Capítulo 19

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Paro de correr apenas quando chego na beira de um riacho, e sem folego me sento no gramado e encaro a água seguir sua direção, acalmando a minha respiração. Olho para a minha mão.

- Espero não ter machucado Kayden. - Falo para mim mesma.

- Não se preocupe com isso criança.

- Leonic. - Falo seu nome.

- Você se lembrou, princesa.

- As coisas estão começando a fazer sentido.

- Tenha calma quanto a isso.

- Você sabia desde o início quem eu era.

- Eu jamais esqueceria de você, quando Pearlie me avisou que havia visto alguém muito parecida com a Rainha Astara quando jovem eu precisei me certificar.

- Pearlie também me reconheceu então.

- Ela ficou na dúvida, venho procurando por você desde quando sumiu por todo esse mundo, até em lugares impossíveis.

- Eu não entendo o que está acontecendo comigo. Primeiro os sonhos e agora eu quase machuquei alguém.

- Me conte do começo, onde você estava?

- No castelo?

- Antes de vim parar aqui. - O mesmo fala com humor.

- Los Angeles. No orfanato.

- Está explicado o porque de eu não estar te encontrando em lugar algum, Agnes a levou para outro mundo.

- Agnes? Ela é daqui?

- Ela era o braço direito de sua mãe, uma mítica.

- Ela nunca me disse...

- Ela não poderia dizer nada. - Ele se senta ao meu lado.

- Leonic, por favor não seja vago comigo também. - Peço.

- Agnes deveria apenas lhe proteger e a manter longe daqui, já que estava em outro mundo.

- Ela fez o que pôde, vim parar aqui por um acidente.

- Ou seria apenas o destino.

- Então em que acredita?

- De verdade eu não sei mais no que acreditar, estou me sentindo perdida, se aqui é onde nasci porque não me sinto assim?

- Seu coração está em outro lugar.

- O último pedido de Astara foi lhe manter segura, se veio parar aqui mesmo por acidente, é para você estar aqui de algum modo.

- Um propósito?

- Pode ser, ou apenas a verdade, o que você mais deseja de todos. - Ficamos um pouco em silêncio. - Eu vi e ouvi o que aconteceu. Seu poder está reprimido.

- Desde quando cheguei aqui, tenho sonhos... Lembranças que eu não sabia que existiam, eu não lembrava de nada da minha infância, agora tudo que lembro são fragmentos embaralhados. Bom meio em ordem.

- A magia na Terra é fraca, quando chegou aqui começou a ter lembranças e seu poder está pedindo para sair, por isso explodiu daquela maneira. Tudo aqui tem magia, até mesmo o ar que sopra contém um pouco de magia e nisso foi desencadeando aos poucos. - Uma pausa. - Agnes deve ter bloqueado suas memórias e poderes para protegê-la, e agora por conta de toda a magia em Bellmoor você está recuperando tudo que foi bloqueado.

- Kayden e Serafyna sabem o que sou? Para mim eu era apenas uma humana em um mundo diferente.

- Todos que a vê desconfiam, nunca encontramos vestígios de sua morte, então sempre tivemos uma esperança que estava viva em algum lugar. E olhe por si só, o ferimento em seu ombro cicatrizou assim que seu poder se manifestou.

Olhei para o meu ombro e percebi que o sangue que havia manchado a roupa era o que restava do corte, ele estava totalmente cicatrizado, deixando apenas uma linha fina pequena. Continuei.

- Se são lembranças do meu passado... Tive uma lembrança ontem que Bryant dizia ser meu pai, isso é verdade? - Estava torcendo para que dissesse que não.

- Quem é o seu pai foi mantido segredo até mesmo de mim.

- Tenho uma lembrança que minha... Astara dizia que meu pai queria roubar o meu poder para si e, pelo que Kayden me contou e mostrou sobre a antiga Bellmoor, as ruinas que me leva a acreditar que sim, mesmo não querendo acreditar.

- Só saberemos mesmo quando todas as suas memorias forem desbloqueadas e isso tem que ser o mais rápido possível.

- E como faremos isso?

- Os míticos, Agnes é uma mítica, se ela sozinha conseguiu bloquear tudo, eles devem conseguir fazer algo para reverter. Se continuar reprimindo seus poderes e suas memórias só os deuses sabem o que pode acontecer se você explodir novamente.

- Quando podemos ir até lá?

- Preciso ir falar com eles antes, vocês só conseguirão chegar próximo com a autorização do grupo, eles são bem reservados, mas vão me ouvir.

- Vocês? - Me viro ao escutar os passos entre as folhas secas e Kayden se aproximava em sua forma animal, a pantera gigante de olhos dourados.

Ele se aproxima com receio, uma pata de cada vez devagar, sem emitir mais nenhum som, ainda na sua forma de pantera senta ao lado de Leonic.

Um silêncio leve se instala, ficamos apenas sentados ali, eu ainda encarava a água corrente do riacho, fico enrolando uma grama que puxei do solo entre o dedo indicador e o médio. Aproveito o som da natureza, fecho os olhos e viro meu rosto em direção ao céu, apenas sentindo o ar fresco passar por mim.

Fico assim durante alguns minutos, aproveitando e absorvendo tudo que aconteceu, as coisas que Leonic me disse. Então não eram sonhos e sim minhas próprias lembranças.

Quando abro os olhos novamente Leonic não estava mais sentado ao meu lado, porém Kayden se manteve imóvel, ainda do mesmo jeito de quando chegou. Eu o olho de soslaio, evitando o contato visual direto.

- Me desculpa pelo que fiz. - Minha voz sai como um sussurro, ele vira o rosto para mim. - Se te machuquei. - Como ele não diz nada eu continuo a falar. - Eu nunca imaginaria que... Você pode voltar na sua forma humana? - Eu não sabia o que pensar ou o que dizer.

- Não consigo. - Ele responde na minha cabeça. - Depois que você me lançou para longe, transformei e não consegui voltar, sei que quer um tempo para você, não queria a incomodar só vim por causa disso mesmo, assim que me fizer voltar ao normal eu vou embora. - Sua voz parecia tensa, estava chateado.

- Eu não sei como fiz isso, muito menos sei como desfazer. - Respondo olhando em seus olhos e em voz alta.

- Vou procurar outro jeito então. - Ele se levanta e começa a ir embora em direção as arvores com a cabeça baixa.

Senti um aperto no coração, ele desde o início esteve ao meu lado me ajudando de todas as maneiras e por um surto dele eu resolvo surtar também e além de descontar a raiva e tudo que estou sentindo nos guardas no treino eu acabo fazendo isso com ele, sem mesmo ser intencional, posso não ter machucado ele fisicamente, mas, acabei deixando o mesmo preso em sua forma de pantera.

- Kayden espera. - Ele para sem se virar. - Não sei o que fazer. - Fico a sua frente, sinto sua respiração silenciosa. Ele dá um passo para frente. - Me desculpa pelo que fiz. - Sem esperar uma resposta eu o abraço.

Envolvo meus braços em torno de seu pescoço, sinto o pelo macio e aperto um pouco dando um passo a mais para frente, sinto ele escorar sua cabeça em meu pescoço, quando percebo estou chorando por tudo novamente.

- Estou com medo de tudo que pode vim a acontecer, sei que ouviu a conversa que tive com Leonic, senti seu cheiro com o vento. - Falei entre o choro.

Sinto minha pele formigar e Kayden volta a sua forma, me abraçando de volta, ele passa as mãos em meus cabelos se afastando, leva as duas mãos ao meu rosto e segura o mesmo.

- Está tudo bem... - Ele me beija, lento e o gosto das minhas lagrimas se mistura ao beijo. Desta vez foi um beijo delicado. - Vai ficar tudo bem, princesa, estou do seu lado.

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