudo, até coloco o filme pra gente ver, o que faltava.

— Quer pipoca?

— Quero. — Me deito esperando, enquanto ele faz a pipoca. Pausa o filme antes de ir.

Olho ao redor sem saber de onde tirei coragem para ficar sozinha com um homem. Puxo a gola do moletom cheirando, tem o perfume dele. Sorriu como uma boba. Tenho que ficar mais séria, para ele não pensar que eu me apaixono fácil por qualquer um.

Quando estamos os dois juntos, a pipoca fica entre a gente, o que me incomoda. Ele apoia a pipoca na barriga, e me puxa para mais perto, com o braço em volta do meu ombro. Sorriu, me acomodo do seu lado melhor desejando que esse momento seja real. Nada pode estragar isso.

( … )

Tive que voltar à realidade mais rápido do que esperei. O final de semana passou muito rápido. Lena vem aqui para, segundo ela, saber tudo com detalhes. Sinto decepcioná-la, mas não fizemos nada de interessante.

Três batidas na porta me dizem que é ela.

— Entra. — Estou organizando os meus livros por falta do que fazer nas férias.

Ponhe a cabeleira loira com o famoso óculos em formato de coração entre a porta e o vão. Ela entra fechando a porta. Se espreguiça e se joga na minha cama.

— Casa de gente rica é outra história! — Zomba. — Ei, serve um caviar pra começar!

— Para, não tem graça. — Acabo rindo.

Ela se senta esperando. Finjo que não sei porque está me encarando. Vejo como cada livro ficaria melhor. Me viro para ela quando sinto que vai crescer um buraco na minha cabeça.

— Ok, não aconteceu nada, sem beijo, sem selinho, talvez um na testa de despedida. — Começo tirando suas esperanças.

— Tenho certeza que usei duas flechas, o que aconteceu com o meu poder? — Fita as próprias mãos confusa.

— Lena pela vigésima vez, você não é uma droga de cupido!

— Mas eu poderia ser! — Faz um bico inconformada.

Pego um dos meus coelhos de pelúcia da estante e atiro nela. Queria ter conhecido ela antes apesar da personalidade, mas as coisas nunca são como queremos. Deixo os livros de lado e me sento do seu lado. Conto quase tudo, menos a parte que peguei o moletom dele e foi estranho.

— … o café dele é muito âmago, juro. No domingo ele me mostrou o estúdio de tatuagem e perguntou se eu queria fazer uma. Ainda não decidi, mas tem que ser em um lugar escondido. — Termino de falar.

— Hum, eu posso ir também. O meu bombom vai estar lá? — Interroga.

— Não sei, posso pergunta.

— Ótimo. — Declara como se estivesse tudo certo para irmos. Mas não é tão simples assim, eu vou ser modelo e isso pode dar problema. — Mudando de assunto, já falou com seu pai sobre morar sozinha?

— Ainda não, primeiro quero provar que tenho estabilidade. —  Morar sozinha é algo que infelizmente não posso fazer só saindo de casa.

( … )

As vozes no andar de baixo tão para ouvir do outro lado da cidade. Minha irmã e as amigas planejando a sua festa de aniversário. Reviro os olhos só de ter que imaginar. Desço acompanhada pela Lena que coloco o fone no último para não ter que ouvir. Não temos a sorte dela ignorar a nossa presença.

— Ah, Serena, que bom que você finalmente resolveu sair do quarto, o que acha de participar da decoração e… — Ve-la é como encarar o espelho, um que tem vida própria e se mete na minha vida.

— Não, valeu.

Faço menção de andar.

— Qual é? Assim faz parecer que eu sou horrível por querer uma festa só pra mim. Eu sempre tento te incluir e você nunca quer…

Interrompo:
— Era o nosso dia especial, nosso, agora não é nada.

— Por favor, ainda pode ser especial! — Não há nada no seu tom além de sarcasmo, o que faz parecer maldosa, pelo menos para mim. — Você já me evito o final de semana todo.

— Nem tudo é sobre você, acontece que, que… — Me vejo ter o que dizer. Engulo em seco. — Eu estava com o meu namorado. — Minto, em seguida coro.

Lena tira os fones na hora, Selly abre a boca chocada, suas duas amigas também, até a minha amiga parece confusa. Me arrependo do que disse no instante que falo. Minhas mãos suam e só de pensar em como explicar um namorado que não existe, ou um que seja um ex-presidiário.

— Que namorado? — Estreita os olhos desconfiada. — Você passou a noite com ele? Como assim? O papai sabe?

— I-isso não é da sua conta, e eu ainda vou falar com o nosso pai. — Puxo a Lena pelo braço. A porta da frente parece uma boa direção.

Ando até a loja de conveniência mais próxima. Minha amiga não diz nada o que só me deixa mais nervosa. Começo a pensar que mentir não vai ajudar em nada e o Elias vai me odiar, ele é meu amigo e eu não quero estragar as coisas. Ele quer ir com calma, então estou fazendo como ele quer, mas isso meio que apressa um pouco as coisas.

Lena para antes de chegarmos a lojinha:
— Espera um pouco, o que foi aquilo?

— Não sei, eu nunca menti. O que eu faço?

Obscura ilusão.Onde histórias criam vida. Descubra agora