Os dias se passaram como uma brisa leve, trazendo consigo um novo ciclo. Não era como se os problemas tivessem evaporado, mas eu sentia que, pela primeira vez em muito tempo, havia uma chance real de recomeçar. Acordei cedo, como sempre, com o som suave da respiração de Arthur ao meu lado – ou, devo dizer, Igor. Ainda me soava estranho chamá-lo por esse novo nome, mas era necessário. Eu era Stela agora. Uma nova mulher, com uma nova vida.
Nos primeiros dias, Igor esteve quieto, introspectivo de uma maneira que eu não esperava. Ele, normalmente tão ativo e curioso, parecia desligado do mundo. Quando ele teve febre, quase entrei em pânico. Levei-o ao médico da cidade, uma senhora com mais de sessenta anos e uma voz doce, que acalmou meu coração. Ela o examinou com cuidado, mas no final me disse algo que eu já temia: "Ele não tem nada físico, minha querida. Isso deve ser emocional."
Será que ele sentia saudades de Gabriel? A pergunta ressoou na minha mente por dias. Será que, assim como eu, ele também guardava lembranças do homem que, mesmo sendo um babaca comigo, foi quase um pai para ele? Gabriel... Apesar de tudo o que aconteceu entre nós, não posso negar que, com Arthur, ele sempre foi atencioso, amoroso e protetor. Parecia genuinamente preocupado com ele, quase como se fosse seu próprio filho. Droga.
Mas os dias foram passando, e Arthur — ou Igor — começou a se acostumar. Aos poucos, vi o brilho nos olhos dele voltar. Começou a brincar mais, a sorrir, a interagir com as pessoas ao nosso redor. O novo nome ainda não soava natural para ele, assim como não soava para mim, mas era necessário. Precisávamos desaparecer. Rafael podia estar por aí, e a última coisa que eu queria era que ele encontrasse a nós dois.
Gostamos demais deste lugar. É aconchegante. Pequeno, mas cheio de vida. As pessoas aqui são... diferentes. Me trataram com uma gentileza que há tempos eu não sabia que ainda existia. Sabe aquele tipo de vizinho que compartilha o pão que acabou de sair do forno, ou aquela compota de frutas que eles próprios fizeram? Sim, esse é o tipo de lugar que encontramos. E Arthur — quer dizer, Igor — logo se tornou o xodó da cidade. Todos o adoram, e ele parece estar finalmente se ajustando à nossa nova realidade.
Os primeiros dias foram dedicados a ele. Enquanto Igor ainda estava se recuperando, eu não tinha cabeça para pensar em abrir um negócio, mas agora que ele está melhor, finalmente posso focar em algo para nós dois. Um novo futuro. Algo para manter minha mente ocupada e garantir que nunca mais dependerei de ninguém para sustentar a nossa vida.
Foi assim que surgiu a ideia da sorveteria. Uma sorveteria com um playground para crianças. A cidade é pequena, mas cheia de famílias. Imaginei um lugar onde as crianças pudessem brincar enquanto os pais relaxam com um sorvete artesanal. Um espaço para todos. Eu já conseguia ver o sorriso das crianças correndo, Igor brincando no escorregador, e eu atrás do balcão, cuidando de tudo. O dinheiro que peguei de Gabriel me proporcionou essa possibilidade. Eu sabia que era o certo a fazer — usar aquele dinheiro para criar algo que realmente significasse liberdade.
Enquanto montava os detalhes do negócio, comecei a organizar a casa também. Os móveis novos trouxeram uma sensação de lar que eu não tinha sentido desde que saí da mansão de Gabriel. Comprei uma nova mesa, um sofá confortável, e mandei arrumar as cercas do jardim. A casa, que antes parecia um refúgio provisório, começava a tomar forma como nosso lar. Mandei instalar câmeras discretas nas áreas externas. Os vizinhos estranharam, claro. Aqui, segurança não é uma grande preocupação. "A cidade é tranquila, querida. Não temos crimes por aqui", me disseram. E eu sorri, agradecendo, mas sabendo que, para mim, o perigo ainda estava lá fora, rondando como uma sombra.
Rafael poderia estar me procurando. Mesmo que o passado estivesse começando a se distanciar, ele ainda era uma ameaça real. E, apesar de todos os meus esforços para me afastar, para esquecer, uma parte de mim ainda se perguntava sobre Gabriel. Será que ele estava bem? Provavelmente, sim. Com aquela mulher... Aquela imagem insistia em aparecer na minha mente, me lembrando de que eu fiz a escolha certa ao partir. O Gabriel que eu conheci estava distante, frio. Eu não podia me permitir fraquejar agora.
Igor agora tinha uma cuidadora enquanto eu organizava os últimos detalhes da sorveteria. Nina, uma menina de 17 anos, apareceu em nossas vidas como um anjo. Responsável, cuidadosa e, acima de tudo, carinhosa com Igor. Ela o tratava com tanta atenção que me fazia sentir mais segura em deixá-lo, mesmo que por algumas horas, enquanto corria atrás dos preparativos. Saber que ele estava em boas mãos me dava a paz que eu tanto precisava.
Os dias seguiam tranquilos, e a cada manhã, eu sentia mais firmeza em nossos passos. Essa nova vida, essa nova identidade, era o que eu sempre quis: paz. Ninguém me julgava, ninguém me questionava sobre o passado. Aqui, eu era apenas Stela, uma mulher nova, mãe de Igor, que estava começando de novo. Sem humilhações, sem medo.
A sorveteria estava quase pronta. Eu já conseguia imaginar as cores, o cheiro doce de sorvete no ar, as risadas das crianças e o som suave da música no ambiente. Era isso que eu queria: um lugar onde famílias pudessem relaxar e se sentir em casa. Eu mesma tinha desenhado o playground e planejado cada detalhe do espaço. Quando olho para trás, tudo o que passamos me parece um pesadelo distante. Aqui, agora, estava criando algo para mim, para nós. E isso era tudo o que importava.
À noite, quando coloco Igor para dormir, ainda agradeço a Deus por essa paz que encontramos. Talvez o passado nunca desapareça completamente, mas, por ora, estamos seguros. E felizes. Que seja assim, para sempre.
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REFÚGIO PROIBIDO
Romantizm🚫MAIORES DE 18 ANOS Refúgio Proibido mergulha na tumultuada vida de Sofia, uma jovem mãe determinada a escapar de um relacionamento abusivo, levando seu pequeno filho, Arthur, em uma fuga desesperada. O destino a leva a uma mansão misteriosa, habi...