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A noite em Los Angeles estava em seu auge no Rainbow Pulse, o clube LGBTQIA+ mais badalado da cidade. Dulce Maria, uma jovem de 24 anos, finalmente estava prestes a começar sua residência no prestigiado Cedars-Sinai Medical Center, e seus amigos Ucker e Christian não pouparam esforços para tirá-la de casa e comemorar essa nova fase de sua vida. Entre luzes neon, drinks coloridos e música alta, Dulce tentava se desligar da pressão que estava por vir.

A pista de dança era um turbilhão de corpos e energia. Dulce, com sua jaqueta de couro e sorriso travesso, sentia-se no seu elemento. Com seus amigos ao lado, tudo parecia mais leve. Foi quando seus olhos capturaram algo – ou melhor, alguém. Do outro lado da pista, uma mulher loira, extremamente elegante, destacava-se da multidão. Ela era diferente, carregava um magnetismo que Dulce não conseguia ignorar. Havia uma confiança impenetrável em seu olhar, algo que instantaneamente chamou a atenção da ruiva.

Anahí sentiu o olhar de Dulce antes mesmo de encontrá-la. Em meio à confusão de luzes e música, foi como se o ambiente tivesse desacelerado quando seus olhares se cruzaram. Algo na intensidade do olhar de Dulce fez com que Anahí se sentisse exposta de uma forma que não acontecia há muito tempo. Ela, que sempre controlava tudo e todos ao seu redor, sentiu uma faísca que a deixou desconcertada. Mas se havia algo que Anahí sabia fazer, era mascarar suas emoções. Um leve sorriso enigmático surgiu em seus lábios.

— Eu não consigo parar de te olhar — disse Dulce, com sua habitual confiança, ao se aproximar.

— E quem disse que eu queria que você parasse? — respondeu Anahí, sem desviar o olhar.

A tensão entre elas era palpável. Logo, a dança se tornou um jogo de provocações e desejo, até que a noite as levou para o apartamento de Dulce. As roupas foram esquecidas pelo caminho, e o que começou como uma brincadeira de flerte rapidamente se transformou em algo mais intenso. Elas passaram a noite juntas, e enquanto os toques eram carregados de paixão, havia algo que as duas não queriam admitir: aquilo não seria apenas uma aventura passageira.

Na manhã seguinte, Anahí despertou com a luz do sol filtrando pelas cortinas. O corpo ao lado, ainda adormecido, era inegavelmente belo e o perfume da noite anterior ainda impregnava o ar. Mas Anahí sentiu um nó no estômago. Seu lado racional gritava que aquilo não deveria ter acontecido, e a confusão interna começava a crescer. Ela, a renomada Dra. Anahí Puente, uma das cirurgiãs mais exigentes de Los Angeles, não podia se permitir esse tipo de distração, ainda mais com uma completa desconhecida.

Sem pensar muito, Anahí se vestiu rapidamente, tentando não acordar Dulce. A culpa a atormentava enquanto ela saía do apartamento e voltava correndo para a rotina que sempre a confortava: o hospital.

Horas depois, Dulce Maria, recém-chegada ao Cedars-Sinai, não fazia ideia da surpresa que a aguardava. Junto a um grupo de outros residentes, ela entrou no hospital ansiosa, embora ainda carregando na mente as memórias daquela noite. A confiança que a acompanhava a cada passo vacilou quando ela entrou na sala de reuniões.

Anahí estava lá. Perfeita em seu jaleco branco, o cabelo preso de maneira impecável, e com uma expressão que parecia feita de gelo. Dulce sentiu o coração parar por um momento. O choque foi mútuo, mas enquanto Dulce tentava processar tudo, Anahí mascarou suas emoções com a frieza que havia se tornado sua armadura.

— Esta é a Dra. Anahí Puente, nossa chefe de cirurgia — anunciou o chefe da equipe, alheio à tensão que crescia na sala.

Os pensamentos de Anahí eram um caos. Ela está aqui. Ela está aqui no meu hospital. Droga, o que fiz? Sentia uma mistura desconfortável de arrependimento, desejo e medo. Mas nada disso poderia transparecer. Por isso, se agarrou à única coisa que sabia fazer bem: ser severa.

— Espero que todos estejam prontos para dar seu melhor — disse ela, com a voz firme. — Não aceito erros. E não espero nada menos do que perfeição.

Anahí fez questão de ignorar Dulce, mantendo a postura rígida e exigente durante todo o dia. Cada interação com a ruiva era uma oportunidade de mostrar que nada havia acontecido entre elas, que a noite anterior não importava. Mas, internamente, ela estava à beira de perder o controle. Os flashes daquela noite vinham à tona a cada vez que seus olhares se cruzavam, e isso a irritava profundamente.

Para Dulce, a mudança brusca de comportamento era tão confusa quanto irritante. Ela via a forma rígida como Anahí a tratava, e a frieza constante começava a lhe incomodar. No fim do turno, quando Anahí estava prestes a sair de uma das salas de consultas, Dulce aproveitou o momento para agir.

— Dra. Puente, podemos conversar? — disse Dulce, com uma voz firme que fez Anahí parar.

Sem dar tempo para resposta, Dulce a puxou para dentro do consultório e fechou a porta atrás delas.

— Olha, você não precisa agir desse jeito, tá? — disse Dulce, cruzando os braços, seus olhos faiscando com um misto de raiva e provocação. — Foi só uma noite, e nem foi tão boa assim, pra ser honesta.

Anahí congelou. Aquela provocação fez seu sangue ferver de raiva, mas também acendeu algo que ela não conseguia explicar. A provocação de Dulce, o sarcasmo, a forma como ela a desafiava... tudo aquilo a deixava mais irritada, mas também a fazia sentir um desejo incontrolável.

— Não foi boa? — Anahí repetiu, com uma risada curta e fria, tentando esconder a pontada de orgulho ferido. — Então, isso significa que não vai se importar se eu te tratar como qualquer outra residente incompetente, certo?

Dulce ergueu uma sobrancelha, percebendo o impacto que suas palavras haviam causado. Ela sabia que havia atingido Anahí em seu ponto fraco, e por mais que fosse uma luta perigosa, Dulce adorava esse jogo de poder.

— Exatamente — respondeu Dulce, desafiadora. — Mas, sinceramente, você não precisa exagerar.

Anahí sentiu o controle escorregar por entre seus dedos. O sorriso irônico de Dulce fazia sua mente entrar em conflito com seus desejos, e isso a deixava mais determinada a manter a postura de chefe implacável. Ela se aproximou da ruiva, parando tão perto que Dulce pôde sentir sua respiração.

— Eu decido o que preciso ou não fazer, Dra. Maria — sussurrou Anahí, sua voz fria, mas com um brilho de raiva e algo mais profundo em seus olhos.

Com isso, Anahí saiu da sala, deixando Dulce sozinha, com o coração disparado.


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