Capítulo XXXIII. Mago de fogo

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I.

A tristeza de Izuku é algo que dá pra sentir de longe. É grande e cruel, tipo uma onda que bate numa praia calma, do nada. Ela aparece nos olhos dele, e foi a primeira coisa que Katsuki notou na primeira vez que o viu. Por isso, quando as águas se agitam, tensas e desesperadas, ele percebe logo.

Ela tá lá nos olhos verdes de Izuku, e, como sempre, Katsuki fica impressionado. Os olhos enormes de Izuku não conseguem esconder nada; são completamente transparentes. Fazem muitas luas e várias estações desde que Mina falou pra Katsuki que Izuku era o herdeiro perfeito, e talvez até tivesse dado sorte por ter sido afastado desse papel, porque reis bons não costumam durar muito. Katsuki não lembra das palavras exatas, mas agora, ao olhar nos olhos de Izuku, ele entende de novo por que o príncipe teria tempos difíceis como rei. Mesmo quando tenta manter uma postura firme, como agora, algo nele o entrega.

Katsuki teve que segui-lo até seus aposentos depois de saírem da biblioteca. Izuku não parou nenhum momento. Agora estão lá, na salinha, cercados pelos livros de Izuku que ainda estão guardados no sul.

—Izuku —chama.

Mas o nome dele, por maior que seja nos lábios de Katsuki, não consegue expressar tudo o que ele sente.

—Izuku —ele insiste, porque o príncipe abaixa a cabeça.

Ele não chora; está tentando, talvez, organizar os pensamentos. Pôr em ordem as palavras do Profeta e a raiva que Katsuki segurou com muita dificuldade —se estivessem em outro lugar, ele teria gritado até estourar os tímpanos de alguém.

—Olha pra mim —pede o Rei Bárbaro. E, por causa dos velhos tempos, quando Izuku chegou ao seu palácio e passou dias e noites irritando Katsuki com a mesma pergunta, dessa vez, ele responde sem nem precisar que ela seja feita—: Não é uma ordem.

Izuku dá um sorriso de canto. Ele olha pra Katsuki.

—Minha mãe dizia que, no fim das contas, não importa quais sejam os seus desejos, só dá pra tentar fazer o melhor possível —diz Katsuki— porque todo mundo vai querer te dizer que o melhor possível pra eles é diferente. —Outra lição aprendida com muitos cascudos na nuca. Ele não pode dizer que sente falta, mas são parte da imagem que tem de Mitsuki—. A gente nunca falou disso, mas... —ele hesita, porque tá faltando palavra certa. Às vezes isso acontece, porque ele gosta de ser direto, sem rodeios—. Mesmo se você tivesse escolhido ser rei e acabar com a guerra assim, eu teria aceitado. Também. Qualquer coisa que você decidisse, eu ainda te amaria, porque eu amo a pessoa, não o título.

—Obrigado.

Mas ainda tem uma dúvida em Katsuki, algo escondido no olhar de Izuku e nas palavras do feiticeiro. Ele não sabe como colocar isso em palavras, como trazer essa dúvida ao mundo. Talvez as palavras do Profeta, Mirai Sasaki, tenham ajudado a formar essa pergunta.

Ele morde a língua por um momento e então decide que não adianta evitar o assunto.

—Izuku, tenho uma pergunta. —O príncipe olha pra ele, e Katsuki se joga no abismo—: Você escolheu isso por causa de...?

—Não! —Izuku o interrompe, como se o que Katsuki sugeriu fosse absurdo—. Não! Não foi por você! Talvez o fato de eu não ser rei facilite as coisas, mas não foi por você. Tem... tem uma música. É antiga. Talvez ela explique melhor do que eu... —Ele olha pra Katsuki, e por entre a tristeza de seus olhos, há uma pitada de desespero—. Como você pode pensar que...?

—Foi uma pergunta idiota —admite Katsuki. O silêncio paira entre eles até que Katsuki, movido pela curiosidade, pergunta—. Qual é a música?

—Fala sobre um homem bom que foi pra guerra. Fala de como os horrores acontecem quando um homem bom vai pra guerra. A luz vai embora, porque não sobra esperança. A amizade se quebra, o amor acaba. —Izuku olha pra um ponto aleatório na parede. Seus olhos começam a encher de lágrimas—. Eu não lembrava. Os bardos cantam, os soldados sempre pedem essa música. Quando eu abdiquei, achei que seria melhor buscar justiça em outros lugares que não fossem o trono que observa de cima. Você e o resto dos bárbaros estão no mesmo nível, Kacchan. Você sabe que aqui não é assim, e a única coisa que eu podia fazer pra mudar algo era destruir esse trono.

Olhos verdes, olhos vermelhos (BAKUDEKU-Tradução)Onde histórias criam vida. Descubra agora