Vinte e Quatro

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A porta do porão se abriu com um rangido agudo, e a luz fraca da lâmpada pendurada no teto iluminou a figura de Alfonso, que entrava com um sorriso sádico estampado no rosto. Ele se aproximou de Dulce, que estava amarrada à cadeira, os olhos vermelhos de tanto chorar e a mente repleta de pensamentos aterradores. Ao seu lado, Maite e Christian, de máscara, observavam a cena com uma satisfação perturbadora.

— Ah, Dulce Maria! — começou Alfonso, puxando uma cadeira e sentando-se de forma despreocupada, como se estivesse em uma conversa trivial em um café. — Que reviravolta, não? Estava tão perto de tudo, e agora você se encontra aqui, tão vulnerável e... impotente.

Dulce o encarou, sentindo um frio na espinha. O que ele estava planejando?

— Você deve estar se perguntando por que eu faço isso — continuou Alfonso, cruzando os braços. — Deixe-me te contar uma história. Quando eu era estudante de medicina, eu sonhava em fazer a diferença, salvar vidas, ajudar as pessoas. Mas logo percebi que o mundo real é mais complexo. A verdade é que, no fundo, tudo se resume a dinheiro e poder.

Ele se inclinou para frente, como se estivesse compartilhando um segredo.

— Um dia, conheci pessoas que estavam dispostas a me ajudar a conseguir o que eu queria de forma rápida. Descobri um mercado negro, e foi aí que as coisas mudaram. Percebi que poderia diagnosticar pacientes com doenças que não existiam e, assim, removê-los do caminho para conseguir órgãos saudáveis. E o melhor? As famílias nem desconfiavam! — ele deu uma risada sinistra.

Dulce se sentiu enjoada. Era como se cada palavra de Alfonso cortasse profundamente, revelando a monstruosidade que ele realmente era.

— E você, querida Dulce, se tornou uma peça-chave nesse jogo. Sua curiosidade e determinação para descobrir a verdade me trouxeram até você. Fala sério Dulce! Transar com a minha mulher ok, entendo. Ela é uma tremenda gostosa! Mas fazer ela ficar contra mim? Ah, não ia dar certo. Mas você queria, não queria? Então, você vai se tornar parte da minha história, assim como Paco. Mas do jeito que eu escolhi.

Alfonso se levantou e olhou para Christian e Maite.

— Bem, vamos aos trabalhos.

Os dois se movimentaram como se estivessem em uma dança macabra, cada um se trocando e se esterilizando com precisão clínica. Christian, com a máscara que ocultava seu rosto, preparou o ambiente com cuidado. Maite, com um olhar insano, foi até o saco preto que estava ao lado da maca.

Com um movimento brusco, ela puxou o corpo de Paco para fora do saco, revelando-o à luz. O coração de Dulce parou por um momento.

— Não... — sussurrou ela, sua voz um lamento abafado.

— Ah, você não sabia? O caixão fechado era para enganar todos. O pobre Paco não teve a mesma sorte que você, minha querida. E eu ainda fui o responsável pelo atendimento dele no hospital. Que sorte não?  — disse Alfonso, com um brilho cruel nos olhos. — Agora, vamos ver o que temos aqui.

Ele se aproximou do corpo e começou a mostrar os órgãos, enquanto Maite se posicionava ao lado de Dulce.

— Olha só, Dulce. Este é o fígado — disse Alfonso, segurando o órgão com as mãos. — Tem um valor estimado de cinco mil dólares no mercado negro. E aqui está o rim, que pode valer até vinte mil, dependendo da qualidade.

Dulce começou a chorar desesperadamente, seu peito se contraindo em agonia.

— Não, por favor, não façam isso! — gritou ela, mas Maite pressionou um pano na boca de Dulce, abafando seu grito.

— Shhh... — disse Maite, rindo de forma debochada. — Você vai precisar de um tempo para se acostumar com a situação, sua ignorante!

Alfonso continuou, exibindo cada órgão como um troféu, descrevendo o preço e a demanda do mercado.

— Olha este coração, Dulce. Um verdadeiro achado! Este aqui pode render até cinquenta mil dólares. E o que você acha disso? — Ele apontou para um saco que continha fragmentos de órgãos, indicando como ele poderia vender partes sem que ninguém percebesse.

Dulce estava em desespero absoluto. As lágrimas escorriam pelo seu rosto, enquanto o terror a envolvia. Tudo ao seu redor parecia girar, e a sensação de impotência a sufocava.

— Você nunca deveria ter se metido com pessoas como nós, Dulce. Agora, você vai aprender da pior maneira que o mundo é um lugar cruel.

A última coisa que Dulce viu antes de desmaiar foi o olhar satisfeito de Maite, que sorriu como se estivesse cumprindo um sonho, enquanto dava um leve tapa em seu rosto para confirmar se estava acordada.

— Hoje, ela não acorda mais. — sussurrou Maite, enquanto o mundo ao redor de Dulce se tornava negro.

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