22 | Só não somos bons um para o outro

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Pela primeira vez desde que se entendia por gente, Cassian sentiu que o café tinha um cheiro amargo.

Sentado na mesa de jantar sozinho, ele sentia o peso de uma noite mal dormida. Fazia um certo tempo desde que ele dormiu sozinho e sabia que não era a solidão que o incomodava. Era uma ausência bem específica. 

Com o silêncio ensurdecedor do ambiente, Cassian conseguiu ouvir os resquícios da movimentação no andar de cima. Catrin provavelmente já estaria acordada considerando a hora. Nestha provavelmente estava fazendo o café delas enquanto Catrin a convencia a tomar o café na sala em frente à TV. Ele ouviu mais alguns passos e deu uma risada ao perceber que algo caía e alguns móveis se arrastavam, o que não era incomum pois Catrin era desastrada com sono. Ele mesmo tivera que repor algumas canecas que ela quebrou sem querer, porque aparentemente ela já era menina grande para tomar em copos plásticos. 

Ele supôs que Catrin venceu porque repentinamente tudo ficou silencioso. Estranhamente silencioso. Quase como se tivessem voltado a dormir. 

Pensar nelas doía. Ele queria estar lá. Sentia um desperdício de tempo enorme ficar ali, principalmente porque conhecendo Lucy, aquilo viraria um conflito maior do que ele estava com paciência para lidar. Queria estar em seu café da manhã, acordando com elas, mesmo que Catrin ainda achasse que ele dormia na própria casa quando na verdade ele só fingia estar chegando. Nestha até tinha parado de reclamar com ela quando surgia qualquer sugestão sobre um namorado um um pai. Como se estivesse preparando terreno.

E aquilo deixava ele mais ansioso e animado do que ele esboçava. 

Um barulho chamou sua atenção e só então ele percebeu que Lucy havia acordado. Seu cabelo estava amassado e o olhar confuso enquanto ela se desvencilhava dos cobertores e se levantava analisando seu entorno. 

Em uma outra época, ela teria reclamado das cortinas. Teria reclamado das pinturas feitas pela mão dele, a luminária, e Deus sabe que até a manta do sofá seria motivo de discussão.

A expressão de espanto dela ao ver Cassian foi resposta o suficiente para o quanto ela provavelmente tinha bebido. A passos tortos e com a mão na cabeça e olhos cerrados ela se aproximou na mesa, visivelmente lutando para se manter de pé.

— São como búfalos na minha cabeça — ela sibilou, sentando-se na cadeira em frente 
á dele.

Cassian apenas suspirou, colocando uma caneca cheia de café preto na frente dela enquanto a encarava.

Tudo estava errado, até aquela xícara de café. Sem Nestha e Catrin ali, tudo parecia simplesmente errado.

— Se eu... se eu estou em sua casa isso significa que ontem eu....

Ele deu de ombros. 

— Merda, eu tinha esperança de que tivesse sido um sonho estranho. Não sei nem o que dizer eu.. — ela toou um gole fundo de café sob o olhar analítico dele, respirando fundo e negando com a cabeça — eu sinto muito. Muito mesmo.

Cassian não conseguiu esconder a expressão surpresa ao encará-la. Lucy nunca se desculpava. Nunca.

— Você deu um show completamente desnecessário, Lucy. O que foi que aconteceu?

Foi a primeira palavra dele pra ela desde que se encontraram. Nem mesmo na noite anterior ele havia dito nada, não quando percebeu que era inútil falar com alguém completamente fora das próprias faculdades mentais.

Ela tomou outro gole de café, tomando uma aspirina que ele deixou em um pires.

— Você não me atendeu ou me respondeu. Estou há semanas tentando falar com você.

Honey | NessianOnde histórias criam vida. Descubra agora