Nove

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O clima no hospital estava pesado. Anahí entrou, a expressão fechada e os olhos nublados. Cada passo que dava em direção à sua sala parecia mais pesado que o anterior. Desde a noite tensa com Alfonso, ela se sentia como se estivesse carregando um peso nas costas. Ao cruzar os corredores, sua rigidez era palpável, e os colegas trocavam olhares preocupados.

Quando Dulce apareceu, radiante após uma boa noite de sono, a alegria que transparecia em seu rosto rapidamente se desfez ao notar a expressão de Anahí. A médica não deu a mínima atenção, passando por Dulce sem um cumprimento.

— Bom dia, Dra. Portilla! — Dulce chamou, tentando captar a atenção dela.

Anahí parou, mas seu olhar era frio e distante.

— Não tenho tempo para conversas triviais agora — respondeu, cortante. O tom de Anahí deixou Dulce perplexa, mas ela tentou não levar para o lado pessoal.

Durante a manhã, Anahí foi cada vez mais exigente, especialmente com Dulce. Quando a residente cometeu um pequeno erro ao preparar uma medicação, Anahí a fulminou com o olhar.

— É inaceitável! Você deveria saber isso de cor, Dulce! Não posso acreditar que você está no meu time — Anahí gritou, fazendo a jovem encolher-se.

Dulce mordeu o lábio, tentando manter a compostura, mas a frustração a consumia. O clima no ambiente de trabalho estava difícil, e Anahí não facilitava. Na hora do intervalo, Dulce decidiu ir para o jardim, buscando um pouco de ar fresco. Ela sabia que precisava de um tempo para processar a rudeza de Anahí.

Anahí, por outro lado, se retirou para o jardim também, com o intuito de se afastar do tumulto interno. Quando Dulce a viu, seu coração disparou.

— Oi, Anahí! — Dulce exclamou, caminhando com um sorriso no rosto. — Que dia lindo, não acha?

A resposta de Anahí foi um olhar vazio, e ela voltou-se, ignorando a residente.

— Você não precisa agir assim. Está tudo bem? — Dulce insistiu, seguindo-a.

— Não estou a fim de conversas, Dulce — Anahí disparou, a voz tensa e ríspida.

— Mas eu quero ajudar! Você não precisa lidar com isso sozinha — Dulce implorou, sentindo-se magoada.

— Não preciso da sua ajuda, nem de suas opiniões — Anahí disse, enquanto se afastava, deixando Dulce falar sozinha.

A tensão no ar era quase palpável. Dulce sentiu uma pontada de dor no coração ao ver Anahí se afastando. Depois de um dia repleto de desentendimentos, era hora de encerrar o expediente. Quando Anahí estava prestes a sair, Dulce a alcançou, segurando seu braço.

— Espera, Anahí! O que está acontecendo? Você precisa me confiar! — Dulce implorou, seu olhar cheio de preocupação.

Anahí hesitou, mas a expressão em seu rosto permaneceu fria.

— Você não entenderia. E tem mais Dulce, sou sua superior. Nem deveríamos estar conversando. — ela respondeu, mas Dulce não estava disposta a desistir.

— Tente me explicar. Eu me importo com você, por favor! — Dulce insistiu, sua voz quase suplicante.

Nesse momento, Alfonso apareceu, interrompendo a conversa.

— O que está acontecendo aqui? Estou atrapalhando algo? — ele perguntou, com um tom de desprezo.

Anahí virou-se para ele, a expressão se endurecendo.

— Não, não está atrapalhando nada — ela respondeu, sua voz firme. Depois, virou-se para Dulce e completou, com desdém: — Só essa residente fraca e ignorante está ocupando o meu tempo.

Alfonso concordou, com um sorriso sarcástico.

— Você realmente acha que pode fazer alguma coisa aqui, Dulce? Sinto muito, mas você não está nem perto do nível da Anahí. Vai cuidar das suas obrigações ao invés de ocupar o tempo da Dra. Portilla. — Ele a xingou, rindo de forma desdenhosa.

Dulce ficou paralisada, o rosto quente de indignação, enquanto Anahí olhava para ela com uma expressão vazia, sem qualquer traço de empatia. A tensão entre os três era insuportável, e Dulce percebeu que a situação estava se tornando ainda mais complicada.

Dulce se afastou, seu coração apertado.

Os dias se passavam lentamente para Dulce, cada um mais exaustivo que o anterior. A rotina do hospital já era cansativa por si só, mas o tratamento de Anahí só fazia tudo piorar. A médica parecia cada vez mais rígida e exigente, especialmente com ela. Cada erro mínimo era uma nova chance para Anahí criticá-la com frieza, e Dulce sentia-se constantemente pressionada, como se estivesse em um teste sem fim.

A cada turno, Dulce tentava encontrar uma explicação para a mudança de comportamento de Anahí. Elas tinham compartilhado momentos íntimos, risadas e, principalmente, algo que ela acreditava ser verdadeiro. Mas agora, Anahí parecia outra pessoa, e as poucas vezes que se encontravam fora do hospital eram carregadas de silêncio e tensão.

Um dia, após uma série de plantões exaustivos, Dulce foi encarregada de entregar os exames mais recentes de um paciente importante para Anahí. Ainda que sentisse um aperto no peito, ela se dirigiu ao escritório dela. Quando se aproximou da porta entreaberta, ouviu vozes vindas do interior — Anahí e Alfonso estavam conversando.

— Não sei por quanto tempo você vai aguentar essa residente, Anahí. — A voz de Alfonso era cortante, quase debochada. — Está claro que ela é mais uma dessas ambiciosas que querem crescer a qualquer custo. Sem talento, sem base.

Dulce parou, a respiração presa. Ela sabia que ouvir conversas alheias era errado, mas suas pernas pareceram travar no lugar, e ela continuou parada.

— Eu sei disso, Alfonso. E é por isso que eu a trato assim. Mas não sei por quanto tempo vou continuar com ela. Vai arruinar meu nome. — respondeu Anahí, o tom frio e severo. — Dulce é... impulsiva demais, não leva nada a sério. Não sei como uma pessoa assim chegou até aqui.

Alfonso riu baixo, cheio de escárnio.

— No fundo, ela é só mais uma garota deslumbrada com o glamour da medicina. E você, Anahí, precisa parar de gastar seu tempo com essa residente incompetente. Se ela continuar, vai arruinar a sua equipe.

Dulce apertou os exames em suas mãos, sentindo uma onda de humilhação e tristeza crescer em seu peito. O que mais a machucava não eram as palavras de Alfonso, mas o tom com que Anahí parecia concordar com ele, mesmo sabendo de tudo o que tinham compartilhado.

— E vou deixar claro isso para ela. Na verdade, estou apenas esperando a oportunidade certa, não quero mais essa garota aqui. — Anahí concluiu, a voz impassível.

Dulce respirou fundo, sentindo uma lágrima ameaçar escorrer. Ela se recompôs, batendo na porta e tentando manter o rosto impassível.

Anahí olhou para ela, surpresa pela presença dela ali.

— Aqui estão os exames, doutora — Dulce disse, entregando os papéis com uma expressão neutra, embora seu coração estivesse em pedaços.

— Obrigada, Dulce — Anahí respondeu, mas seus olhos evitavam os dela, quase como se estivesse tentando esconder algo.

Dulce virou-se rapidamente, saindo da sala antes que a dor e a raiva em seu peito transparecessem. Ela sabia que, a partir daquele momento, precisava decidir como lidar com essa situação.

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