24 | Isso não é discutível

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Eu nunca fui um cara temperamental. 

Ao longo dos anos, até mesmo Az teve mais problemas com raiva do que eu. Foram poucas as vezes que me envolvi em brigas na faculdade e de um modo geral, é muito difícil que alguém consiga me estressar a ponto de realmente virar uma briga. Considerando as diversas vezes que quis voar no pescoço de alguém no tribunal e não o fiz, posso dizer que sou um homem de emoções controladas e zero problemas com raiva. Ou era, pelo menos.

Eu achava que conhecia o que era sentir raiva, ódio de alguém. Achava que tinha odiado Lucy por um tempo, Az por ser um portão impossível de abrir e até mesmo Rhys em sua fase adolescente. Mas nada, em toda a minha vida, me preparou para aquilo. Para o que era sentir tanta raiva a ponto de esquecer de si mesmo.

Não vou conseguir nunca esquecer a expressão de Catrin, os olhos vítreos e inexpressivos ao bater em minha porta. Acho que minha mamãe morreu. Aquelas palavras gelaram meu sangue e sugaram meu mundo temporariamente. Eu fui criado para ser forte e centrado, mas naquele momento, foi quando entendi o que meu pai queria dizer que as vezes precisamos tirar forças de onde não tínhamos. Eu achei que isso tinha sido uma menção precoce ao meu divórcio, mas só naquele momento consegui entender o que era medo e ódio genuínos.

Eu não lembro de muita coisa, para ser honesto.

Lembro de pegar Catrin e carregar ela escada acima. Ver Nestha no chão ensanguentada e tão não viva foi um tipo diferente de medo, o tipo irracional. O que me lembro é de quando perguntei para Catrin se Thomas tinha feito isso e ela apenas assentiu com a cabeça. Eu ainda precisava entender como diabos Catrin sabia quem ele era, mas isso ficou pra depois. Eu lembro de me abaixar com cautela e chamar o nome dela enquanto Lucy chamava uma ambulância. Lembro de ligar para Rhysand aos berros e contar o que aconteceu e mandar ele nos encontrar no hospital. Lembro de levar Catrin comigo até lá e de vê-la chorar quando disse que precisava sair. 

Eu fui até o inferno atrás de Thomas. Liguei para Devlon feito um louco e exigi que ele acionasse seus contatos na polícia. Eu não contava com a sorte de que Thomas já estava detido por dirigir sob o efeito de drogas, e muito menos que ele seria burro a ponto de tentar fugir. 

Quando o investigador ligou e disse o que tinha acontecido, eu chorei de alívio. 

Ver Nestha naquela situação acabou com partes substanciais de mim. Em primeiro lugar: ela podia ter me chamado. Em segundo lugar: se eu tivesse atendido Lucy antes, Nestha provavelmente estaria comigo e ele jamais teria chegado perto dela. E em terceiro mas definitivamente não menos importante: eu não sei o quanto aquilo tudo roubou de Catrin. Isso somado à ausência de sua mãe foi como um coquetel de pesadelos que pareciam que nunca acabariam. 

Quando Feyre me ligou e disse que ela tinha acordado eu hiperventilei. Pedi a Gwyneth que arrumasse Catrin pois eu quem levaria ela. Nos dias que sucederam o incidente, percebi o quanto a garotinha importava pra mim. Nada no mundo doeu tanto quanto vê-la silenciosa e triste, quase assustada. E quando peguei ela para levar ao hospital, vi as manchas da ansiedade em ver sua mãe, como se precisasse dela pra existir. 

Ao chegarmos, o espaço entre a recepção e o quarto nao tinha fim. E quando ela gritou ao ver Nestha, percebi que tudo que eu precisava estava ali dentro daquelas quatro paredes.

Catrin chorou pelo que pareceu uma hora inteira. Ela se agarrou à mãe tanto quando Nestha se agarrou nela, enquanto as duas choravam silenciosamente em um abraço que parecia ser o primeiro e último entre elas. Me sentei no sofá ao lado da cama, observando com o estômago embrulhado àquela cena, respeitando o espaço delas mas completamente impossibilitado de me afastar.

Quando Catrin finalmente se acalmou ela adormeceu silenciosamente no colo de Nestha, abraçada à mãe finalmente de volta ao lar.

Nestha era uma bagunça, e olhar pra ela causava dor física em mim. Ela estava com o rosto levemente inchado, diversos fios saindo de dentro o pijama hospitalar. A postura estava estranha, provavelmente tentando evitar muito contato com a região em que tomou pontos e quebrou a costela.

Honey | NessianOnde histórias criam vida. Descubra agora